XI Compreensões: de volta ao lar de meu pai

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Pela manhã, estava na sala de minha nova casa sentado em uma das cadeiras de madeira, em minha posição favorita, com os joelhos postos contra o peito lendo o livro Guerra e Paz de Liev Tolstói. Podia ver em suas letras, fome de poder, interesses e conveniências, três coisas que são praticamente a base de qualquer governo, dinastia ou poder exercido. Mergulhar um pouco mais na literatura e história da humanidade me fazia lembrar de minha mãe, sentada na mesa lá fora (nos fundos de nossa velha casa). Juntamente com ela estava eu e meus irmãos, nos ensinava cada letra e vogais para formar palavras, que formam frases e textos. Lembrei-me que agora terei que fazer o mesmo com meu irmão Deivy, ensinar o que mamãe nos ensinou com tanta paciência. Ela era tão delicada, usava tudo à nossa volta para nos ajudar a aprender da melhor forma possível, ensinar parecia ser um dom natural para minha mãe. Meu irmão Olavio foi o que mais deu trabalho, e mesmo assim mãe nunca perdia a paciência, mesmo que ele fosse um tanto atoa e às vezes preguiçoso.

Li algumas páginas do livro, por alguns minutos estava atento, mas após um tempo perdi a concentração no que estava fazendo. Me lembrava de minha avó, de sua casa, e de todo aquele constrangimento.

- Um pai e um filho nunca deveriam ter problemas a ponto de não se falarem. Ambos são parte um do outro, sangue do sangue.

"Os filhos herdam o DNA, os genes, os filhos são a extensão dos pais"

Aquilo me incomodava tanto, tinha que fazer alguma coisa em questão.

Resolvi sair e ir até a casa de meus avós. Mas não avisei o pai, pois com certeza ele se oporia.

Sai calado, bem de fininho.

Acho que não seria difícil chegar lá novamente, era praticamente andar reto até o pé de ipê, a casa de minha avó era a terceira após a referida árvore. Aliás, aquele lugar era pequeno, não me perderia, estava acostumado a andar na floresta e demarcar lugares mentalmente.

Bem!

Cheguei na casa de minha avó, respirei e bati na porta. Alguém gritou.

- Aguarde um minuto!

Para o meu desespero quem abriu a porta foi a tia Maura, sim, aquela que ama apertar bochechas e bagunçar cabelos. Não tínhamos sido apresentados adequadamente por causa das desavenças entre o pai e o avô, mas tinha ouvido meu pai conversar com ela e falar seu nome.

Fiquei um tempo congelado esperando qual seria sua reação. Ela sorriu e falou:

- O que faz aqui?

Demorei um pouco para responder pois mentalmente estava aliviado por não ser atacado por ela.

- Vim ver meus avós.

Ela olhou para um lado e para o outro como se procurasse alguma coisa, se voltou para mim com um semblante desconfiado.

- Uhum! Provavelmente seu pai não sabe que está aqui.

Sorri timidamente como se desviasse de sua afirmação.

- Mesmo assim, entre! Não vou te deixar aí fora.

Sentei novamente no banco da sala e enquanto ela ia avisar meus avós que estava ali, não me contive, levantei e fui contemplar os quadros com as fotos de família, que na outra vez não pude analisar da forma que queria. Passei meus olhos naquela parede cheia de memórias e lembranças.

Algumas fotos me chamaram a atenção. Uma foto do vovô mais novo em frente a uma vendinha; era como se a venda fosse dele. Achei intrigante o fato dele permanecer quase que o mesmo, somente com algumas rugas e os cabelos grisalhos indicando sua idade; mas ele hoje é quase que a mesma pessoa da foto. E depois de um tempo me chocou ver a foto de pai e mãe juntos. Eram os dois crianças na foto, deduzi que teriam de dez a doze anos, não mais que isso. Demorei um pouco para reconhecer minha mãe que ao falecer estava mais bonita que na foto, o tempo tinha sido nesse sentido complacente com ela, mas sim, realmente era ela, com os cabelos amarrados para trás e um vestido florido.

Algumas questões me atormentavam e me intrigavam.

- Meus pais cresceram juntos? Eles nunca falaram sobre como se conheceram. Por que minha mãe estava naquela foto ainda criança? Quem era minha família? Às vezes meu avô parecia ser alguém importante. Era mesmo? Era triste admitir que não conhecia minha família, talvez não fossemos tão verdadeiros assim. Como pode uma família transparente ter tantas histórias encobertas e não dar ponto sem nó? Isso me fazia repensar sobre o que realmente era meu lar.

Fiquei um tempo olhando quando ouvi uma voz distante.

- Que bom que veio.

Era a minha avó com seu rosto singelo, naquele momento ela me trazia a memória minha mãe; as duas tinham a mesma facilidade de transmitir paz e ponderança, de trazer um sossego natural na alma de quem está por perto delas.

- Oi vó.

Dei um leve e breve abraço nela, pois tinha medo que se apertasse demais ela quebrasse. Ela transmitia uma imagem tão sensível e pura.

Trazia consigo algumas marcas no olhar, de quem viveu algumas décadas.

"A mesma imagem de quem traz consigo, bagagem, experiência e sabedoria. A trajetória até alcançar as mesmas é cansativa, de erros, acertos e principalmente requer estar aberto ao aprendizado. Nenhum jovem por mais conhecimento que tenha, alcança a experiência de quem viveu umas boas décadas, pois só é possível alcançá-la com anos de vida, e com as marcas de caminhar na estrada do tempo, que age com as pessoas por conveniência; não é clemente e nem complacente, mas retribui segundo as atitudes de cada um em sua breve jornada pelo seu caminho intimidador, às vezes feroz, às vezes colorido, bonito e suave, por horas ardiloso".

 Nenhum jovem por mais conhecimento que tenha, alcança a experiência de quem viveu umas boas décadas, pois só é possível alcançá-la com anos de vida, e com as marcas de caminhar na estrada do tempo, que age com as pessoas por conveniência; não é c...

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