há quem diga
que poeta é apaixonado
que poeta canta letras
de amor desde o raiar até o anoitecer
a espécie humana abençoada
pela própria afrodite
o arquiteto com dom de ver paixão
nos canteiros mais improváveis
de um casarão aos pedaços
há quem esteja redondamente
enganado de achar que
poeta não amaldiçoa o amor em
seiscentos e sessenta e seis idiomas
que poeta não se embriaga
do próprio choro amargurado e
não se consome em chamas
com a própria ardência do seu desejo
há quem não suspeite que
poeta sente mais ódio do que amor
que odeia sua poesia ruim
e odeia ainda mais o
que ou quem o levou a poetizar
há quem seja esse poeta que
faz do inferno sua morada eterna
e comete o delito de tatuar
o nome de seus amores passados
no pulso com uma urgência
de abraçar a dor e brindar às
mágoas numa mesa
com cento e uma cadeiras
e nenhum convidado
há quem seja solitário a
tal ponto e portador de tão
sôfrego sufoco que não
tenha outro meio de bradar ao
universo que não seja
sendo poeta
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intitulável
PoetryA coragem de admitir não saber titular a própria história, e a ousadia de se declarar intitulável.