16/08/2023

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Oscar extasiava-se enquanto tocava a campainha dos Carvalho. Surpreendentemente, a porta não foi aberta por quem esperava. O sr. Carvalho, homem esbelto, elegantemente vestido, logo sorriu com a presença do garoto:
    — Olá, Oscar!
    — Olá, sr. Carvalho…
    — Ele me pediu para atender a porta. Mas… é só entrar no quarto de sempre. Divirta-se com seu amigo — Sorriu.
    Oscar andou em direção ao quarto de Eduardo, desconfiado. Ao abrir a porta, flagrou-o rabiscando em alguns papéis.
    — Por favor, não me faça mais ver o seu pai. Ele age como se nós não estivéssemos namorando.
    — É porque ele não sabe.
    — Como assim? — ficou chocado.
    — Meu pai é adorável, mas… eu tenho muito medo de contar pra ele…
    — Bom, mas a sua mãe…
    — Eu quero contar pra ele primeiro. E vou fazer isso. Hoje — falou, determinado.
    — Ah, certo…
    — Enfim, desculpa por… tudo. É que… amanhã eu tenho prova de biologia e… isso é exaustivo.
    — Não, não, não tem problema. Mas… eu acho tão deprimente você estudar pra uma prova no dia do seu aniversário.
    — É… — Riu levemente, mas queria chorar. Oscar, como se lesse sua mente, abraçou-o. Apenas depois de ser abraçado, começou a expelir água dos olhos, num simples lacrimejar que se tornou um guincho desesperado de agonia. — Eu… não aguento mais… E ainda estou no primeiro ano desse inferno… Eu não entendo… O… O que eu fiz p-pra… merecer isso?
    — Nada, nada… Você é especial, você não merece isso… E eu… Eu consigo imaginar o quão difícil é ter que viver todo santo dia assim, se sacrificando nos estudos, mesmo exausto e deprimido…
    — Eu… não… entendo. Eu não entendo. Os… Os professores… Eles são tão abusivos… — Oscar abraçou-o novamente, apertando suas costas nos seus braços e acolhendo suas lamúrias cotidianas. Aquele abraço foi terapêutico. Ele não seria findado até que Eduardo se acalmasse. 
    — Eu não gosto de ver você assim — murmurou Oscar, quase que sussurrando. — Eu te amo profundamente, e quero ajudar no que for possível… Os seus professores, as suas provas… Eu imagino o quão maçante isso deve ser. E eu me sinto um lixo por não poder fazer nada por isso…
    — Não, não… Você ouvir o meu desabafo já é muito mais do que o suficiente. Eu… Eu te amo. Muito obrigado por estar me ouvindo.
    Ao passo dessa última declaração, finalmente desfizeram o longo abraço, gradualmente. Eduardo tinha algo a mais para desabafar, mas decidiu não importunar o amante.
    — Mas você tem conseguido interagir lá? — perguntou Oscar.
    — Bom, na verdade… eu fiz alguns amigos.
    — Amigos? Uau!
    — É…
    — Eu fico longe de você por alguns meses e você já me trocou, é isso?
    — Ah, meu Deus, sr. Melodrama… — Riu um pouco.
    — Mas… eu fico realmente feliz por você estar interagindo.
    — Bom… Mais ou menos.
    — Como assim?
    — É só que… Muitos desses amigos eu conheci porque eles vieram até mim, e estão no mesmo semestre que o meu, então… Eu continuo bem tímido, e… isso vem me prejudicando demais.
    — Ah… Bom… Existem muitas soluções pra esse problema.
    — Existem? 
    — É claro! Você pode fazer um curso, de canto, de teatro ou de artes que envolvam se expôr, entrar num clube do livro, até arranjar um psicólogo…
    Os olhos de Eduardo brilharam.
    — Uau… Realmente. Eu acho que vou ver sobre isso… Desculpa por ter enchido você com meus problemas…
    — Isso não tem problema, não, imagina! O único problema é que… você está esquecendo que dia é hoje…
    — Aonde você quer chegar…?
    — Eu preparei um presente. Não consegui comprar nada, mas… Eu tenho feito algo desde que nós nos conhecemos… — Oscar entregou um livreto para Eduardo.
    — O que é isso?
    — São poemas que eu escrevi pra você… 
    — Você não… Oh, meu Deus…
    — Gostou?
    — Eu… adorei! Meu Deus, isso é a melhor coisa que eu podia ganhar… E tem 129 páginas, meu Deus!
    — Umas 100 são só declarações melosas…
    — Cala a boca e aceita que o seu presente é a coisa mais perfeita do Cosmos, não, do Multiverso!
    — Meu Deus, por que tanta agressividade?
    — Porque agora eu tenho que criar um álbum de músicas pro seu aniversário!
    — Não, não tem…
    — Tenho sim! Meu Deus, eu… Eu não consigo nem… Muito… Muito obrigado… — começou a lacrimejar de emoção.
    — Você é tão fofo chorando de alegria…
    — Cala a boca! — Corou enquanto as lágrimas eram exprimidas de seus olhos.
    — Fofo…
    — Hm… Oscar…
    — Oi?
    — Nesse sábado… Eu combinei com os meus amigos pra comemorar o meu aniversário e… eles vão todos ir na cafeteria… Se você quiser…
    — Ué… Mas você já não está comemorando?
    — É que… As coisas são diferentes quando somos só eu e você…
    — Em que sentido? — ironizou.
    — No sentido que você quiser…
    — Sempre suspeitei que você só se envolveu comigo pra me comer.
    — Ei!
    — Menti? 
    — Um pouquinho…
    Os dois se aconchegaram um no outro.
    O resto do dia passou normalmente. Aproveitaram os felizes momentos que tiveram, até que Oscar foi embora. Eduardo estava ansioso para contar ao pai o que devia ser contado.
    O relógio avultava seus ponteiros: 23h16. O pai de Eduardo, Luiz, bebia café pacientemente no sofá, de pernas cruzadas. Seu filho passou pela sala, decidindo sentar-se ao seu lado.
    — Oi, filho. Aproveitou o dia hoje?
    — Sim… — Engoliu saliva.
    — Você vai se encontrar com os seus amigos no sábado também, certo?
    — Sim… Mas eu achei que seria melhor convidar o Oscar hoje, porque…
    — Tudo bem. Eu não me importo.
    — …porque ele é meu namorado, e eu achei que seria melhor se eu ficasse sozinho com ele.
    — Que bom — O sr. Carvalho sorriu e bebeu mais um gole de sua xícara. — Sabe, filho… Antes de conhecer a sua mãe, eu tinha esse amigo… E ele… Eu nunca contei sobre ele pra sua mãe, mas… eu era apaixonado por ele. E isso só acabou quando eu descobri que ele era hétero, o momento mais triste de toda a minha vida. O que eu quero dizer é que… eu fico muito feliz quando vejo você com o Oscar, porque vejo em vocês um futuro que eu poderia ter tido. E não é como se eu não amasse a sua mãe (muito pelo contrário), mas… às vezes eu gosto de me lembrar de como eu amei o meu amigo.
    Eduardo permaneceu pálido. Não acreditava no que acabava de ouvir.
    — A bissexualidade é difícil — complementou o sr. Carvalho. — Eu demorei tempo demais para descobrir ela.
    — Eu… Pai… Obrigado por me contar isso…
    — Achei que eu deveria. Se você precisar de algum conselho sobre a sua sexualidade, você pode me chamar. Eu estudei sexologia um pouco, acho que vou conseguir responder.
    — O-Obrigado… — Eduardo não mudou a incredulidade, apesar de que o sr. Luiz permanecia tão manso quanto no início da conversa.
    — Pretende contar para a sua mãe?
    — S-Sim… Eu… acho que ser gay é algo importante a se comentar…
    — Não é. Mas avise sobre coisas que nós precisamos saber. E por favor, use camisinha se for fazer sexo. 
    — Ei! Mas é claro! — Eduardo corou.

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