Capítulo 9.

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15 de MAIO DE 2021

AMBROSE

Seus pés encontraram o asfalto daquela estrada vazia, clareada pela luz do amanhecer que surgia no céu acima, iluminando toda aquela parte isolada de terra rodeada pelas árvores que se estendiam como uma floresta.

As mãos ao lado do corpo tremiam mais do que tudo, e a garota sequer conseguia ter o controle de pará-las. Seu olhar assombrado e vasto se direcionava de um lado para o outro, encarando a estrada deserta da manhã de sábado, imaginando que seria difícil de encontrar alguma movimentação naquelas redondezas. Nem mesmo sabia que caminho era aquele e por onde se encaminharia, tanto que quando viu o pedaço de estrada depois de passar a madrugada inteira andando pelo bosque, sentiu a redução de estresse diminuir, e o leve sentimento de conforto se apossou por alguns segundos.

Mas, voltar para casa ainda era seu maior problema.

Depois do que tinha acontecido na noite passada, quando as coisas saíram do controle e ela se viu em meio a um pandemônio que iria marcar sua vida para sempre, teve a total certeza de que seu lar seria o último lugar em que poderia voltar a se sentir abrigada novamente — mesmo que antes, isso já estivesse fora de cogitação, entretanto com as circunstâncias que tudo se proporcionou, agora ficava mais do que nítido de que em algum momento crucial, precisaria achar outro lugar para fugir.

Esses pensamentos foram o que a fizeram ficar rondando o bosque durante a madrugada que se estendeu, andando em círculos, marcando árvores e entrando em clareiras silenciosas. Engasgada pelo choro, pelo desespero e pela culpa. Não tinha para onde ir, não saberia mentir ou fingir que tudo estaria bem, pois descobririam assim que vissem em seu rosto, na qual acreditava ter se criado uma cicatriz marcada por letras que formavam a mísera palavra de "culpada".

Quando o sol amanheceu, e os raios solares ultrapassaram as folhas e galhos das árvores, foi como se a realidade tivesse lhe dado um tapa e a empurrado para o caminho certo a se seguir, mostrando a ela a estrada e sua saída para retornar a cidade. Se fugisse para sempre, poderia ser pior, eles descobriram e o caso se tornaria ainda mais severo, as investigações envolveriam mais pessoas além dela e possivelmente colocaria na mira a outra garota — agora podendo ser vista como sua cúmplice.

Mas, ninguém descobriria. Tinham feito da maneira certa, sem deixar evidências, até acharem o que procuravam, já seria tarde. E no melhor dos casos, poderia declarar que tudo não passou de uma autodefesa. Afinal, tudo o que fizera foi se defender.

Não era de sua vontade cometer aquela atrocidade. Foi como um reflexo de defesa que a impulsionou a querer se livrar daquilo que a aterrorizava. Poderia explicar isso a eles, dizer que agiu para se safar, e que tinha sido sua única escapatória. No entanto, continuava a ser um crime, e ela entendia muito bem como as leis se aplicavam de forma diferente para garotas como ela.

Além de tudo, uma grande evidência podia ser vista em suas roupas. A calça jeans, e a camisa xadrez, até mesmo os coturnos surrados de terra ainda não eram capazes de esconder as manchas de sangue ali presentes. O jeans azul ficará ainda mais escuro pelo líquido viscoso que manchava suas coxas, assim como parte da blusa por dentro da camisa que tinha a marca de seus dedos, em um momento de descuido em que tentou se limpar para não deixar rastros — só fazendo com que ficassem ainda mais evidentes as possíveis provas. Porém, se fosse rápida e ágil, conseguiria chegar em casa a tempo e jogar suas roupas dentro de um saco de lixo e queimá-lo, sumindo com os rastros. Tinha arquitetado esse plano em sua cabeça durante a noite, quando o som das corujas fora o único som de companhia que a seguiu perante a madrugada solitária.

Trust No One (Finalizada)Onde histórias criam vida. Descubra agora