Capítulo Vinte e Um

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Domingo, 5 de Janeiro de 1986.

   O fim de semana após a revelação da fita é lento e árduo. Todos na minha casa se movem como uma mosca bem alimentada no verão. Ninguém me olha nos olhos. Papai mantém contato com a polícia, nos dando atualizações sempre que as tem. Com o tio Jack e suas travessuras voltando para a Filadélfia, a responsabilidade de nos animar recai sobre mamãe. Ela ataca esse problema com sua solução usual: assados. Em um dia normal, isso funcionaria. Mas nada nesta situação é normal.

    Na tarde de domingo, apenas um dia antes da volta das aulas, o tempo piora. As temperaturas máximas caem para os trinta graus. Não chega a nevar, mas a geada e a leve poeira são suficientes para nos manter dentro de casa, minando qualquer vibração que restasse da alegria do feriado. Uma disposição sombria toma conta da casa e da própria Hawkins.

    Normalmente, tão perto do início das aulas, eu estaria ao telefone com Mike e Dustin, planejando todas as maneiras legais de decorar nossos armários para o semestre. Mas nem isso posso fazer – fui proibido de usar o telefone ou ligar para alguém nesse meio tempo.

    Papai, aconselhado pelo chefe Powell, acredita que é melhor eu não entrar em contato com Jay até que a investigação termine.

    Passo a maior parte do dia trancado no meu quarto, deitado na cama e pensando em duas pessoas: Jay e Max. Eu me pergunto se Jay está bem e o que vai acontecer quando ele voltar para a escola. Eu também me pergunto se Max está indo bem – se seu trailer tem isolamento grosso o suficiente para suportar o frio crescente. Mas é apenas desejando que ela estivesse aqui comigo. Eu cantarolo Kate Bush silenciosamente, pensando na última vez que ela me deixou segurar sua mão.

    No verão passado, em Starcourt, antes de todo o resto acontecer. Estávamos tomando sorvete. Sua palma era tão macia que eu disse que queria pedir como sabor. Ela riu. Parecia os pássaros da Cinderela.

    Erica aparece em algum momento, algo que ela nunca faz, a menos que seja para me incomodar por algum motivo. Desta vez, porém, ela apenas se empoleira na beirada da cama, me observa por um momento e fala todas as quatro palavras.

    — Uma bomba, hein? — Ela diz. — Doente.

    Não tenho certeza se ela quer dizer doente como incrível, ou doente como horrível, mas acho que pode ser as duas coisas com Erica. Eu não pergunto e ela não explica. Ficamos sentados em silêncio, olhando juntos para o teto até que ela se aborrece e vai embora.

    O vento aumenta com o passar do dia. A previsão do tempo diz que haverá tempestades pelo resto da semana, e somos aconselhados a aumentar o calor e ficar de olho nos canos congelados. Entre tudo isso, papai recebe algumas notícias da polícia: Lee Garroway foi preso.

    — Cal diz que a evidência é sólida o suficiente, e o menino confessou. — Papai diz a mamãe, embora nós escutemos. — Parece quatro contagens. Incêndio, roubo, tentativa de assalto, posse de artefatos explosivos.

    Agora que estou livre da proibição do telefone, ligo para a casa de Jay várias vezes. Ninguém atende. Talvez algo a ver com a tempestade. Eu decido apenas esperar e ver Jay na escola.

    Uma hora antes de dormir, enquanto estou debruçado sobre o meu armário para o que vestir no dia seguinte, papai vem ao meu quarto e fica na porta.

Stranger Things: Lucas on the LineOnde histórias criam vida. Descubra agora