O pássaro sobrevoou a mata, mas logo deu meia volta e colocou-se a observar cidade outra vez. Voou baixo sobre a avenida, os olhos amarelos acompanhavam uma caminhonete preta que seguia a avenida principal, até o momento em que a mesma estacionou próximo a uma praça.
Dentro daquele carro estava Ghedi, o homem coçou os olhos encarando o próprio reflexo pelo espelho retrovisor interno, ainda parecia estar atordoado com o evento estranho em seu quarto pela manhã. Pegou a carteira no "porta trecos", abriu o porta-luvas e retirou seus óculos de sol, encarou o espelho retrovisor novamente, e levando o acessório ao rosto assusto-se.
Havia um homem de pé, vestido de branco, atrás de seu carro
— Olá!
Ouviu-se um sussurro, Ghedi não conseguiu ver o rosto daquela pessoa, pois, retirou o óculos rapidamente, e se virou para trás, mas não havia ninguém lá. Ele desceu do carro, olhando de um lado para a outro, procurando o individuo, contudo, não o encontrou.
Uma viatura policial se aproximou devagar, estacionou atrás da caminhonete de Ghedi, era Nala, que logo saiu do carro com uma arma em mãos, colocou-a no coldre e fechou a porta.
— Perdeu sua carteira? — questionou Nala observando Ghedi em alerta.
— Eh, não, é que — pensou em suas palavras —, tive a impressão de ter visto alguém, só isso.
Nala se aproximou, estava de uniforme, mas sem colete, e como de costume, andava com uma mão na coronha da arma e outra com o polegar dentro do bolso.
— Manhã difícil né Gege? — perguntou a policial, tocando no ombro de Ghedi, que estava encostado no carro.
— Sim, mais difícil que no ano passado — respondeu ele passando as mãos no rosto —, e ainda nem são oito da manhã! — brincou, virando-se e abraçando Nala.
— Entendo perfeitamente, também não está nada fácil pra mim.
Nala o apertou mais ao dizer tais palavras, e Ghedi retribuiu o perto.
— Mas é isso — comentou Ghedi após soltar sua amiga —, todos os anos tem sido assim não é mesmo? Cada ano esse dia fica mais insuportável e pesado, olha só o velho Mário — apontou com a cabeça, um senhor que gritava no meio da praça — esse ano ele está mais agitado, parece nervoso.
— Ele está de volta — berrava o velho com uma bíblia na mão —, a escuridão voltou, e vocês, ah vocês... Vocês não estão preparados para o quê estar por vir, não estão preparados para observar o terror tomar conta de vocês...
As poucas pessoas que passavam pela rua ou mesmo na praça, não o levava a sério, ignoravam tudo que estava sendo dito.
— Em Matheus no capítulo 13, verso 4, Jesus diz que, enquanto o semeador semeava, uma parte da semente caiu ao pé do caminho, e vieram as aves, e comeram-na...
Nala e Ghedi, porém, ficaram atentos ao que falava o velho, pareciam hipnotizados parados ali, observando de longe.
— Deus é o semeador, e nós, que vivemos nesta cidade, ou melhor — por um instante o velho deixou de parecer um louco, seu jeito de olhar, de se expressar e falar mudaram —, neste inferno, nós somos as sementes que caíram ao pé do caminho, por isso cuidado.
Algo incomum aconteceu, as pessoas que estava por ali, notaram a mudança na fala do velho Mário, pararam todos e atentaram-se ao alerta do pregador.
— Cuidado, pois a ave está pronta para comer, semente por semente — concluiu pausadamente, o velho.
Quem ouviu o alerta, se arrepiou, sentiram calafrios, todos tremeram o corpo ao mesmo tempo, era como se todos soubessem sobre o quê velho Mário estava falando, entretanto, o clima amedrontador se foi, quando o pregador começou a rir e cantar uma canção.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Covardes Não Tem Final Feliz
Mystery / ThrillerGhedi é um guia turístico que conhece muito bem as matas que cercam Vila Liberdade, uma cidade que há 30 anos vive pacificamente. Contudo, num dia comum de trabalho, o guia encontra algo que levará a cidade novamente ao caos, como aconteceu no passa...