Um Domingo Agitado

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Já se passava das meia-noite quando Ivo e Luís chegaram em casa, cada um no próprio carro. Luís até pensou em perguntar onde o marido esteve durante o começo da noite, mas se conteve, afinal, sabia que o policial mentiria. Ivo foi direto para o banho, e lá demorou mais que o normal, perdeu-se em pensamentos e memórias, contudo foi desperto pela batida na porta.

— Ei, está tudo bem, meu amor?

Perguntou Luís ao lado de fora escorado à porta, aguardando uma resposta, que demorou a chegar.

— Está sim... Já estou saindo — respondeu Ivo, desligando o chuveiro em seguida.

O policial se enrolou numa toalha preta e após escovar os dentes e engolir alguns comprimidos, deixou o banheiro, vestiu roupas apropriadas para dormir, e se deitou. Luís, deu-lhe um beijo e desejou boa noite, em seguida foi para o banho. Aproveitou a cascata de águas quentes, para dar liberdade às lágrimas que aprisionou por muito tempo.

Notava a estranheza nos comportamentos de Ivo, e sabia os motivos, apenas sofria por não conseguir ajudar o marido a se livrar, tampouco o confrontá-lo. Por ter sido "salvo" por Ivo, Luís o venerava a ponto de fechar os olhos para todos os defeitos do marido, e assim o que foi apresentado como amor, se mostrou ser apenas dependência doentia.

Não tardou para que Luís também se recolhesse, deitou ao lado do marido, que já havia pegado no sono. Com o auxílio dos remédios, Ivo possuía um sono profundo, geralmente não acordava durante a madrugada para ir ao banheiro, mas algo diferente aconteceu, um sussurro o despertou em meio a escuridão do quarto – iluminado apenas pela luz vinda dos postes da rua que transpassavam as frestas da cortina branca, que se sacudia com o vento.

Ivo encarou a janela e se questionou por um momento – não se lembrava de ter deixado a janela aberta. Levantou-se e caminhou até lá para fechá-la, contudo, ao sentir a brisa gelada da madrugada, projetou o corpo para fora e fechou os olhos. Suspirou e sorriu sentindo a brisa calma que fazia as olhas das árvores chacoalharem e assoviava ao pé do ouvido. Junto ao assovio do vento, um sussurro penetrava aos ouvidos do policial.

— Você vai pagar por tudo que fez! Eu vou matar você!

Ao abrir os olhos, assustado, olhou em volta a procura da origem da ameaça, de forma mística, seu olhar foi levado a uma pessoa de pé em meio a avenida, ficou imóvel por alguns segundos e logo se virou e pôs-se a caminhar. Ivo não conseguiu ver o rosto, nem qualquer outro detalhe, sabia apenas que era a mesma pessoa vestida de roupas brancas a qual vira na mata horas antes. O policial pensou em pegar sua arma e ir atrás e obter resposta, mas preferiu não arriscar, temeu ser uma emboscada. Voltou para cama e tentou pegar no sono outra vez, mas não conseguiu, e teve de recorrer a mais remédios.

Diferente de Ivo, naquela noite Ghedi teve um bom sono, talvez o melhor descanso dos últimos anos, e o mesmo aconteceu com Nala, uma madrugada de sono profundo, sem interrupções nem pesadelos, o que geralmente não acontecia, pois os sonhos ruins sempre a incomodavam, e comumente a policial despertava em meio a escuridão ao ouvir os gritos do irmão, ou às vezes o escutava conversar sozinho.

No domingo, acordavam cedo apenas as pessoas que trabalhavam em algum comércio e os membros das igrejas da cidade. Contudo, Luena acordou mais cedo que todos naquele dia.

Arrumou-se e tomou um café rápido, a garota era do tipo que não come nada pela manhã, gostava apenas do café puro, tão puro que dispensava o açúcar. Foi ao escritório e tendo pegado sua bolsa abarrotada de jornais, subiu na bicicleta preta com adesivos vermelhos, e partiu para a missão de entregar o que ela tinha certeza, ser a matéria mais importante e impactante da cidade, desde a última edição do jornal feita por seu tio Malik.

Covardes Não Tem Final FelizOnde histórias criam vida. Descubra agora