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No fundinho de sua alma, Emma sempre teve esperanças de ser amada por seu pai. Ela tinha a convicção de que um dia se dariam bem, seriam como pai e filha, como Johnny e Lily e, quando esse dia finalmente chegasse, ela estava disposta a perdoar e esquecer todos os abusos psicológicos, físicos e sexuais que sofreu durante anos. Afinal, ele era seu pai, né?

Ela cresceu ouvindo desde que se entendia por gente que era a culpada pela morte da mãe, que entre a própria vida e a vida da filha, Miriam Petit tinha decidido salvar a vida de Emma. Seu pai nunca aceitou aquilo e fez questão de deixar claro para Emma o incômodo que ela era, que não passava de um grande problema, um fardo pesado demais para se carregar. E é claro que aquela ideia se enraizou na mente e coração de Emma de forma que ela nunca mais se viu como outra coisa, senão um problema.

Os abusos físicos não eram tão recorrentes durante a infância. Félix negligenciava a própria filha e viajava por meses, deixando Emma sob cuidados da governanta e dos outros empregados da casa, e a batia e humilhava sempre que voltava de viagem e a criança ia correndo lhe dar um abraço. Mas esse comportamento mudou quando a garota entrou na puberdade e seu corpo começou a se desenvolver rapidamente. O homem notou, então, que a criança tinha uma semelhança inacreditável com a própria mãe, e começou a prestar mais atenção no pequeno tesouro que tinha em casa.

Emma achou que finalmente estavam se dando bem, que o tempo que seu pai passava consigo, as refeições que faziam, os passeios e os piquiniques, que tudo aquilo significava que finalmente teria uma vida normal, mas não demorou para perceber que era só a porta de entrada para um pesadelo ainda pior. E foi justo no seu aniversário de 11 anos que tudo começou. No começo ela não entendia, achava que estava fazendo um bem para seu pai, então apesar de toda a dor que sentia ela nunca reclamou, nunca tentou fugir, sempre aceitou tudo em silêncio. Era o único momento onde ele a olhava com devoção ao invés de nojo, e Emma precisava daquele olhar de aprovação.

Mas quanto mais ela crescia, mais obcecado e agressivo ele ficava. Logo ela não podia se aproximar de garotos ou sair com seus amigos, e houve um período em que não podia sequer encontrar Lily-Rose e Jack. Então quando completou 18 anos Emma arrumou todas as suas coisas e disse que iria embora, não conseguia mais viver assim. Ela estava realmente decidida quanto a isso, mas quando seu pai dramatizou tudo, a chamou de ingrata, disse que era o único que amava e a suportava e jogou mais uma vez em sua cara a culpa pela morte da mãe, ela recuou.

Ela ficou, mesmo depois de ter completado a maior idade, e seu pai prometeu que não a tocaria mais. E ele cumpriu essa promessa por quase um ano, mantendo apenas as agressões físicas, o que Emma podia suportar já que era a única forma de amor que conhecia. Aquilo era normal para si, podia suportar contanto que ele não a tocasse. Mas ele tocou.

Agora ela conseguia ver o quanto de si mesma tinha perdido por culpa dessa ilusão, desse sonho bobo de ser amada e de ter uma família. Na realidade sequer sabia quem era ela. A vida toda ela foi moldada para ser idêntica a sua mãe, Emma não passava de uma cópia, mas ela nunca tinha realmente se importado até o momento.

— Que bom que já acordou. — A médica disse completamente sorridente ao entrar no quarto, fazendo Lily-Rose se afastar de Emma e sentar na poltrona. — Tenho boas notícias!

— Preciso de boas notícias no momento. — Emma confessou, forçando um sorriso.

— A cirurgia foi um sucesso e nós conseguimos conter a hemorragia interna, todos os seus sinais vitais estão normalizados e sua vida não corre mais risco. Mas... — A médica olhou a prancheta, batendo a caneta na folha e voltando o olhar para Emma. — Precisa ficar em observação por uma semana, só para termos certeza de que você está mesmo bem.

daddy issues; Johnny DeppOnde histórias criam vida. Descubra agora