Capítulo 33: O manuscrito anuncia o caos

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Quando Theo chegou no castelo, todos notaram que ele estava mais magro, com os cabelos mais compridos e a barba por fazer.
Ele largou o pesado manto de peles no seu trono e recebeu seus conselheiros com contentamento. Havia boas notícias para contar a todos sobre o empreendimento em Craig e a principal era, que ele passaria o inverno em Brugnaro. Theo tomou uma cerveja e comeu uma carne com ervas saboreando cada momento.
A comida de Ette era maravilhosa! Bem diferente do seu cozinheiro de Walden que parecia que fazia comida para o contigente de um campo de batalha: em quantidade e sem sabor.
Theo foi até o recinto que era como um escritório de oficio e sentou-se na mesa. Enquanto Lorde Joran que o acompanhou, lhe informava sobre as questões de Brugnaro.
Theo  se recostou na cadeira e correu os olhos por um  manuscrito que estava em cima da mesa e imediatamente seu coração se acelerou.
"Comunico a V.M. que sua presença se faz necessária com extrema urgência em Brugnaro. Lady Margery está no caminho da família e em breve, deverá interromper suas aparições públicas pois dará continuidade a linhagem da dinastia dos reinos de Walden e Brugnaro.
Quando lorde Joran olhou para o rei, ele estava lívido e sua expressão era um misto de raiva e surpresa. Então o lorde olhou para a mesa e viu as mãos grandes e fortes do rei segurando o manuscrito que estava escrevendo minutos antes de sua chegada.
Os homens se olharam  durante algum tempo,
e Theo perguntou ao conselheiro:
-Onde sua majestade se encontra?
O lorde respondeu preocupadíssimo com a expressão do rei.
-Em seus aposentos, milorde.
Theo saiu andando em direção ao quarto de Margery, segurando o manuscrito nas mãos. Ele abriu a porta do quarto e a rainha estava em pé olhando para a porta.
Ela ouviu a cavalaria chegando, e sentiu que o rei iria até ela. Era uma certeza tão grande que ela se cumpriu.
Theo estava ali, com o semblante transtornado, olhando para seu ventre avantajado sem acreditar no que via. Mas uma deslealdade de Margery!! Até quando aquilo continuaria?
Ela colocou a mão sobre o ventre e o olhou com a cabeça erguida. Suas mãos tremiam. Ela podia sentir a raiva saindo dos poros do corpo do rei.
-Então, mais uma mentira de vossa Majestade?
Margery estava envergonhada. Sabia que tinha errado novamente com ele, mas não daria o braço a torcer tão facilmente.
-Omissão majestade.
Theo a olhou incrédulo.
-Omissão? A sua omissão acarreta na deslealdade de meus súditos para comigo. Olhe aqui! Lorde Joran estava me comunicando  de sua gravidez, quando todos já podem ver que é mais do que confirmada! -Ele disse apontando para seu ventre.
-Eu os impedi de falar com milorde. Eu mesma queria lhe dar a notícia.
Theo soltou uma gargalhada amarga.
-Quando? Quando me diria? Quando a criança já tivesse nascido?
Margery viu o sofrimento estampado nos olhos do rei e abaixou seus olhos timidamente.
-Tenho dificuldades em confiar milorde.
Theo rasgou o manuscrito em pedacinhos.
-Você tem dificuldade em dizer a verdade! você vive de mentiras, causando danos em todos ao seu redor. É capaz de perceber isso? Ou é pouco inteligente para notar essa sua preciosa habilidade?
Margery sentou-se na cama. Estava nervosa, e duas pernas tremiam, impedindo-a de continuar aquela conversa de igual pra igual
De cabeça baixa, ela o ouvia. Sabia que  o rei estava certo, e ela,  era a errada. Sabia também que lhe devia explicações.
-Não precisa me ofender milorde.
Theo sentou-se numa cadeira que havia no quarto.
-Te ofender? Eu queria fazer outras coisas com você, bem piores do que ofensas com palavras!
Margery o olhou com os olhos atentos.
-Está me ameaçando?
Theo a olhou com raiva nos olhos.
-Não me subestime Margery, você não sabe do que sou capaz!
Tudo seria muito simples para Margery fazer: implorar perdão e continuar a vida do jeito que estava. Mas em seu interior, ela havia construído uma estrada onde omitir significava não sofrer, significava ter mais um tempo de vida, ter mais um dia pra viver.
-É difícil para eu entender que estou num lugar seguro, que não preciso ter medo, que estou no meu reino, na minha posição de direito e que não preciso mentir para sobreviver mais um dia. Tenho dificuldades de acreditar que tudo não vai se repetir e que vou sofrer novamente na mão de.... De um rei.
Theo a ouvia. Queria entender ela, para não mandá-la imediatamente para a masmorra.Novament, mas ela dificultava sua vida.
-Desde os quinze anos que a verdade me deixou. Fiquei sozinha com o medo, a violência, o silêncio, a  mentira pra chegar viva até mais um dia.
Sem tirar os  olhos dela, Theo deixou que ela lhe confidenciasse o passado,
-Eu estava esperando para lhe contar pessoalmente, mas quanto mais o tempo passava, mais medo eu sentia de lhe falar.
Andando de um lago para o outro, Theo perguntou:
-Quando? Quando pretendia me contar a verdade? Olhe o tamanho do seu ventre! A criança já se mexe?
Margery assentiu.
-Sim milorde, há algumas semanas.
Theo sentiu uma emoção estranha ao ver o ventre crescido de  Margery. Um filho seu! Um filho! Oh meu Deus! Aquilo era bom e ruim ao mesmo tempo.
-Porque não me contou? Ele perguntou baixinho.
Margery suspirou fundo.
-Porque tive medo.
Theo a olhou perplexo.
-Medo de  contar sobre meu filho? Deveria estar com medo agora, exatamente por não me contar.
-Medo que milorde não  me aceitasse mais aqui.
Theo levantou-se irado com aquele comentário estarparfudio.
-Ora Margery! Eu nunca faria isso! Não estamos sobre um contrato?
O modo como ele falou isso causou uma revolta emocional em Margery. Ela precisava dizer o que pensava.
-O contrato não me garante nada!E isso está bem claro já que milorde me deixou aqui  sozinha á minha própria sorte.
Theo sorriu com amargura.
-É o que merece por tudo o que fez. Não queria seu trono de volta? Não planejou me matar para estar na sua legítima posição de rainha? Pois então.
Margery sentiu lágrimas vindo aos seus olhos.
-Sim, eu sei que mereço seu castigo. Na verdade, deveria agradecê-lo por este castigo não é? Mas nada me impede de sentir medo de lhe falar. E tive medo, de vossa Majestade odiar... nosso... nosso filho... assim como me odeia. Tive medo que vossa majestade não aceitasse minha gravidez e me mandasse para um exílio qualquer, como já aconteceu comigo uma vez...
Theo a escutava, mas na verdade queria beija-la. Queria acariciar seu ventre protuberante onde ela aninhava o filho dos dois. Como ela estava linda e radiante! Por Deus! Como a queria!
-Eu nunca renegaria um filho meu. Mesmo sendo um bastardo eu nunca renegaria meu sangue, e também não a mandaria para o exílio. Jamais! De onde você tirou essa ideia?
Margery enxugou suas lágrimas, com o roupão leve que usava.
-Já vivi isso uma vez.
Theo balançou a cabeça. Estava cheio de mágoa e rancor por ela pensar o pior dele.
-Você não me conhece milady. Não precisa mentir para mim.
Eles se entreolharam com desafio e desejo. Com mágoa e atração. Os dois estavam entregues em seus sentimentos antagônicos e sofridos. Estavam prontos para encararem esses sentimentos?
Theo foi o primeiro a quebrar a sintonia em que se encontravam.
-Vou lhe falar pela última vez Margery. E dessa vez, é definitivo. Se mentir ou omitir a mínima coisa que for, eu não terei piedade de você. É uma promessa.
Margery levantou-se e de frente para ele e o enfrentou.
-E milorde? Pode mentir ?
Theo já estava se retirando do quarto e voltou-se para ela. Em seus olhos havia uma fúria ameaçadora.
-Pensa que minto como você?
Margery não alcançava seu peito, mas mesmo assim, levantou o queixo e o confrontou:
-Não mente?
Em sua memória, veio a cena e as palavras trocadas entre ele a princesa Aysha. Aquilo também não era mentir? Mentir para todos que ambos se amavam?
-O que pretende com isso milady?Me igualar a vossa majestade?
Margery virou-se costas e deitou-se em sua cama. Estava exausta do rancor que saia da boca do marido.
-Não. Apenas quero lhe mostrar que as vezes necessitamos mentir para nos proteger. Apenas isso.
Theo fechou os punhos. Não iria discutir com ela. Nas condições em que ela se encontrava, carregando um filho seu, o melhor seria relevar tudo isso e tentar recomeçar com Margery, de uma forma ou de outra.
-Apenas me prometa que não vai mais mentir para mim.
Margery fechou os olhos com tristeza.
-Eu prometo milorde.

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