Capitulo 27: A verdade

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Margery ficou andando pelo jardim de rosas de Craig. Cono eram lindas e perfumadas aquelas flores! Elas tinham pétalas sobrepostas e eram de uma maciez maravilhosa.
A escuridão propiciava que ela ficasse ali vendo o entra e sai de pessoas  pelos corredores que davam no salão de refeições.
Possivelmente pelo esvaziamento do lugar, o rei já havia se recolhido aos seus aposentos. Esperava que Theo  não viesse falar com ela, embora na verdade,   desejasse isso, ao mesmo tempo não queria, pois estava com muita raiva dele. Estava com raiva do que viu e ouviu e não sabia se iria perdoa-lo por aquilo.
De repente Margery viu o vulto de um cavalo, cortando a noite em alta velocidade.
Era Theo!
Margery ficou olhando o rei se afastar sem entender porque ele galopava daquele jeito tão arriscado, parecendo que esta sendo perseguindo por um dragão.
Para onde ele iria?
Dando de ombros ela caminhou para o aposento dos criados, ela não estava mesmo preparada para falar com ele naquele momento,.
Talvez o melhor fosse ir dormir e amanhã conversariam sobre o encontro que presenciou entre ele e a princesa Aysha.
Na  conversa lhe diria que sua decisão estava tonada. Não queria mais se relacionar com ele por vontade própria. Ele que  tivesse casos com quem ele quisesse, mas com ela?  Nunca mais!
..
No outro dia, Margery soube pelos  outros criados  que o rei havia partido. Lorde Joran anunciou que a comitiva partiria no dia seguinte e Margery ficou completamente atônita com aquela notícia. Toda a raiva que sentia desapareceu como fumaça. Ela se sentiu abandonada por ele.
Esquecida.
No dia da  partida, Margery  acordou  melancólicas. Lentamente, ela arrumou  seus dois vestidos numa pequena trouxa de linho, pensando  na confusão de seus sentimentos. Ao mesmo tempo que estava com raiva por descobrir que ele amava outra , também estava triste,  por saber que  ele foi embora sem se despedir, deixando-a para voltar sozinha com seus cavaleiros e soldados.
Os demais criados e o pajem do rei haviam  partido no dia anterior e a única coisa que ela pensava com desgosto,  é que novamente havia sido rejeitada.
Rejeitada como sempre foi por todos a quem amou e também a quem odiou.
Margery estava tão envolvida em seus pensamentos e na sua tristeza que não se deu conta de que não estavam na estrada indo o Brugnaro. Olhou na janela e viu que havia dois soldados ao lado da carruagem como se estivessem escoltando-a.
O coração de Margery ficou gelado. Aquilo não era nada bom.
Decidida a descobri o que acontecia, perguntou ao soldado do seu lado direito.
-Para onde estamos indo?
Os soldados se olharam, sem saber se deveriam responder ou não. Mas diante da beleza de Margery, um deles cedeu.
-Para Walden.
....
Taciturna, Margery viu quando a comitiva chegou ao pátio interno do castelo de walden. Era noite e fazia mais de cinco dias que  estavam na estrada, parando somente uma vez num mosteiro no meio do caminho. , e portanto, ela estava cansada com dores nas pernas e na bacia. Agora que havia chegado ao destino, Margery começou a sentir medo pelo que viria a seguir. O que a esperava naquele lugar? 
O Desconhecido.
E o desconhecido lhe dava um medo quase sobrenatural. Os cavaleiros saltaram de seus cavalos e entraram no castelo deixando-a para trás.Margery ainda ficou um tempo dentro da carruagem, pensando em como seria o seu encontro com o rei.
O vento da primavera naquele vale rodeado de pinheiros e carvalhos era frio. Mas Margery o achou o clima muito agradável. O castelo era enorme com uma grande muralha de pedra,  resguardando-o  de ataques inimigos e dividindo- o da vila por onde eles  havia passado no caminho.
Margery suspirou fundo. Seu desejo era sair correndo dali e nunca mais voltar. Sua aptidão para ser vítima já tinha acabado. Estava cansada de tanto sofrer!
Possivelmente o  rei a havia mandado para Walden para continuar subjugando-a  com gentilezas, para continuar a usufruir do seu corpo, ou talvez para expulsa-la definitivamente de sua vida.
As duas alternativas eram terríveis, mas ela teria que enfrentá-las, e apesar do seu estado de pesar com tudo o que estava acontecendo, ela não iria se entregar à dor,  e muito menos ao arrependimento. As coisas são como são. Estava escrito que seria assim.
...
Theo estava na janela da torre onde ficava seu quarto e ouviu o barulho dos cavalos.
Ari coração apertou. Ela havia chegado. Os cavaleiros apearam e entraram em  grupo no castelo,  enquanto um outro  grupo  recolhiam seus cavalos.
Ele viu Margery descer da carruagem, com seus cabelos presos na touca. Sua roupa simples lhe dava um ar desprotegido e frágil e ele sentiu uma raiva ao vê-la parada  no pátio, segurando uma pequena trouxa que trazia nas mãos, pois sua vontade era protegê-la.
Maldição! Como ainda podia sentir aquilo por ela?
Em poucos minutos estaria nazais presença, e não deixaria que o seu ar frágil o manipulasse novamente. Iria fazer o que tinha que ser feito. Ela era uma impostora e se não tomasse cuidado, cairia novamente  na sua rede traiçoeira.
...
Depois de estar no castelo de Craig, onde reinava a alegria , uma luminosidade natural do ambiente, seus jardins maravilhosos.,  ela estranhou a rigidez fria do castelo de Walden, que apesar de ser  grandioso com suas muralhas e torres fortificadas e com uma boa localização no alto de uma colina, o castelo tinha um ar soturno, quase assustador.
Nada ali  lhe  dava a sensação que iria ser bem recebida. Nada.
Margery então viu uma figura se aproximando. Era um homem alto e de cabelos grisalhos. Ele tinha o olhar sério, e não demonstrou nenhuma emoção ao vê-la.
Ele se aproximou e sua voz tinha um tom grave, aos ouvidos de Margery, o tom lhe pareceu cavernoso.
-Sou Edemont, o mordomo. O rei a aguarda.
Margery o seguiu, andando rapidamente, tentando acompanhar os passos largos do homem  a sua frente.
Eles entraram num salão escur e Margery notou que o lugar era estranhamente silencioso. Não havia pessoas transitando, nem conversas para encher o ambiente. Com uma iluminação precária, Margery acompanhou o mordomo,m silencioso, sentindo um arrepio na sua coluna enquanto subia as escadas iluminadas por poucos candelabros de velas. O ambiente era tão triste quanto seu dono. Então, seu coração se enterneceu com esse pensamento. Theo era um homem sozinho, acostumado a guerrear, a viver livremente, não devia se incomodar de chegar em casa e encontrar um lugar vazio como aquele.
Ou ele se importava? Será que gostava daquela solidão? Daquele isolamento?
Os dois  seguiram por um corredor enorme, e chegaram finalmente em frente a uma porta de madeira, onde o mordomo bateu levemente.
Em poucos minutos,  ouviu-se a voz de Theobald responder:
-Entre.
Margery não estava preparada para vê-lo de perto novamente. Em pensar que se fosse há alguns dias atrás, ela correria para seus braços e o beijaria com paixão, pendurada no seu pescoço e com as pernas em volta de sua cintura. Mas agora, aí se olharem  novamente, eles  pareciam dois estranhos se o confrontando.
Cada um perdido em suas mágoas e ressentimentos.
Assim que o mordomo fechou a porta, o silêncio se instalou.
Theo sentou-se na cadeira e apontou uma outra para que ela se sentasse.
-Sente-se milady. Temos muito que conversar.
Margery sentiu uma vertigem.
Estava preparada para brigar com ele, xingá-lo ou até mesmo perdoa-lo e fazer amor com ele a noite toda, mas não esperava ouvir aquilo!
Ela simplesmente ficou olhando para ele. Não conseguia falar absolutamente nada! Porque ele a havia  chamado assim? Será que ele havia descoberto seu segredo?
O que viria a seguir foi como no dia em ela fugiu de Brishen. Um enorme e assustador desconhecido. Mas com certeza, não devia ser nada bom, pois o semblante do rei era uma máscara fria e distante.
Quando viu que ela não conseguia sair sozinha do estado de abatimento que se encontrava, ele continuou, dessa vez, um pouco mais rude.
-Sente-se lady Margery.
Ela fechou os olhos e lágrimas caíram dos seus olhos.
Como havia sonhado com aquele momento! O que mais queria na vida, era ouvir ele lhe chamar pelo seu verdadeiro nome!
Finalmente, Diot estava no passado. Ela podia era Margery novamente. Não importa o que acontecesse dali pra frente. Ela renasceu, apesar da imensa dor que sentia ao perceber que ele, estava sendo profundamente desagradável e rude.
Lentamente, Margery sentou na cadeira com o corpo ereto. Colocou sua trouxa de roupas no chão e aguardou.
Theo a olhou decepcionado.
-Por um minuto eu pensei que você fosse negar que é a rainha Margery, mas é verdade não é?
Margery abaixou a cabeça. Não estava conseguindo pensar no que falar, mas precisava se livrar daquele fardo. Ele estava pesado demais!
-Sim, eu sou Margery, filha do rei Allard e da rainha Katter de Brugnaro.
Ele não conseguia tirar os olhos dela. A desfaçatez com que ela falou aquilo o irritou profundamente.
-E tem a coragem de me falar isso com essa calma? Você mentiu esse tempo todo! Mentiu para mim, para a corte e para seu povo! Não se sente a pior das criaturas por fazer isso?
O espírito de luta dela falou mais alto. Não iria deixá-lo humilha-la daquela maneira!
-Não! Não me sinto envergonhada porque fiz o que precisava ser feito.
Theo não acreditava no que estava ouvindo e falou com ironia:
- O que precisava ser feito era se revelar ser uma grande mentirosa? O que pretendia com essa história? Fale-me a verdade, se conseguir, é claro!
Margery levantou-se. Não suportava mais sentir o olhar dele sobre si como se quisesse devorá-la viva.
-Pretendia restituir meu trono.
-E como? Me enganando ou me matando?
Margery abaixou a cabeça. Como iria confessar que era isso mesmo que pretendia fazer?
Mas não conseguiu e o silêncio foi sua resposta.
-Você pretendia me matar? Confesse!
Margery continuou calada e ele se aproximou dela, pegando-a pelos braços e sacudindo-a levemente: - Confesse!
Margery afastou os braços dele com raiva. Quem ele pensava que era para tratá-la com tanta brutalidade?
-Sim! Eu pretendia matá-lo através da passagem secreta do meu quarto! Confesso que sim! Era meu direito fazer isso! Você é um usurpador, roubou meu trono!
Theo estava possesso de raiva e indignação.
-Não! Eu não usurpei seu trono! Eu lutei contra arruaceiros, rebeldes que poderiam invadir o meu reino. Não havia ninguém sentado no seu trono milady!
Margery não ia desistir de dizer o que pensava e acreditava.
- Não importa! Eu sou a herdeira legítima de Brugnaro milorde, e quero meu trono de volta por bem ou por mal!
Theo a olhou com desprezo . Não estava mais conseguindo disfarçar o  que estava sentindo.
-Não se preocupem milady,  vai ter o seu trono de volta, mas será  do meu jeito e terá que fazer o que eu mandar. Porque por causa de sua farsa, posso perder tudo o que conquistei a duras penas. Além do mais, depois de sua suposta morte, o imperador me cedeu essas terras e elas agora são minhas! Você pode ser a Rainha, mas está frágil politicamente, não tem aliados e se eu abrir mão de Brugnaro, outro virá e o invadirá, assim como eu fiz.
Margery reagiu indignada.
-Eu sou capaz de resolver meus próprios problemas, milorde -disse ela com raiva.
Theo lhe deu um sorriso mordaz.
-Sabe quem faz a segurança militar de Brugnaro? Os meus homens! Brugnaro não tem exército milady. Além do mais tenho aliados poderosos: Craig e Dalibor. Além do exército do próprio imperador caso eu precise. Sou um vassalo de vossa Majestade, caso milady desconheça essa informação.
Margery sentou-se novamente.
Suas pernas estavam bambas. As palavras dele calaram fundo  na sua alma, pois ela sabia que aquelas palavras ditas tão grosseira eram verdade.
Sentindo que estava numa situação extremamente delicada, ela sussurrou:
-E o que milorde sugere?
Theo a olhou com frieza. Sua voz tinha raiva e amargura.
-Vamos nos casar. Um casamento de conveniência. Milady recupera seu trono e eu não perco o meu.
Margery o olhou assustada, completamente perplexa com o que ouvia:
-Ca...casar com milorde? Não estou entendendo! Essa condição é inaceitável! não aceito isso! Não aceito de forma nenhuma!
O rei levantou-se e lhe estendeu um papiro. -Aqui estão as condições de nosso casamento. Leia.
Margery ficou olhando para o papiro e baixou os olhos envergonhada. Depois de alguns minutos falou:
-Eu não sei ler.
Theo riu e zombou dela
-Chega de mentiras milady! Pegue esse documento e leia agora mesmo!
Margery levantou-se e chorando lhe respondeu:
-Ru não estou mentindo! Eu não sei ler e nem escrever! Eu não sei! Não aprendi! Meu pai era contra mulheres eruditas, Malaki também, portanto, essa é a verdade. Acredite se quiser acreditar!
Atônito, Theo ficou um tempo segurando o papiro nas suas mãos. Não era incomum mulheres não terem educação, mas, usualmente, as mulheres nobres e as rainhas eram letradas e sabiam ler e escrever.
Sentindo-se desconfortável com aquela descoberta,m inusitada sobre ela, disfarçou ao notar  que ela, que chorava, envergonhada.
Sua primeira reação foi abraçá-la e consola-la, pois naquele momento, a impressão que ela lhe passava era de completa vulnerabilidade e abandono.
Mas se tivesse una reação de  carinho e cuidado,  ela certamente, o teria em suas mãos novamente e sabe -se lá o que viria depois.
-Sente-se milady. Vou relatar o que está escrito neste documento. É um contrato de casamento no qual lhe garanto a restituição do seu trono. Será a rainha consorte de Brugnaro e viverá lá no que chamaremos de terra da rainha, eu, ficarei aqui em Walden. Será a Castelã de Brugnaro, lhe será consentido realizar julgamentos menores, receber nobres, realizar visitas a outros reinos, mas, as suas funções serão exclusivamente sociais. Todas as decisões financeiras e militares ficará sob minha responsabilidade e sob a tutela dos conselhos de Brugnaro e Walden. Ou aceita essas condições, ou terá  que lutar cubra mim , e já lhe aviso: não sou um adversário fácil de ganhar.  Então, milady concorda?
Margery o olhou com mágoa. Ele queria reduziu-la a um mero enfeite, um objeto decorativo no seu próprio reino para não perder o seu poder. Ela ficou calada, pois sentia-se amarga por estar novamente numa posição de inferioridade, com um homem bruto e rude determinando sua vida e suas escolhas.
-Não quer saber meus motivos? Porque fiz o que fiz?
Theo a olhou com amargura.
-Quer me contar porque me usou para conseguir seus objetivos sórdidos ? Você confessou que iria me matar para restaurar seu trono! Porque acha que quero saber alguma coisa de você?
Margery o olhou envergonhada.
-Isso foi antes de... nós.. de nós...
Sentindo seu coração bater mais forte. Theo foi duro com ela e a interrompeu.
-Nada disso importa mais milady. Esqueça tudo o que aconteceu entre nós. Tudo!
Fechando os olhos Margery assentiu. Estava cansada de lutar. Ele não a amava! Nunca a amou!
Com os ombros encolhidos e sentindo-se a pior das criaturas, ela pensou que com o casamento, ela conseguiria o que sempre quis: Assumir o trono de seu pai, sem sujar suas mãos de sangue.  Esse pensamento lhe causou um sofrimento tão grande que estava difícil de suportar
-Milorde tem razão. Devemos esquecer o que aconteceu entre nós, e eu aceito suas condições. Já vivi coisas piores do que isso e sobrevivi.
Theo estava de costas para ela. A dor que o acometeu foi grande, quase insuportável, e a tristeza que ouviu na voz dela, quase o fez desistir de tudo e implorar pelo seu perdão e pelo seu amor. Mas não podia! Por mais que lhe doesse, ela não era nada confiável. Ela era uma farsante! Nunca mais deixaria seu coração disponível para ela. Nunca mais!
-Vou dar andamento á cerimônia de casamento.
Calada, e sentindo-se profundamente derrotada, Margery apenas assentiu com a cabeça.

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