Agora mesmo!

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ROSA

A pequena cidade era muito fofa e eu estava super contente em poder andar em um local diferente, sozinha. Era.. Libertador, ainda que amedrontador.

Aquele local era, teoricamente, humano, mas eu tinha certeza de que lobisomens deviam morar por ali. Ou já tinham morado, pelo menos, pois era tão próximo ao bando...

A cidade consistia basicamente de uma rua bem longa, onde o comércio, igreja, uma imensa fonte, uma praça, ficavam. paralelamente a essa rua, em linha reta, com apenas a fonte no caminho, tinha umas ruas, mas já era mais espaçadas, não tão lineares como a rua central.

Desci para a rua central e fui olhando cada lojinha. Algumas pessoas me olharam estranho, talvez por saberem que eu era uma pessoa "de fora". Cidade pequena normalmente os moradores todos, ou em grande maioria, se conhecem. É fácil reconhecer um forasteiro.

Entrei na livraria e nossa, que lugar lindo! Era pequeno, um pouquinho abarrotado, mas... era muito acolhedor!

— Oi! – Eu quase morri de susto! Uma garota de cabelos muito loiros na altura dos ombros e com mechas coloridas estava na minha frente, com um sorriso imenso no rosto — Eu sou a Gini!

Ela me ofereceu a mão para que eu acertasse e, ainda que um pouco assustada, eu o fiz. Ela parecia super legal, só muito... enérgica.

— Oi, eu sou Rosamund — falei, mantendo o meu tom baixo.

Ela olhou em volta e voltou a sorrir para mim.

— Por que está sussurrando? Não tem ninguém aqui! Como sempre, claro — Ela ainda sorria, mas eu vim um tom de tristeza, ou decepção, no rosto dela — Procura algo específico?

Eu balancei a cabeça de um lado para o outro.

— Hmm, não. Eu só estou visitando, mesmo.

— Mas você deve gostar de livros, ou não viria aqui.

Os olhos dela eram límpidos, entre verde e azul. Ela era toda bonita, fofinha. E ainda que eu não tivesse o meu lobo, eu podia farejar a minha espécie. Gini era, sem sombra de dúvidas, humana.

— Sim, adoro! — Eu falei e ela deu pulinhos, batendo palmas.

— Isso é ótimo! Me diz, qual o seu favorito? — Ela apoiou o cotovelo no balcão e me olhou como se eu fosse a criatura mais interessante do mundo. Pelo menos foi como eu me senti.

— Bom, eu não tive muitas oportunidades de ler onde eu morei quase a minha vida inteira. Mas... eu gosto de As viagens de Gulliver.

Ela arregalou os olhos e sorriu.

— Ótima pedida! Então, você gosta de aventuras?

— Eu acho que sim. É uma forma de eu poder ser "livre", sabe? É como se eu mesma estivesse viajando por ali.

— Hmmm, eu gosto desse livro, mas prefiro romances trágicos — Ela falou e a expressão no rosto dela mudou para uma de sofrimento — Eu sempre choro quando Otelo asfixia Desdêmona.

— Eu... eu não conheço... — Falei, me sentindo insegura.

Ela rapidamente me olhou e segurou a minha mão.

— Quer conhecer? Vem, vem!

Ela me puxa para uma parte da biblioteca e me mostra vários livros com jeito de antigos. Ela procura por algo e assim que encontra o que queria, ela o tira da prateleira e o mostra a mim.

"Otelo, o Mouro de Veneza".

— É maravilhoso. Claro, se você gostar de peças.

— Esse é o seu favorito? – Perguntei a ela, quem balançou a cabeça negativamente.

— Não. Eu gosto muito de Jane Eyre, mas meu coração pende para O Morro dos Ventos Uivantes. Gosto de personagens complexos, daqueles que você ama e odeia, sente pena. Me dá uma ideia de realidade — Ela falou e eu pude ver que ela era uma apaixonada por leitura.

— Eu vou querer ler esses livros — Falei, mas então, me dei conta de algo — Quando eu voltar aqui.

O sorriso no rosto dela murchou.

— E por que não leva agora mesmo? — Ela me perguntou, como se não fizesse sentido eu voltar depois, quando os livros estavam bem ali.

— Hmmm, eu estou desempregada. Então, quando eu tiver um emprego, eu vou poder comprar os livros.

Ela fez uma careta.

— Mas eu não disse nada sobre você ter que comprar.

Eu a olhei sem entender. Olhei para os livros e para ela novamente.

— Isso aqui não é uma livraria?

Ela revirou os olhos.

— É a minha livraria. Eu não poderia permitir que alguém com interesse por livros seja afastado de uma paixão tão maravilhosa porque lhe faltam algumas moedas! — Ela falou afetadamente e sorriu — Pode levar os livros.

— Isso é... isso é sério? — ela estava me dando livros?

— Claro! Ah, por sinal... que tipo de emprego você está procurando?

— Não sei. Eu... eu sei limpar. Sei cozinhar — Eu disse. Morando num bando, onde eu fui uma escrava, é claro que eu não tinha recomendações profissionais. Só agora eu me dava conta de como seria difícil arrumar um emprego.

— Você é bonita... Fala bem. Gosta de livros — Ela disse e sorriu de novo — Eu tô com uma vaga sobrando.

Eu olhei para ela e olhei em volta. O local claramente não era muito badalado. Como poderia ter uma vaga ali? Ela sozinha já estava até sobrando.

— Aqui tem muitos clientes? – Eu perguntei e ela deu de ombros.

— Não muitos. Mas os poucos que temos são o suficiente. Eu faria bom uso da sua companhia. Além disso, às vezes eu preciso fechar a loja para organizar as coisas. E é nessa hora que alguém quer comprar algo. Ter uma outra atendente vai me ajudar muito.

Eu não estava muito convencida, mas... para alguém como eu que não tinha qualquer experiência, não dava pra ficar escolhendo muito, não é mesmo? Além disso, seria bom começar a trabalhar num lugar calmo. Eu aprenderia no meu ritmo.

— Bom, se você me aceitar... — Eu falei, com medo de ter entendido errado o que ela falou.

Ela pulou e abriu os braços para me abraçar, mas acho que eu fiz uma cara de espanto, pois ela parou no meio do caminho e voltou a abaixar os braços.

— Desculpe, acho que fiquei muito empolgada!

— Sem problemas — Falei — E eu não deveria falar com o dono?

Ela ergueu o queixo, orgulhosa.

— Sou eu mesma!

Ok, eu não queria ser preconceituosa, mas aquela menina devia ter uns 18 anos, mas talvez pelo jeito animado, eu poderia dar até 16 anos para ela.

— Então, eu aceito!

— Excelente! Quando você pode começar? – Ela perguntou, animada.

— Agora mesmo!

Alfa Kurt - DEGUSTAÇÃOOnde histórias criam vida. Descubra agora