O meu mundo era limitado pelos quatro muros que
cercam a casa. Havia ainda uma pequena extensão territorial: a
Congregação e o colégio protestante. Não existia uma única margem
de liberdade de onde o espírito pudesse alçar vôo. Mas um
acontecimento em meados de 1978 me abriria uma janela para a vida.
Durante as férias de julho, os jovens de minha Congregação
programaram uma verdadeira tumê pela capital. Visitaríamos oito
Congregações, em trinta dias; sobretudo, na periferia da cidade.
Aprovei de imediato a idéia desse evento. Fiquei cheio de expectativa
ao pensar que o meu pequeno universo seria, enfim, expandido. As
férias chegaram e, na primeira quarta-feira do mês de julho,
começamos a turnê. As excursões estavam programadas para quartas
e sábados à tarde. De modo que a cena de quarta se repetiria no
sábado: um ônibus fretado estacionava em frente à igreja para nos
conduzir a uma das Congregações relacionadas no programa de
visitas. Era primeiro de julho. Naquele sábado, visitaríamos uma
Congregação no bairro do Carrão. Levantei-me cedo, alegre e
esperançoso, afinei e lustrei meu saxofone. Queria-o brilhando na
reunião daquela noite. Às duas da tarde eu já tinha tomado banho,
mamãe emplastara meu cabelo com creme e o penteara
cuidadosamente. Naquele sábado eu estrearia um novo corte de terno
de linho e uma gravata de seda importada. Mamãe arrumou minha
gravata, me beijou diversas vezes a face, chamando-me de seu
rapazinho, depois borrifou perfume francês em meu pescoço e na
lapela do terno. Eram 4h da tarde. Ela chamou o motorista e pediu
que conduzisse o "senhor Caio" à Congregação. Chegamos na hora
da partida do ônibus, Antônio, o motorista, colocou meu saxofone no
porta-malas do veículo e, dez minutos, depois o ônibus partia com
um grupo de jovens cantando, a pleno pulmões, hinos e canções
evangélicas. O culto teve início às 19h.
O grupo de visitantes abriu a reunião com canções
evangélicas. As 20h, nossa apresentação musical estava encerrada, a
partir daí simplesmente assistiríamos ao culto. Havíamos tocado por
quase uma hora. A noite estava quente. A igreja lotada, abafada.
Depois de tanto soprar em meu sax, eu sentia sede. Pedi ao Samuel
que tomasse conta do meu instrumento enquanto eu iria tomar água.
Ele assentiu e eu saí à procura de um bebedouro. Do lado de fora a
noite estava estrelada e fresca. A parte externa do templo ainda
estava em construção. Não havia bebedouros. Um rapaz me informou