Tive um sono irrequieto durante a noite de sábado para domingo, de agosto. A tristeza de Caio Graco tinha me perturbado demais o espírito.
Levantei tarde, quase meio-dia. Passava um pouco das duas
da tarde quando cheguei à casa de Caio. Procurei-o na biblioteca,
mas ela se encontrava vazia. O "Retrato de Caressa", que, até à noite
anterior, tinha espaço cativo na sala, agora se encontrava na parede
da biblioteca. Sobre a mesa havia um saxofone. Peguei o instrumento
e soprei uma nota desafinada. Percebi uma parte amassada. Ocorreume
que aquele era o saxofone que Caio mencionara em sua narrativa.
O instrumento que tocava quando adolescente. A voz de Antônio
irrompeu na biblioteca.
- Este é um instrumento muito querido pelo meu patrão -
observou da porta. Caminhou em minha direção e pegou o sax, com
um sorriso nas feições.
- Antes das sete da manhã Caio já estava tocando no alto da
figueira. Há muito tempo que eu não o via tocar o saxofone.
- Caio... tocando? - indaguei surpreso.
- Sim. Tocou muitas vezes uma canção que costumava
tocar quando era menino.
- E onde ele está agora?
- Saiu. Não me disse para onde ia. Primeiro saiu com o Alfa
Romeo. Retomou só para trocar de carro. Está com o carro branco...
Depois de um instante em silêncio acrescentou, sorrindo:
- Enfim, ele se barbeou....
- Barbeou-se?
- Sim. E também se vestiu com esmero. Está parecendo um
noivo, acho que ele venceu a depressão.
- Tudo indica que venceu...
Não quis dizer a palavra que me veio a cabeça, mas o que me ocorreu não foi que Caio tinha vencido a depressão, mas a morte.
- Ele deixou algum recado parta mim?
- Disse para que descanse, hoje. E que levasse as fitas para
começar a redação a partir de amanhã.
- Então, hoje realmente é um dia de domingo! Creio que vou gastar minha tarde de uma outra maneira.
Antônio sorriu.
- Acho que sim.
Tomei um táxi e retornei para casa. Apesar de não se estar no
inverno, a tarde era fria. O tempo estava agradável. Esperei o sol se
pôr e, pouco mais de seis da tarde, fui até o "Bar dos Miseráveis". Ali
tomei duas doses de Domecq, uma cerveja e comi uma porção de
salame. Não fiquei muito tempo, voltei para casa antes das nove com
0 mundo girando ao meu redor. Lancei-me à cama e dormi.
Foi preciso que dona Joana batesse com força e insistência
para que eu acordasse. Quando levantei, conferi a hora no relógio: