Por volta das duas da tarde, já me encontrava angustiado ante
possibilidade da Caressa faltar à aula de sexta-feira. A idéia de que, caso ela faltasse, eu só a reveria três dias depois me colocava em
verdadeiro pânico. Quando saí de casa com destino à escola o anseio
de vê-la era tão intenso que dirigi às cegas, meio sem rumo e quando
dei por mim estava fazendo um itinerário completamente diferente ao
que estava habituado. Estava passando pela rua onde havia deixado Caressa. Assim que percebi estar naquela rua, passei a observar com atenção as calçadas. Duas quadras depois eu a vi. Caminhava
cabisbaixa, os cadernos abraçados ao peito. Eu a segui, por uns
duzentos metros e, depois, aproximei-me. Buzinei. Ela parou, voltou-se
para trás e me olhou com a expressão mais triste, que jamais tinha
visto em seu rostinho. Voltou a baixar a cabeça e continuou andando.
Saltei do carro e corri para ela.
- Caressa...
Ela não levantou a cabeça, arfava de maneira contida.
Coloquei o dedo em seu queixo e o ergui. Seus olhos estavam
vermelhos, lacrimosos. Os lábios se contraíam, nervosamente. Eu
pressenti uma explosão de lágrimas e a envolvi com ternura em meus
braços. Ela chorou baixinho.
- O que foi? O que aconteceu?
- Minha mãe... Minha mãe está bêbada...
- Sinto muito... Gostaria de poder ajudá-la.
Ela enxugou os olhos.
- Ninguém pode ajudá-la. Só ela mesma...
Suspirou e continuou se desabafando:
- Eu sempre falto às aulas quando ela se embriaga. Tinha
prometido para mim mesma, que não faltaria mais. Quando peguei os
cadernos para sair, ela implorou para que ficasse. Quando eu lhe
disse que não ficaria... ela me xingou com palavrões horríveis...
- Fez bem em sair.
- Tenho medo de deixá-la sozinha, professor... Quando ela
sai bêbada pelas ruas sempre apronta escândalos.
- Não seja tão responsável por aquilo que não pode mudar.
Seus lábios prenunciaram o choro.
- Estava indo para a escola... - disse, abrindo a porta do
carro - Entre! Posso levar você até lá.
Ela entrou. Sentei-me ao volante. A olhei em silêncio.
- Não quero ir à escola... - murmurou com voz
entrecortada.
- Quer que a leve para casa de algum parente?
Ela balançou a cabeça, recusando. Liguei o carro e arranquei.
- Vou levá-la para ver algo de que, tenho certeza, vai
gostar.
Minutos depois o portão de casa se abria para a passagem do