Segunda-Jeira, 31 de julho de 1978.
O dia haveria de ser longo. Antônio me levaria ao hospital e
só me buscaria à tarde. Foi o que combinei com mamãe. Ela me deu
cinqüenta cruzeiros para que eu almoçasse. Disse que não queria me
ver adoecer. Vesti-me com capricho. Queria que Caressa me visse
com emoção renovada.
No caminho, pedi ao Antônio que passasse no shopping.
Depois de circular por várias lojas, consegui o objeto que tinha em
mente. Antônio se mostrou curioso em saber o que eu havia
comprado. E eu não ocultei de meu amigo. Não era nada demais:
apenas uma tiara forrada com tecido branco e com uma minúscula
florzinha fixada ao lado direito. Queria tornar a cabecinha grega de
Caressa ainda mais bonita e delicada com aquele adorno infantil.
O carro avançava pela estrada e eu ia com o rosto quase
colado no vidro, com os olhos correndo pela paisagem urbana. O céu
estava azul e o sol, embora tímido, inundava o ambiente com sua luz.
Meu espírito estava sereno, apaziguado, quase feliz. Tinha motivo
para isso: "mamãe parecia ter se rendido à inexorabilidade de meu
amor. Os inimigos declarados, e os não declarados, estavam
derrotados. Eu amava Caressa e ela me amava. Seria apenas uma
questão de tempo e estaríamos juntos para sempre. Agora, nada
haveria de nos separar. Queria estar com ela vinte e quatro horas por
dia". Estes eram os pensamentos que desfilavam em minha mente.
De repente, mirando a paisagem, percebi que o céu havia se
tomado tenebroso. O sol tinha sido encoberto por assustadoras
nuvens negras. A paisagem se tomara acinzentada e ventos sinistros
envergavam as copas das árvores.
- O que acontece com o tempo, Antônio?
- A meteorologia anunciou chuva para hoje -informou.
Um vento gelado fez eriçar todos os pelos dos meus braços.
- Seu vitrô está fechado, Antônio?
- Sim.
- Que vento frio foi esse, então?
- Vento frio? Só lá fora, patrãozinho... eu não sinto nada.
- Sim! Um vento frio, Antônio...
Senti novamente o vento frio. Só que desta vez, eu o senti
soprar de dentro para fora do meu corpo.
- Um mau presságio, Antônio! É isso o que senti! Um vento
gelado como o sopro da morte em meu coração!
- O que lhe está acontecendo? - perguntou reticente.
- Corre, Antônio! Corre! - gritei - estou pressentindo