Capitulo 20

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Segunda-feira, 2N de setembro de 1992.


A urde, caiu a primeira chuva de primavera. A chuva que


faria desabrochar as flores. A chuva que faria renascer minha vida.


Naquele dia fui para frente da escola sem nenhuma certeza de vê-la.


A chuva me obrigou a permanecer dentro do carro. Estacionei a


apenas dez metros do portão, para garantir, se acaso ela existisse, a


de possibilidade de vê-la. Liguei o desembaçador e o ar condicionado


para tentar evitar que os vidros se embaciassem. Ainda assim a


visibilidade ficou prejudica. Havia, também, os guarda-chuvas dos


meninos e as sobrinhas das meninas que me obstruíam a visão do


rosto dos que passavam. Em resumo, naquela segunda-feira, ainda


que ela passasse por mim, a possibilidade de revê-la estava muito


reduzida. O destino, porém, não escolhe dia. Haveria de revê-la


naquela tarde chuvosa. Haveria de revê-la sob a chuva de primavera.


Eu observava cada estudante. Nem sempre conseguia ver-lhes os


semblantes, sob suas sombrinhas. Com ela teria sido o mesmo se, ao


passar ao lado do carro, ela não tivesse levantado, a sombrinha e


lançado um rápido e curioso olhar para dentro do veículo. Foi um


instante apenas. Nesse instante, ela olhou para mim. Ela não olhara


só para dentro do carro, mas para mim e, por um instante, nossos


olhares se reencontraram. Ela era real. Imediatamente abri a porta e


saltei debaixo da chuva, corri para a calçada e fiquei a vê-la. Então,


algo de mágico, de misterioso aconteceu: antes de entrar no vão do


muro ela parou e virou-se na minha direção. Estávamos a dez metros


de distância, mas nossos corações estavam tão próximos que podia


sentir o batimento do seu coração. Ficamos nos olhando por alguns


segundos. Depois, ela voltou-se para o portão e entrou. Eu estava


encharcado, feliz. A felicidade sentida naquele instante foi algo que,


como a dor da saudade, não traduz em versos, nem em palavras.


A noite cumpri minha obrigação de professor. O homem que entrou na da sala de aulas, naquela ocasião, era completamente


diferente do sisudo mestre, que meus alunos conheciam. Era um


homem menos enrijecido, melhor: era um adolescente feliz com o


paraíso reencontrado.


Entrei na sala e repeti o mesmo gesto de censura que me


caracterizava: fechei a porta às minhas costas e lancei sobre a sala o


meu olhar autoritário. O burburinho de vozes foi decrescendo até o


mais completo silêncio. Então minhas feições se distenderam e eu

Chuva De NovembroOnde histórias criam vida. Descubra agora