Segunda-feira, 2N de setembro de 1992.
A urde, caiu a primeira chuva de primavera. A chuva que
faria desabrochar as flores. A chuva que faria renascer minha vida.
Naquele dia fui para frente da escola sem nenhuma certeza de vê-la.
A chuva me obrigou a permanecer dentro do carro. Estacionei a
apenas dez metros do portão, para garantir, se acaso ela existisse, a
de possibilidade de vê-la. Liguei o desembaçador e o ar condicionado
para tentar evitar que os vidros se embaciassem. Ainda assim a
visibilidade ficou prejudica. Havia, também, os guarda-chuvas dos
meninos e as sobrinhas das meninas que me obstruíam a visão do
rosto dos que passavam. Em resumo, naquela segunda-feira, ainda
que ela passasse por mim, a possibilidade de revê-la estava muito
reduzida. O destino, porém, não escolhe dia. Haveria de revê-la
naquela tarde chuvosa. Haveria de revê-la sob a chuva de primavera.
Eu observava cada estudante. Nem sempre conseguia ver-lhes os
semblantes, sob suas sombrinhas. Com ela teria sido o mesmo se, ao
passar ao lado do carro, ela não tivesse levantado, a sombrinha e
lançado um rápido e curioso olhar para dentro do veículo. Foi um
instante apenas. Nesse instante, ela olhou para mim. Ela não olhara
só para dentro do carro, mas para mim e, por um instante, nossos
olhares se reencontraram. Ela era real. Imediatamente abri a porta e
saltei debaixo da chuva, corri para a calçada e fiquei a vê-la. Então,
algo de mágico, de misterioso aconteceu: antes de entrar no vão do
muro ela parou e virou-se na minha direção. Estávamos a dez metros
de distância, mas nossos corações estavam tão próximos que podia
sentir o batimento do seu coração. Ficamos nos olhando por alguns
segundos. Depois, ela voltou-se para o portão e entrou. Eu estava
encharcado, feliz. A felicidade sentida naquele instante foi algo que,
como a dor da saudade, não traduz em versos, nem em palavras.
A noite cumpri minha obrigação de professor. O homem que entrou na da sala de aulas, naquela ocasião, era completamente
diferente do sisudo mestre, que meus alunos conheciam. Era um
homem menos enrijecido, melhor: era um adolescente feliz com o
paraíso reencontrado.
Entrei na sala e repeti o mesmo gesto de censura que me
caracterizava: fechei a porta às minhas costas e lancei sobre a sala o
meu olhar autoritário. O burburinho de vozes foi decrescendo até o
mais completo silêncio. Então minhas feições se distenderam e eu