9. Sentimenti contrastanti

844 68 164
                                    

Ouvir o hino de Mônaco seguido do hino italiano do lugar mais alto do pódio era com toda certeza uma das sensações mais maravilhosas que Charles podia ser capaz de sentir. Desde a primeira vez que ouviu até hoje ─ talvez não tanto em sua primeira vitória já que aquele fim de semana havia sido terrível devido a morte de um grande amigo e colega de profissão ─, era a mesma emoção, ele sempre se sentia incrível, como se ninguém fosse capaz de lhe atingir, nada podia lhe afligir ou estragar seu momento.

E essa vitória havia sido especial. Charles nunca se sentiu tão bem dentro de um carro, o f1-75 simplesmente voou em suas mãos hoje, ele quase nem teve trabalho nenhum, precisou somente pilotar no mais puro instinto. Ele jamais esqueceria aquele primeiro lugar na Austrália em 2022, havia feito o primeiro Grand Chelem de sua carreira e nem sabia descrever o sentimento que isso trazia. Havia largado da pole após fazer um tempo incrível no sábado, e hoje, já segurou a liderança assim que largou, sumindo das vistas do segundo colocado, simplesmente enfiando 20 segundos de diferença; além de também ter feito a volta mais rápida e liderado a corrida da primeira à última volta. Provavelmente ninguém na equipe esperava algo tão perfeito, muito menos ele, que sentiu sua pouca autoconfiança ser balançada com o resultado não tão excelente em Jeddah.

E a cereja do bolo era que Max havia sofrido mais um DNF. O holandês novamente ficou sem pontos e Leclerc estava simplesmente disparado na liderança. Era só a terceira corrida do ano, mas enquanto estava ali no pódio, mexendo devagar seu corpo de um lado pro outro enquanto ouvia o trecho final do hino da Itália, ele não pôde deixar de sonhar com o título daquele ano. Desde que chegou na Fórmula 1, ser campeão sempre lhe pareceu algo tão distante, mas naquele momento, era uma coisa extremamente palpável.

Porém, se Charles estava absolutamente radiante e feliz, Carlos não poderia dizer o mesmo. Assim como Verstappen, o espanhol também havia sofrido um DNF, sendo obrigado a abandonar a corrida e, consequentemente, terminar sem pontos. Ele encontrava-se sentado na garagem da equipe, com o macacão pendurado na cintura e uma garrafa de isotônico, bebendo do líquido pelo canudo longo enquanto via pela TV o pódio de Charles. Carlos não iria ser desonesto consigo mesmo, era claro que estava feliz pelo colega, ele havia tido um resultado incrível e isso era maravilhoso. Entretanto, a raiva que sentia pelo DNF era maior do que qualquer felicidade por ver o monegasco sorrindo daquela forma que se tornou avassaladora para ele.

Decidiu que seria melhor não acompanhar o pódio dele, quis ficar quietinho na sua e remoer sua derrota sozinho. Não queria que sua energia ruim estragasse a festa dele e nem dos outros pilotos, George Russell também estava muito feliz por ficar entre os três primeiros pela primeira vez em sua carreira. Viu uma parte do estouro do champanhe, Checo e George jogavam a bebida em Charles que ria daquela maneira que só ele conseguia fazer, imaginava que a felicidade dele não deveria caber no peito. Carlos conseguiu dar um sorriso nesse momento, era bom saber que não veria aquele Charles entristecido, de cabeça baixa e se autocobrando horrores, pelo menos não hoje.

Sainz deu um suspiro e saiu da garagem, indo para os fundos do motorhome se sentar nas mesmas caixas que Leclerc gostava de ficar quando estava pensativo. Havia aprendido com ele que aquele era um bom esconderijo, logo o pessoal da equipe começaria a retornar ao box e ele não queria ser amolado com frases do tipo "sinto muito, Carlos, vamos trabalhar pra que não aconteça na próxima corrida". Quem eles queriam enganar, afinal? Estavam todos muito felizes pelo Grand Chelem de Charles, aquele garoto tinha tudo para ser campeão mundial naquele ano e isso fazia a equipe pouco se foder pra ele. Carlos seria apenas um escudeiro para Charles nessa temporada, tal qual Checo foi para Max no ano passado, e isso doía de uma forma que o fazia se sentir mal, embora estivesse começando a se acostumar com a ideia. Era óbvio que queria o bem do colega, vê-lo feliz assim começou a ter uma importância quase que assustadora para Carlos, mas ele também era um piloto, também sonhava em conquistar títulos, e nesses momentos não conseguia não ver Charles como um concorrente. Eram complicados todos esses sentimentos, era uma alegria e uma inveja que quase que não conseguiam andar juntas, mas andavam, pois ambas faziam parte dele.

Desideri NascostiOnde histórias criam vida. Descubra agora