Capítulo 208: Verdade ou mentira?

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POV Luna

Acordo com o som de resmungos ao meu lado. O quarto ainda estava escuro, pego o meu celular, cinco e vinte da madrugada. Cristal ainda dormia, mas, como outras noites, estava inquieta. Algumas gotas de suor molhavam o rosto dela, alguns espasmos faziam dobras no lençol e a respiração acelerada, mais um pesadelo.

Acendo a luz do quarto para ela conseguir se localizar quando abrir os olhos e sento próxima a ela.

— Cristal! É um pesadelo, acorda. — Digo com calma enquanto limpava o rosto dela.

O olhar assustado com as pupilas dilatadas em pouco tempo dá lugar ao choro. Puxo o corpo dela para o meu colo e a abraço forte enquanto fazia cafuné. A pele dela estava fria, os lábios não possuíam o tom avermelhado de costume. Não era um momento para conversarmos, sabia que ela só queria se sentir segura e amada enquanto se acalmava. Tratar essa situação com tanta confiança fazia-me sentir um incômodo. Não era a primeira, segunda ou quinta vez que isso se repetia, também não seria a última.

Cristal se recusava a falar sobre, então apenas podia imaginar os horrores que testemunhava ou revivia ao dormir. Com a proximidade dos nossos corpos consigo sentir o coração dela acelerado. Escoro o meu tronco na cabeceira da cama, ela se ajeita sobre o meu corpo e sem querer apoio as minhas mãos na parte superior das costas dela que se encolhe com o meu toque.

— Desculpa! Não foi proposital. — Desço as minhas mãos para a cintura.

— Isso não deveria ser um problema. — Ela levanta, enxuga o rosto e se senta na borda da cama de costas para mim. — Odeio isso! — Um sussurro quase inaudível se não fosse pelo silêncio da noite.

— Vai conseguir melhorar. — Bato na cama ao meu lado como um convite para ela aproximar. — Se compararmos na primeira semana que ficamos nessa casa e hoje, a sua evolução é indiscutível. — Ela sorri envergonhada e senta onde indiquei.

— Lembro de comentar comigo sobre os seus pesadelos. É uma memória verídica ou falsa? — Ela encarava-me à espera da resposta.

— Verídica, nunca nos aprofundamos tanto nesse assunto, mas já tentei lhe explicar o que acontecia. — Digo com o olhar fixo no teto.

— Conseguia me ver, certo? — Ela parecia curiosa após tanto tempo que não conversávamos sobre essa questão.

— De forma bem leiga é uma condição descoberta há pouquíssimo tempo e ainda não possui muitos estudos ou casos para conseguirem criar uma justificativa científica. Amanda saberá informá-la muito melhor do que eu, mas... Naquela época, conseguia ver alguns momentos que você passou. — Tento explicar à minha maneira.

Ficamos em silêncio por poucos segundos quando um questionamento surge em meio a pensamentos soltos.

— Esse interesse repentino agora, por quê? — Questiono curiosa, olho para ela, silêncio.

Espero na esperança de que ela apenas esteja a formular uma resposta, mas uma lágrima solitária desce pela bochecha dela.

— Cristal, com o que você sonha? — A minha pergunta a faz voltar o olhar para mim.

— Ele ainda não desistiu de me encontrar, Luna. — Soluços concluem a frase e as minhas batidas falham o ritmo.

Os meus pensamentos estavam tão desorganizados, inconclusivos, confusos. Como isso seria possível? Por quê?

Queria continuar a conversa, mas não encontrava palavras. A minha boca estava seca e ela volta o olhar para o teto enquanto continha as lágrimas nos olhos.

— Quando os pesadelos começaram, tinha certeza que não passavam duma paranoia. Uma ilusão criada pelo meu cérebro devido ao estresse e ao medo. Acreditei nisso até encontrar evidências, rastros do que testemunhava enquanto dormia. — Ela encarava-me, precisava ter cuidado com as minhas palavras, não queria a assustar. — E mesmo depois disso, ainda tinha dúvidas e quanto mais fortes esses sonhos ficavam, mais medo tinha deles. Ver o que fizeram a você todas as noites sem ter como agir... Enlouqueci, não soube lidar. — Estava angustiada, não me sinto confortável com todas essas lembranças.

— O que a ajudou? — Cristal deita-se virada apara mim.

— Primeiro acreditei que ficar acordada resolveria o problema. Os dois primeiros dias não foram tão difíceis, tomei alguns energéticos, café. Não senti que alterou muito a minha rotina, na verdade, tinha mais tempo para treinar e tentar encontrar alguma dica de onde poderia encontrá-la ou do plano deles. Depois do terceiro dia, os problemas começaram, estava frustrada, irritada. O meu humor se tornou desastroso ao ponto das meninas me evitarem. Não importava o que elas dissessem, conseguia um jeito de encontrar um erro mesmo que mínimo e xingava quem quer que estivesse na frente. — Ouço Cristal rir. — É! Nem posso me defender, sentia como se tudo e todos a minha volta, estivessem contra mim. Não conseguia relaxar ou controlar essas explosões de raiva. As meninas me forçaram a me consultar com a Doutora novamente, nisso ela me receitou alguns medicamentos. Essa foi a minha segunda e última tentativa, deitava na cama, tomava os remédios e em seguidos estava apagada. Acordava no dia seguinte sem me lembrar com clareza de como cheguei na cama, mas o importante era que os pesadelos pararam.

— Consigo imaginar o seu alívio. — Ela sorri fraco.

— Fiquei alguns meses nesse tratamento até não conseguirmos mais nenhuma informação sua ou da máfia. Demorei alguns dias para decidir parar com os remédios e enfrentar os pesadelos de novo e, sinceramente, preparei-me para a encontrar morta. — Desvio do olhar dela, não conseguiria encará-la nesse momento.

— O que viu nessa noite? — A voz dela era calma, como se não importasse as minhas últimas palavras.

— Nada, não consegui ter nenhum sonho real ou subconsciente. Até o dia que a resgatamos. Minha vez de perguntar, você estava comigo num lugar estranho totalmente iluminado, verdade ou mentira? — Ela solta um riso envergonhado.

— Verdade e mentira.

Nem a distância nos separa (Continuação)Onde histórias criam vida. Descubra agora