Capítulo 219: Desespero

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POV Luna

Horas antes

Guardo o celular, observo a viatura fechar a entrada da loja, aviso no rádio e percebo que começaram a negociar. Foi fácil abater os dois primeiros, eles estavam tão focados no interior da loja que nem devem ter cogitado o meu posicionamento. O prazer de observar o olhar deles quando já sabem que é o fim, nem sou capaz de encontrar algo para comparar.

Rádio ligado.

(Ivete): temos um pequeno problema. — Sinto apreensão nas palavras dela. — Luna, não desespera!

(Luna): acertaram alguém? Está machucada?

(Gabi): por que não está no seu lugar, Ivete? Um deles já entrou!

(Ivete): merda! Não consigo acalmar a Cristal, ela surtou depois dos disparos!

(Luna): como assim? Descreve como ela está. — Já não tinha foco para os policiais.

(Ivete): ela soltou a pistola, abraçou os joelhos e está hiperventilando. Acredito que é uma crise de ansiedade, tentei conversar com ela, mas é como se só o corpo estivesse aqui. Não sei explicar, o dela está perdido, sem brilho e às vezes ela balbucia algo que não consigo entender.

(Luna): vou dar um jeito de ir aí! Sabia que deveria ter impedido ela!

(Gabi): meninas, FOCO! Se sairmos das posições agora vamos ser presas e ninguém vai conseguir ajudar ou pior, vamos levar uma bala na cabeça e nos despedir num caixão! — Queria correr para ela, mas Gabi está certa, isso só geraria mais problema. — Vamos acabar com esses putos! Depois resolve o problema da patroa. — Concentra, Luna, logo isso vai acabar.

(Luna): o cara que entrou está atrás da terceira prateleira, os outros dois estão escondidos na viatura, não tenho mira para eles.

(Ivete): não eram sete? Só matamos três, não? — Droga! Perdi visual de um.

(Gabi): confere se o último não está na loja, Luna.

(Luna): desculpa, meninas, não tenho visual dele.

(Gabi): então fica de olho na escada do seu prédio, ele deve tentar pegar você, pelas costas.

(Luna): a escada é muito longe de onde estou, não vou conseguir vigiar ela e a entrada ao mesmo tempo.

(Ivete): foca nas suas costas! A gente consegue se virar com os merdas daqui.

(Luna): estarão em minoria se eu sair.

(Ivete): não confia na gente? Ninguém passa por essa dupla dinâmica. Mata o cara nas suas costas e depois volta para ver a minha pilha de corpos.

(Gabi): NOSSA pilha de corpo, egoísta!

Rádio desligado

Rastejo para longe da beirada e me levanto atrás de uma caixa de água. A escada estava a poucos metros de mim, quanto antes o homem que perdi estiver morto, mais cedo conseguirei ajudar as meninas. Caminho até próxima à descida, abaixada, tento verificar se alguém rondava o lugar e percebo um tiro que atinge o concreto sob os meus pés. Instintivamente, deito para que o próximo não me atinja.

Rádio ligado.

(Luna): encontrei o patinho perdido.

(Gabi): já matou ele?

(Luna): não, está provavelmente escondido no beco embaixo da escada. Só sei porque ele tentou me acertar, mas não tive tempo para ver a posição exata.

(Ivete): os dois da viatura se juntaram ao cara da prateleira. Acredito que não vão demorar para invadir o depósito, quero acertar mais um antes disso.

(Gabi): cuidado! Não afoba, estamos com a vantagem da nossa posição e eles ainda não sabem de mim. Deixa eles se aproximarem.

Rádio desligado.

Decido usar a tela do meu celular como espelho, aproximo da beirada da escada e lentamente mudo a direção dele até encontrar o rato escondido entre as caçambas de lixo. Dois disparos, um ao longe, provavelmente na loja, e o outro atinge o meu aparelho e os estilhaços cortam a minha mão. Xingo o filho da puta mentalmente, gostava desse celular.

Rádio ligado.

(Ivete): mais um para a conta da mãe!

(Luna): achei o fujão, esse puto me custou um celular.

Rádio desligado

Não ouvi passos, ele ainda deve estar no mesmo lugar. Se eu rolar para a outra ponta dessa mureta, devo conseguir uma mira limpa para ele. O mais silenciosamente possível, me arrasto até a quina do prédio, consigo enxergar a ponta da pistola dele ainda mirada onde estava com o celular. Atiro na caçamba, próximo a ele e o susto o desespera. Na tentativa de encontrar outro esconderijo, uma bala na perna o faz cair no meio do beco, sorrio e mais um olhar assustado ficará marcado na minha memória.

Rádio ligado.

(Luna): terminei aqui, vou voltar para a frente da loja.

(Ivete): nem vem, quem vai matar mais pula hoje serei eu! — Um disparo ressoa.

(Gabi): Ivete, caralho! Responde!

(Ivete): droga!

(Luna): o que aconteceu? — Assumi a minha posição inicial e percebo que ainda haviam dois policiais vivos entre as prateleiras da loja e respingos de sangue na porta do depósito.

(Ivete): afobei, um deles acertou o meu ombro, aquele babaca estava mirado na porta, só a espera de um deslise, vacilei. O pior é que soltei a minha pistola e ela parou perto da primeira prateleira. Foi mal, galera, fiz merda.

(Gabi): foca em estancar o seu sangramento, cabeça oca, ainda avisei que não era para sair da posição.

Rádio desligado.

Observo que apenas um dos policiais está atento a porta enquanto o outro tentava alguma comunicação pelo rádio. Aproveito a oportunidade e com duas balas, o distraído agora agonizava com as mãos sobre o abdômen ensanguentado. Devido ao disparo, o último se esconde para não ter mais visual dele.

Rádio ligado.

(Luna): abati mais um, mas o outro saiu da minha visão. — Aviso enquanto com mais um disparo, acabo com a dor do ensanguentado que ainda tentava alcançar o rádio.

(Gabi): consigo ouvir ele, inquieto, deve estar se preparando para entrar no depósito.

(Ivete): vou pegar a pistola da Cristal, mas não contem comigo, esse ombro me fodeu bonito.

(Luna): vou descer até vocês!

Rádio desligado.

Desço as escadas, as pressas, e enquanto atravessava a rua, o meu coração dispara por alguns segundos quando vejo o homem entrar no depósito e os estrondos dos disparos me faz acelerar o passo. Assim que entro no cômodo, vejo Gabi cuidar da Ivete ao lado de um corpo alvejado e Cristal com as pupilas dilatadas abraçada aos próprios joelhos, tão pálida quanto quando a encontramos. Coloco as mãos no rosto dela, ajoelho e sinto a frieza da pele dela.

Nem a distância nos separa (Continuação)Onde histórias criam vida. Descubra agora