Capítulo 205: Disputa pessoal

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POV Luna

O apito já não assustava ou incomodava a minha audição. Os dois possuem um estilo de luta muito semelhante, o foco de força nos braços, raramente chutavam ou usaram as pernas para marcar qualquer ponto. Também não são bons em esquivas, apenas bloqueavam os golpes do outro e tentavam revidar. As perguntas não foram as mais inteligentes, então não conseguimos muita informação, as mais relevantes foram: Kátia e Fabrício são os líderes dos Vagos, o objetivo da Tríade na cidade é crescer no mercado ilegal e Arthur é o terceiro da liderança responsável pelas estratégias da facção. Leandro venceu ao dar um mata-leão no oponente, o qual ficou inconsciente, na sexta rodada. É a vez da Clarisse escolher o desafiante!

— Luna, "líder" das Hell's. — Ela zomba com um sorriso a me menosprezar.

O meu olho doía e o sentia inchado, já não conseguia o manter aberto, mas não deixaria isso me atrapalhar.

— De novo? Vejo que temos uma rivalidade entre os novatos. Isso seria um problema que os acompanhou na viagem ou algo recente? Escolha o seu oponente, Luna! — Gonzales gritava a balançar as cordas enquanto entrava no ringue.

— Clarisse. — Escolho sem muita paciência.

— Foi mal, gata! A minha família participou da anterior, estamos imunes. — Ela ri e Kuro interrompe antes que a respondesse.

— Isso obviamente é uma disputa pessoal e a oponente não participou de nenhuma luta anteriormente. Diferente da Luna que venceu a disputa com o maior número de rodadas da noite. Façam uma votação, se a maioria aceitar abriremos uma exceção para essa situação. — Ele sorri enquanto a expressão da Clarisse se fechava e o fuzilava.

— Levantem a mão quem concordar com a luta entre Luna Carter e Clarisse Magalhães. — Umi chama a atenção de todos e nem foi preciso contar, apenas o pessoal da Tríade não estava de acordo. — Sobe no ringue, parceira e vê se não amarela. Estava toda afrontosa fora das cordas, vamos ver se consegue aguentar essa marra dentro também.

— Isso não é justo! A regra era outra. — Clarisse se recusa a subir no tablado.

— Uou! Bem, podemos mudar as regras quando quisermos, não sei se ainda não percebeu, mas somos nós que mandamos aqui. Caso não concordem... — Kuro aponta para a escada de saída e os Bloods abrem espaço para a passagem deles. — O objetivo do jogo era conseguir informações, você desafiou a Luna por alguma vingança. Sabia que ela já estava machucada e se aproveitou da situação. Nada mais justo do que subir naquele ringue e confrontá-la.

— Iai, Tríade! Vão sair de bom grado? Querem ser expulsos ou a medrosa afrontosa vai subir? — Gonzales a provocava.

— Até parece que tenho medo dessa garota. — Clarisse tira o blazer e passa pelas cordas enquanto o público gritava em êxtase.

Nossos olhos estavam fixos na outra e algumas memórias voltavam. Festas, beijos, conversas e passeios. Éramos namoradas a poucos anos, aliadas, amigas. Agora nos preparávamos para uma briga diante de uma plateia que mal conhecemos. Gostaria de saber em qual momento o mundo virou de ponta cabeça. Não tinha motivos até hoje para ter raiva dela, então por que me provocou? O que ganharia com essa briga?

Em meio aos berros, mal notei o soar do apito. Apenas voltei a mim quando a vi avançar na minha direção. Não era uma luta como as outras, ela estava com raiva. Clarisse sempre foi tão pacífica ou era assim que eu a via. Desviava de golpes fortes, ela não queria marcar um ponto, mas me machucar. Os passos firmes do coturno e os olhos vermelhos. Clarisse nem mesmo piscava para não me perder de vista. Isso não é sem motivo, não podia ser, mas qual seria? O que fiz para ela agir assim? Foca na luta, Luna, existem perguntas sem resposta, essas são algumas delas.

Tantas questões confundiam o meu raciocínio e, ao defender um chute na lateral da minha barriga, sou acertada por um soco no maxilar. Ouço um estralar ou ranger. O local doía tanto quanto o meu olho, não sabia onde deixar a minha mão.

— Aí a medrosa para vocês! — Ela grita ao apontar para mim.

— É galera, assistimos a uma luta raivosa e o primeiro ponto é da líder da Tríade! Faça a pergunta, garota. — Gonzales não escondia a empolgação diante da situação.

— Quantas vidas perderam na invasão da mansão do litoral em São Paulo? — Ela já sabia disso, mas ficou à espera da minha resposta e um silêncio constrangedor se instaurou com a pergunta.

— Três. — Digo e ela ri.

— Incompetência o nome disso, sacrificaram três para salvar uma que nem tem condições de ajudá-las. — Clarisse já não se importava com nada do que tivemos, nem mesmo respeitava, por que eu deveria me conter?

O soar do apito sem nenhum comentário de Gonzales. Silêncio na plateia, podia sentir os olhares em mim e sinceramente não me importava. Deixo-a se aproximar como antes e dessa vez, ao invés de apenas esquivar, acerto um soco no centro dos peitos dela, o qual a faz dar dois passos para trás com falta de ar. Não controlei a força, nem mesmo queira. Clarisse se apoia nas cordas enquanto recuperava o fôlego.

— Ponto para Luna Carter! — As comemorações estavam abafadas na minha cabeça.

— Qual o motivo para tudo isso? — Pergunto irritada.

— Não tem um motivo. — Ela responde ao respirar fundo.

— Mentira! — A voz de Octavius ressoa das minhas costas. — Foi você que disse: a verdade, essa é a regra do jogo.

— Vingança! — Ela responde enquanto o encarava.

— Temos um empate, próxima rodada. — Gonzales, confusa, observava Octavius.

Era difícil ter uma noção certa de tempo quando estamos mais preocupadas em não sermos atingidas. Na cabeça se passara segundos enquanto o meu corpo cansado implorava por um descanso. Avançar de qualquer forma não me ajudaria, precisava encontrar uma abertura ou padrão nos golpes delas. Clarisse estava cega de ódio, não se preocupava com algumas partes do meu corpo. O foco dela estava em áreas que me machucariam. Rosto, barriga e tórax. Isso acarretou numa sequência de golpes centralizados, nisso pude encontrar o que precisava.

Sempre que ela chutava, a lateral do corpo dela ficava exposta e defesa dela era prejudicada enquanto estava com a perna no ar. Apenas esperei, atenta ao momento que precisava, o qual não demorou tanto. Ela tentou acertar mais um chute, segurei a perna dela colada ao meu corpo com o braço esquerdo e acertei um soco de direita próximo ao quadril.

— Ah! — Ela cai quando solto a perna.

— Que golpe lindo! Esse é o segundo ponto da líder temporária das Hell's. — Gonzales aplaudi.

— Vingança pelo quê? 

Nem a distância nos separa (Continuação)Onde histórias criam vida. Descubra agora