O que eu vou fazer?

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Olhei para baixo, pra cima e só poderia ser ela. Eu gosto dessa cor de pele que parece que a pessoa botou Monange antes de sair de casa, só que com um cheiro mais gostoso, claro. Não sei que mania é essa do povo de que quanto mais bronzeada, mais bonita. Nem sempre é assim. Eu nem consigo imaginá-la com a pele dourada. Talvez ela só fique vermelha, como eu.

Oh, ela virou seu rosto rapidamente enquanto eu prestava atenção no atendente que entregava as sacolas a ela e bom, ainda nem percebeu que eu estou aqui.

"Alguém acordou com vontade de comer sonho hoje..." Fiz esse comentário perto dela, rindo, quando ela se virou pra mim com uma cara séria e logo deu um sorriso.

"Oi, Camila! Não sabia que vinhas aqui" Ela me cumprimentou com um beijo no rosto. Se a minha mãe estivesse aqui, já teria dito que a cantada do sonho, ainda que modificada, foi um sucesso e que o 'não sabia que vinhas aqui' é o novo 'vem sempre aqui, gata?'. Muito inocente.

"O pior é que eu não venho mesmo, mas como a padaria que eu vou tava fechada, vim nessa" eu sorri enquanto a via ajeitando as sacolas em suas muletas..

"Então, se você me permite..." Ela se aproximou de mim por trás, ainda andando com certa dificuldade, olhando para o vidro que nos separava dos produtos da padaria. "Aquele croissant de queijo e presunto é muito bom, mas só não é melhor que aqueles pequenininhos de chocolate. Os pães de queijo daqui são muito bons também, tem muito queijo e pouco ar. E ali tem uns biscoitos de cereais que são deliciosos e..." ela suspirou "...o sonho é maravilhoso! Mas tem que ser o de doce de leite" ela disse mordendo o lábio inferior.

"Ah, obrigada... Eu vou levar em conta seu gosto para escolher quitutes matutinos, hein?" eu disse rindo.

"Você não vai se arrepender, prometo!" ela terminou de pagar pelo o que havia comprado e se despediu de mim com um aceno e um sorriso.

Foi diferente vê-la aqui, com cara de sono, jeans confortáveis, camiseta mais casual, o cabelo sem arrumar... O contrário daquela que escuta meus problemas toda terça-feira ao atardecer. Quando eu entro na sala dela, está sempre arrumadinha, com camisa de botão, as vezes de cabelos amarrados e as vezes de cabelo solto, de qualquer forma os fios estão sempre bem comportados e vestindo jeans mais apertados. A aparência mais séria, como de costume, também havia sido deixado de lado. Mas o que me deixou tensa foi o lance do sonho. Estou dando graças a Deus que a minha mãe não esteja aqui do meu lado porque sei lá o que poderia ter acontecido, né?

Fico me perguntando agora se minha mãe acha que por a Hailee ter subido ao reino dos céus a minha vontade de namorar garotas acabou. Porque é claro, né mãe, que quando o pote de Nutella acaba a gente não quer nem saber comprar outro...? Cof cof. Espero que ela saiba que minha vontade de mulher é como a musiquinha do comercial do Vigor Grego (aquele iogurte lá) "quando acaba a gente quer de novo". Aí se ela estivesse aqui, daria um jeito de me fazer pedir sonho, aí eu encontraria a Lauren literalmente na fila do pão, ia cumprimentá-la, ela iria pedir sonho, eu também... minha mãe acharia aquela movimentação estranha, aquele clima esquisito de deja vu versão gay, onde a gente consegue ouvir Madonna cantando Holiday ao fundo e o arco-íris aparece atrás da padaria. O próximo passo no mínimo é eu ter de me tornar uma refugiada e voar daqui pra Cuba.

Bom, eu segui a sugestão da Lauren e comprei um pouco de tudo o que ela indicou, menos a parte do sonho, porque senão minha mãe ligaria 2+2. O melhor é que tudo estava mesmo muito bom. Cada coisa que ela me sugeriu estava deliciosa. Um ponto positivo, não? Parece que a pessoa fica mais confiável... tudo por causa de um pão de queijo e um croissant. O ser humano é mesmo bem estranho.

No começo da tarde Dinah me ligou convidando para ir na casa dela ver um filme, já que o namorado teve que viajar para a casa de uns tios e Ally e Troy foram comemorar os 21 meses de namoro num hotel fazenda próximo à cidade.

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