𝙰𝚕𝚕 𝚖𝚢 𝚂𝚘𝚗𝚗𝚢 𝚍𝚊𝚢𝚜 | 𝓢𝓸𝓷 𝓗𝓮𝓾𝓷𝓰-𝓶𝓲𝓷

Bola na área

Desde a sua infância, e assim que foi apresentada às músicas, filmes e séries americanas, Karinne alimentava o desejo incessante de viver o sonho americano. Sendo assim, começou a trabalhar muito cedo, como jovem aprendiz, e passou a economizar o pouco dinheiro que ganhava como estagiária para custear um intercâmbio no país.

Enquanto as garotas da sua idade compravam roupas de marca, e tinham celulares de última geração, ela se virava com as roupas que tinha, compradas em brechós e lojas de departamento, e com o celular que ganhou dos pais anos atrás, que já estava começando a travar, mas que ainda funcionava.

Com o passar do tempo, seu primo por parte de pai, que para ela nunca passou de um garoto insuportável com síndrome de engraçadinho, e com quem brincava de jogar futebol nas férias de julho, começou a chamar atenção de treinadores e a se profissionalizar na área, o que tornou a vida dela e a dos demais primos dele, um verdadeiro inferno.

Por mais que trabalhasse desde cedo e se dedicasse nos estudos, se virando para aprender inglês sozinha e para entrar em uma boa faculdade, Richarlison sempre era o tema das reuniões de família. Os pais dela não economizavam elogios a ele, fazendo questão de salientar o quanto era talentoso e dedicado, bem como no orgulho que dava para a família toda.

Embora Karinne tentasse muito odiá-lo pela cobrança constante que sofria por causa dele, não conseguia, pois, por mais que o tempo passasse, Richarlison continuava a ser o mesmo garoto humilde e generoso que conhecia. Sempre foi muito dedicado à família e nunca se esqueceu de nenhum deles.

Como era esperado, assim que conseguiu o seu primeiro contrato com um time estrangeiro, passou a mandar dinheiro frequentemente e a lutar para que tivessem uma vida melhor.

Mesmo ela, que era apenas prima dele, não escapava de sua generosidade, pois o jogador fez questões de pagar as mensalidades de um curso particular de inglês para ela, depois de muita insistência, e dela ter negado ajuda financeira diversas vezes, por puro orgulho.

Mas fora isso, Karinne não deixou que fizesse mais nada por ela. Sozinha, continuou a juntar dinheiro para fazer intercâmbio. Contudo, como não ganhava muito e também tinha que ajudar com as despesas da casa onde morava com os pais, o tempo foi passando, e, em um instante, 10 anos de suas vidas passaram.

Agora, tanto Karinne quanto Richarlison tinham se tornado adultos. O primo, dois anos mais novo que ela, era jogador titular do Tottenham Hotspur e da Seleção Brasileira, enquanto a jovem era vendedora de loja e já não se sentia tão confiante em realizar o seu sonho de fazer intercâmbio, tendo tantas outras maneiras melhores de usufruir daquele dinheiro suado. Com aquela quantia, poderia até mesmo comprar um carro, mesmo que usado.

Ainda mais, se sentia culpada em gastar aquele dinheiro com viagem, enquanto seus familiares, parentes e amigos próximos se matavam para viver decentemente, ou, na verdade, sobreviver. No entanto, como acompanharam de perto o esforço dela para economizar aquele dinheiro, todos eles, e principalmente seus pais, a convenceram a seguir o seu sonho. Mas quando desafortunadamente o seu visto americano foi negado, Karinne sentiu que aquele era um sinal do Universo para que desistisse de vez.

Já estava decidida em usar aquele dinheiro para comprar um carro de segunda mão, quando recebeu uma ligação de um número desconhecido.

- Alô. Prima? Sou eu, Richarlison. Tudo bem? Como eu te conheço, já sei que vai ficar brava, então antes que desligue na minha cara, eu vou falar de uma vez. Ka, eu sei que você é foda e sempre se virou muito bem sozinha, sem nunca precisar da minha ajuda, mas eu não posso deixar que desista do seu sonho. Não seja tão orgulhosa, prima. E me deixe te dar um help, só dessa vez. Eu sei que seu sonho é ir para os States, mas que tal você vir para a Inglaterra? Você vai amar Londres! Vai poder conhecer os locais onde foram gravados os filmes do Harry Potter. Lembra quando assistíamos juntos? E eu faço questão de que fique no meu apartamento. Eu mal paro lá, pois sempre estou no treino ou viajando para algum campeonato, então prometo que a gente nem vai se trombar. Você aceita? Diz que sim, prima. Vai... – Richarlison falou ininterruptamente, sem a dar chance para que o interrompesse.

Assim que ele parou de falar, Karinne ficou em silêncio por alguns segundos, pensando em como negaria aquela oferta tão gentil e tentadora que o primo tinha feito. Contudo, logo sua mente foi tomada pela empolgação, e num instante se imaginou andando nos tradicionais ônibus vermelhos de dois andares e visitando os estúdios de Harry Potter.

Como não tinha pensado nisso antes?! É lógico, a Inglaterra também era incrível e cheia de lugares que queria conhecer.

Depois daquela constatação, rapidamente se encheu de esperança, como há muito tempo não fazia, e resolveu que ia se dar uma chance de viver os seus sonhos outra vez.

- Tudo bem, eu aceito – respondeu, confiante. Mas sou eu quem vou pagar todas as despesas da viagem e não tem mais discussão! – completou orgulhosa, fazendo Richarlison rir com a sua personalidade forte, que nunca mudava.

- Sim, senhora – ele afirmou sarcasticamente, sem conseguir conter o riso. Então acho que já pode ir arrumando as malas, prima. Vou ficar aguardando notícias suas – disse satisfeito, desligando o telefone em seguida.

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