ama?

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Sozinha no escritório, Charlotte aproveitou que naquela manhã só estavam ela e Maria na casa, já que Engfa tinha saído para trabalhar bem cedo e, os filhos do casal ainda estavam na escola, para começar a pôr em prática o que Roberta havia lhe sugerido na consulta de dois dias atrás.

A economista abriu o bonito caderno que a esposa havia lhe comprado ontem, o qual possuía capa de couro e estampava o desenho em dourado de uma caneta em forma de pena, para expor ali todas suas lembranças adquiridas desde que acordou desmemoriada. Antes, porém, de começar a descrever os fatos ocorridos, Charlotte fechou os olhos por segundos, respirou fundo e assim mergulhou mentalmente em uma volta no tempo de quatro meses, parando bem no exato dia em que se lembrava ser o começo de toda aquela 'jornada' de amnésia, o momento em que acordava, via a esposa e nãoacordava, via a esposa e não sabia quem era ela.

Ao abrir olhos poucos instantes depois, a mulher começou a escrever com sua caligrafia bonita uma pequena introdução antes de se atirar na narrativa daquele despertar há quatro meses. A mão trabalhava ágil e rápida em detalhar cada pequena lembrança que lhe vinha em enxurrada à cabeça.

A cada parágrafo escrito, Charlotte revivia mentalmente tudo o que ia sendo registrado naquelas folhas do caderno.

A economista mergulhou fundo em sua mente para buscar relatar com maior riqueza de detalhes tudo que se lembrava daquele fatídico dia. Depois vieram os dias subsequentes e toda a sua dificuldade em lidar com o que lhe aconteceu. De tão imersa em traduzir com fidelidade o que sentia, que houveram momento sem que a mulher chegou a se desligar por completo do mundo ao seu redor, perdendo assim a noção do tempo e do espaço enquanto escrevia.

Por um tempo que não soube bem precisar quanto, Charlotte já havia repassado para o diário várias coisas, situações, momentos, sentimentos, fatos e conflitos que se passaram dentro dela ao longo das três primeiras semanas em que a família, a casa que mora e tudo mais não passava naquele momento de meros desconhecidos para ela.

Quando a economista resolveu fazer uma pequena pausa em sua escrita, tomou um pequeno susto, pois ao folhear o caderno viu que tinha escrito por quase trinta folhas durante o tempo em que já estava ali, o qual não fazia ideia de quanto fosse. Achou melhor parar e continuar escrevendo amanhã, já que por hoje tinha escrito o bastante. Além do mais sua cabeça já começava a doer, decerto por conta de tanto se forçar para lembrar-se das coisas repassadas para as folhas do caderno.

Charlotte fechou o caderno e guardou-o na gaveta da escrivaninha. No exato momento em que se pôs de pé, a porta do escritório foi aberta de maneira abrupta e por ela a mulher viu passar seu filho menor que acabava de chegar da escola. Sorriu ao ver o menino que correu em sua direção e se agarrou as pernas da mãe.

- Ei, meu menino!

Charlotte carregou o filho no colo e depois abraçou e beijou o garotinho. Ser carinhosa e amorosa com os filhos parecia agora tão natural e espontâneo. O que era muito bom para os dois pequenos que se acostumaram a desde de sempre terem uma mãe extremamente carinhosa e amorosa com eles.

- Como foi na escola?

- Foi legal!... Mamãe, eu tenho uma coisa pra você.

- Pra mim?

- É, aqui.

O menino puxou do bolso lateral de sua bermuda da escola, um papel todo dobrado e o estendeu a Charlotte.

Com um olhar curioso, a mulher pegou da mão do filho o papel e pôs o garoto sentado sobre a mesa para assim, ter as duas mãos livres para abrir o que o filho lhe entregou.

- Vamos ver o que tem aqui, rapazinho!

Seu filho sorriu de um jeito tão engraçadinho que encheu o coração da economista deternura.

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