Melhores amigos

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Pedro Palhares

Tem situações na vida onde a batalha é interna, não importa quantas pessoas lá fora tentem te ajudar, se você não quer ser curado, nada disso adianta.

Parece bobo, quem em sã consciência não gostaria de dar fim as suas feridas? Entretanto, não é tão simples assim, durante muito tempo eu me viciei nessa autodepreciação, e me permitir, constantemente, em relembrar tudo de pior que estava acontecendo comigo era um sinal claro de que as coisas não estavam indo bem.

Olho para as minhas mãos suadas na escuridão da madrugada e me pergunto se todo esse caminho percorrido tinha sido a troco de nada.

Os remédios tinham me ajudado por um tempo e eu estava por fim conseguindo viver uma vida normalmente, cada vez menos pensando no que eu deixei para trás assim que eu embarquei naquele avião. Porém, nada bom se perpetua por tanto tempo assim.

Os pesadelos tinham voltado e junto a ele, toda a angústia dos últimos anos na Itália.

Com pés bambos levanto na cama indo lavar o meu rosto na água fria.

Dessa vez, não tinha ninguém para me acordar daquele inferno, então eu não fazia ideia de quanto tempo eu tinha ficado me debatendo na cama.

Meus olhos passam pelo espelho do banheiro e eu paro ali encarando o meu próprio reflexo.

Minha pele estava pálida e brilhando pelo suor acumulado. Eu aparentava estar doente.

E talvez eu estivesse.

Dessa vez, eu não tinha esquecido os remédios em algum lugar ou qualquer outra merda, eu estava tomando todos regularmente.
Isso era o que mais me assustava.

Com lábio trêmulos desejo no fundo dos meus ossos o meu melhor amigo de infância, que quando os meus pesadelo eram só tolos e infantis, eram os seus braços que me apertavam e me diziam que tudo ficaria bem.

Estar com João me distraia, mesmo que fosse só entre seus beijos e farpas. Por breves momentos eu me esquecia como as coisas eram complicadas por fora e me concentrava apenas naquela bolha que construímos, onde tudo girava em torno das nossas implicâncias ou em como era intrigante a nossa convivência.

Decido tirar isso da cabeça, tomo mais dois comprimido do meu remédio e deito novamente na cama totalmente encolhido.

Eu sabia que eu não iria conseguir dormir mais, porém, precisava tirar qualquer ideia estúpida da minha cabeça antes que meus pés ganhassem forças para cometer burrices.

Fecho os olhos contando até dez, tentando de alguma forma me despistar, mas hipocritamente o silêncio parecia gritar em meus ouvidos o quão fodido da cabeça eu estava.

Novamente as cenas, tão conhecidas do mesmo pesadelo que se repetia constantemente, me invadem me mostrando que eu não iria sair ileso dessa noite.

Sei que todas as minhas jaulas são mentais, sou eu mesmo que me prendo, que me limito, tudo se trata de autossabotagem, é meu subconsciente que me impede de seguir em frente, talvez inseguro ou culpado demais para me permitir continuar.

Me sinto sempre tão à frente na curva, que a curva se tornou uma esfera. É um ciclo vicioso onde tudo se repete, sempre acabo no mesmo lugar, essa angústia e ansiedade me impedem.

A culpa me impede.

Nunca irei superar nada disso, nenhum remédio funcionará por tempo o bastante quando no fundo dos meus ossos eu ainda sei que sou o único culpado pelos maiores demônios da minha vida.

E de certa forma, eu mereço todo esse tormento que me acontece.

Meus pensamentos se voltam novamente para João, acima de tudo, volto a pensar na nossa infância.

Meu Nêmesis - 𝐩𝐞𝐣𝐚̃𝐨.Onde histórias criam vida. Descubra agora