6-Agatha

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  Alguma coisa estava definitivamente errada. Eu sei que a Megan pode ser meio sentimental e grosseira às vezes, mas isso? É demais até pra ela no pico da insanidade.

   Aquilo sobre o Estripador eu lembrava muito bem do que havia acontecido, foi a mais ou menos um ano na primeira vez que brigamos. Ela tinha escondido meu livro de rituais e como vingança eu escondi o coelho dela (grande erro). Megan simplesmente entrou em desespero completo quando não achou o Estripador na sua cama.

  No começo eu pensei que ela estava sendo dramática e fingindo, o que é esperado vindo dela, mas era verdade. Depois de me desculpar algumas vezes, Megan me contou a história por trás da pelúcia.
    O coelhinho tinha sido um presente dos seus pais para ajudá-la com os pesadelos depois que teve seu primeiro contato com o paranormal ainda criança. Estripador era como um talismã pra ela e eu me senti horrível por o ter escondido. Prometi nunca mais brincar com o coelho e sigo minha promessa até hoje.

   Aqueles exoterroristas devem ter feito alguma coisa com ela e eu preciso descobrir o que foi. As brigas podiam esperar até eu ter certeza que Megan era ela mesma, ainda que o que ela disse tivesse realmente machucado.” Agora não é hora Agatha”.

  Demorei um tempo para sair do quarto tentando me decidir se essa era a melhor decisão antes de seguir em frente. Como ganhei um dia de folga não precisava ficar na sala de rituais, o Dante cuidaria disso. Meu plano era basicamente seguir a Megan durante o dia até achar algo que confirmasse minhas suspeitas.

   Não demorou nem meia hora para as coisas ficarem bizarras. Ela estava saindo da enfermaria e de todos os lugares possíveis da Ordem ela foi para a prisão,” que passatempo curioso Megan”. Estava indo atrás dela quando tive uma ideia melhor, câmeras de segurança estavam espalhadas aos montes especialmente na prisão.

  Peguei uns pãezinhos de queijo com o Tristan no caminho para a sala de computadores. Mesmo não sendo especialista, tinha visto alguns agentes acessando as câmeras antes, então não foi tão difícil.

    Cada minuto que eu olhava para Megan pelas câmeras ficava mais estranho. Ela andou de um lado para o outro sem parar por um tempo até parar em frente a uma cela específica e começar a falar. Helio Freeman, um exoterrorista de energia preso pela Ordem há algumas semanas por ter criado um site de divulgação paranormal que atraiu civis para uma armadilha.

    As câmeras não tinham áudio então não deu pra saber o que exatamente eles conversaram, mas durou menos de um minuto. Estranho.
   E agora o que eu faria? Será que já tinha provas suficientes para mostrar pro Veríssimo? Eu deveria falar? E se fizessem alguma coisa ruim com ela?

    Esses questionamentos me dominaram, eu amava Megan e não queria que fizessem mal a ela, mas ao mesmo tempo se eu não impedisse seja lá o que ela está fazendo estaria traindo a Ordem. Além de que se minha hipótese de que os sequestradores haviam feito algo com ela estivesse correta os riscos de deixar ela assim seriam bem maiores.

   Olhei de novo nas câmeras ainda tentando me decidir e fui surpreendida, ela tinha saído da prisão e estava vindo pra cá. Essa era a oportunidade perfeita pra ver ela de perto e tirar minhas dúvidas. Corri para me esconder embaixo da mesa dos computadores de forma que conseguiria ter uma boa visão.

    Megan chegou logo depois que eu achei o ângulo perfeito atrás de uma das cadeiras. Sem nem exitar ela andou para um dos computadores e pude ver um vislumbre dourado brilhante em seus olhos, agora totalmente pretos, enquanto ela passava. Mais uma coisa suspeita pra minha lista.

   Durante quase meia hora aquela garota não fez outra coisa a não ser digitar sem parar. Com muito esforço li algumas das pesquisas que iam desde “ de onde vem o pistachio” pra “mapa elétrico da ordem”. O mais absoluto caos, era como se ela estivesse rodando uma roleta de palavras e juntando tudo em uma pergunta.

    Estava tentando me esgueirar pelas cadeiras “BAAAAMMM” eu esbarrei forte demais em uma delas fazendo o barulho ecoar pela sala. Nem um milímetro sequer Megan se moveu. Decidi então testar uma teoria, bati palmas, chamei seu nome, gritei em seu ouvido e puxei seus longos cabelos. Nada aconteceu.

   Todos os sinais apontavam para algo extremamente errado agora. Respirei fundo tentando me decidir sobre qual era a decisão mais sensata. Saí correndo da sala em busca de ajuda, mais especificamente o Sr.Veríssimo.

   Disparei pelos corredores da Ordem quase derrubando alguns agentes no caminho até encontrar Veríssimo em sua sala como sempre.
      -Veríssimoeuachoquetemalgodeer
radocomamegan!- disse praticamente gritando e tão rápido quanto as batidas do meu coração que ameaçava sair pela boca. 

Ele se assustou com minha repentina e barulhenta presença tirando os olhos das pilhas de papéis em cima de sua mesa e olhando diretamente para mim.
     -Agatha respira e fala com calma.
     -Eu acho que a tem algo de errado com a Megan e preciso que venha comigo.- Minha voz saiu ofegante mas ele entendeu o recado e se levantou de sua cadeira deixando os papéis e documentos de lado.

  Saímos da sala e eu o guiei apressada por todo o caminho de volta. Com Veríssimo sendo praticamente puxado por mim, chegamos na sala, mas parei do lado de fora.

     -Ela tá lá dentro, eu gritei seu nome, bati palmas e tentei sacudi-la mas nada aconteceu- expliquei.
     -Vou dar uma olhada- Ele empurrou a porta já entreaberta e entrou- Megan? Tá tudo bem aí.
     -Sim, por que não estaria?- Ela respondeu secamente.

Pera aí um minuto, ela respondeu.

     -Eu só vim ter certeza, não te vi desde ontem na enfermaria- continuou Veríssimo.
     -Nem tenta Veríssimo eu sei exatamente o que está acontecendo, Agatha sai daí de trás e resolva isso como um ser humano decente- Sua voz estava carregada de raiva mais uma vez.
   “ Como diabos ela me viu?” Entrei lentamente na sala e a vi agora de pé vindo em minha direção. Acho que com tanta confusão ainda não tinha parado pra reparar o quanto ela estava linda com aqueles olhos pretos, eles eram misteriosos e ao mesmo tempo tão fofos.

     -Eu pensei que tinha algo de errado com você- disse tentando não embolar as palavras- sei lá você tava toda estranha e não se movia.
     -Talvez eu só estivesse ignorado uma grande idiota na minha frente na esperança de que ela fosse embora- sua voz ia ficando cada vez mais alta.
 
    A distância entre nós se extinguiu rápido até de mais quando Megan me puxou pela gola do capuz de meu colete.

Não pude conter as borboletas que me invadiram, estávamos tão perto, podia até sentir o seu olhar diretamente em mim.

     -Mas parece que não foi suficiente- Raiva consumia sua voz como hoje de manhã “Ela é tão bonita brava” não pude deixar de reparar -Já não bastou mais cedo então entenda o recado de uma vez por todas, EU TE ODEIO VOLKOMEN!

  Ela gritou tão alto que senti meu corpo tremer. Ficamos nos encarando por uns segundos sem dizer nada até ela soltar meu capuz e se afastar.

  Nem eu nem o Veríssimo impedimos quando ela se virou e saiu sei lá pra onde. Esperei sentir raiva, mas foi bem pior. Era como se uma parte de mim tivesse morrido ali mesmo.
Já tinha ouvido falar de coração partido antes só não esperava que fosse literalmente doer. Por que eu tinha que tê-la amado tanto assim?

     -Agatha eu temia que algo assim pudesse acontecer- Veríssimo disse, acho que tentando me confortar- olha o medo é uma coisa poderosa e pode mudar às pessoas e a gente não sabe o que aconteceu
     -Não - interrompi- tem algo mais acontecendo eu sei que tem, os olhos, os olhos dela estavam com uma coisa tipo um brilho- Minha voz falhava e lágrimas voltavam a ameaçar cair.

  Senti suas mãos pesadas em meus ombros.

    -Agatha você tem que parar, eu sei que se importa mas isso tá saindo do controle- A voz de Veríssimo era firme mas não tinha raiva ou repreensão, era quase carinhosa- Eu vou falar com ela assim que se acalmar então por hora tentem não se encontrar.

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