18- Agatha

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   Passei algumas horas ensaiando o que falar, cada palavra e pergunta que faria para não estragar tudo. Esperei até o almoço quando pensei que Megan estaria livre ou pelo menos tiraria um tempo, não poderia estar mais errada.

Chega até a ser fofo a maneira como ela fica toda focada e animadinha falando dos casos e como se perde entre as teorias quando começa a falar rápido demais, suas mãos ficam mexendo como se estivesse dançando jazz, acho que nunca vi alguém tão feliz lendo arquivos. 

 Só que hoje queria que ela estivesse um pouco menos animada nisso para que pudéssemos falar. Quando ela começou a contar as teorias sabia que seria um caminho sem volta, e agora estou correndo em direção a uma sala que nunca ouvi falar na minha vida. 

Megan vai mais devagar, acabamos de comer.

  Foi como gritar com um cachorro para ele correr mais devagar, inútil, continuamos por entre os labirintos do corredor até parar em uma porta trancada. Se me pedissem para mostrar o banheiro eu não teria ideia de para onde ir, nunca havia ido nesse lugar.

      -Megan onde a gente tá?- falei segurando a sua mão com mais força para garantir sua atenção.
     -Tá preparada pra ver um lugar incrível?- Ela tirou um cartão do bolso do macacão e me entregou- faça as honras. 

  Peguei o cartão e encostei na tranca eletrônica da porta à nossa frente, uma luz verde acendeu e depois de alguns cliques a porta se abriu revelando uma sala que, como Megan avisou, era incrível. Fileiras e mais fileiras de arquivos se estendiam para todos os lados, ao mesmo tempo um frio saindo de dentro me causando arrepios. 

      -Wow, isso é. 
      -Incrível né?- Megan interrompeu- é a prova de som, climatizada e só três agentes de toda Ordem tem acesso, a maioria só usa para ter encontros e esse tipo de coisa. 
      -Então é aqui que você traz as garotas?- disse entrando.

 Seu rosto ficou imediatamente vermelho com minha pergunta e a curiosidade me invadiu. Nunca tivemos problemas em falar sobre esse tipo de coisa, algo mudou. Ela se virou diretamente pra mim mais vermelha que um semáforo.

      -Na verdade, você foi a primeira- Seus olhos se desviaram para o chão- a minha primeira vez em quase tudo. 

 Isso não podia ser verdade, podia? Megan era uma pessoa incrível e não lhe faltavam pretendentes, como eu tinha sido a primeira vez dela em alguma coisa? E como ela podia tratar isso com tanta indiferença? 

  Essa era minha deixa para falar, era agora ou nunca. 

   Como era de se esperar, Megan estava esquivando por entre as prateleiras, se escondendo e evitando a conversa. Não ia desistir tão fácil, não hoje. Comecei a segui-la, mas mantendo certa distância.

       -Sabe Megan, você também foi diferente para mim, foi especial, foi marcante e foi inesquecível- minha voz saía confiante e um pouco raivosa, estava cansada de guardar tudo dentro de mim.

      -Me entreguei a você de uma maneira que nunca tinha feito antes, me entreguei completamente e não ligo se pra você Megan foi só uma noite de diversão, porque pra mim foi tudo. Eu me senti como nunca havia me sentido antes, se não quiser levar isso adiante só me fala e resolvemos como adultas. 

  A cada palavra eu me aproximava mais de Megan que continuava olhando arquivo atrás de arquivo como se eu nem estivesse lá. Eu tinha me aberto, mostrando meu lado mais vulnerável e ela nem olhou pra mim.

Um aperto no coração me atingiu em cheio, de todas as possibilidades que cogitei essa foi a pior delas, apatia completa.

      -Pelo menos fala alguma coisa porra!!- gritei sem conseguir conter a raiva.
      -Agatha eu…eu- sua voz tremia- Você despertou as coisas mais bonitas que existiam em mim, que eu nem sabia que tinha. Você me fez saber o que realmente é o amor, a simplicidade, o respeito. Você é a única pessoa que sabe decifrar o meu olhar. E só você consegue fazer isso, tudo isso.

  Palavras me fugiram e deram lugar às lágrimas, lágrimas de alegria, alívio, emoção e tudo mais. 

      -Agápi é você quem eu quero que esteja ao meu lado, mais ninguém, é você quem eu quero para a vida toda.

   Sua mão segurou a minha em um aperto quente e delicado. Os sentimentos entraram em guerra dentro de mim, fui do medo a raiva e agora amor, tudo isso pela mesma pessoa em menos de uma hora. Megan tinha uma influência sobre mim que era capaz de me fazer esquecer até meu nome se me deixasse levar por suas feições. Nada mais importava agora, foi como tirar o peso do mundo das minhas costas, e quando achava que havia acabado, Megan vai lá e revira tudo de uma vez. 

   Foi tudo meio rápido, ela estava segurando a minha mão quando me puxou para um abraço. 

      -Agatha, quer namorar comigo?- sua voz saiu como um sussurro tão perto fazendo arrepiar por inteiro.
      -É claro que quero, pensei que nunca iria pedir.

   A felicidade transbordava por todo o meu corpo, a pessoa que eu amava e considerava impossível me amar de volta tinha acabado de me pedir em namoro. Sou a pessoa mais feliz do mundo. 

   Como se ouvisse meus pensamentos, Megan selou nossos lábios, de alguma forma esse beijo conseguiu ser ainda melhor que todos os anteriores. Agora sabia que não era apenas um caso ou uma simples experiência, estava beijando minha namorada, Megan Morgause era minha namorada. 

  Sua mão acariciava meu rosto enquanto a outra se enroscava em meus cabelos, já as minhas se mantinham firmes em sua cintura nos mantendo perto. Em algum momento chocamos contra uma parede, fiquei tão hipnotizada por tudo que nem percebi nossa movimentação, por sorte Megan parecia tão hipnotizada quanto eu e nem se deu o trabalho de interromper o beijo.

   No começo ficava meio insegura com relação às minhas presas e temia que pudesse acabar machucando alguém, por sorte Megan parecia não se importar e dizia ser um detalhe especial. Ficamos assim até que o ar fizesse falta pela terceira ou quarta vez.

      -Não me entenda mal Agapi, mas eu ainda tenho um caso pra resolver.
      -Nem começamos e você já vai me trocar por um fugitivo, vou levar pro coração- disse deitando a cabeça em seu ombro. 
      -Você me troca por crânios e potes de sangue, além disso vou precisar de ajuda para levar os arquivos para a outra sala. 

   Essa é minha namorada, uma obcecada por casos, MINHA obcecada por casos. ( é tão legal poder falar isso agora) Como boa namorada que sou aceitei ajudar. 

      -Por onde começamos então
Temos alguma pista?
     -Não, vai ser a moda antiga. 

   Com “ a moda antiga” Megan quis dizer procurar em cada uma das prateleiras de todas as letras de A a Z. Fui lendo um por um dos arquivos, as únicas informações que tínhamos eram uma foto do cara. Nunca desejei tanto que alguém fosse esquisito, infelizmente o cara era padrão, ruivo, branco, olhos castanhos, sem cricatriz ou tatuagem. Lemos horas e mais horas de arquivos intermináveis procurando por alguma semelhança, estava sentada recostada na parede lendo mais uma caixa de arquivos, exoterrorista….blablabla..ataque em massa…bibibi ...2022….lala...homem ruivo…. Ricardo Filomeno. Pera aí, homem ruivo.

       -Achei!- falamos ao mesmo tempo. 
      -Ricardo Filomeno-gritei.
      -Firmino Garcia- Megan gritou se aproximando. 

  Alguma coisa estava errada, olhei de novo para as fotos e eles eram exatamente iguais, tinha que ser a mesma pessoa. Megan veio correndo com um arquivo em mãos parecendo igualmente confusa.

      -Eu fui a responsável por prender o Ricardo, não pode ser ele.
      -Bem, eles são idênticos, olha aqui.

 Afastei as pilhas de arquivo ao meu redor dando espaço para Megan sentar ao meu lado. Agora com as fichas lado a lado, as semelhanças eram inegáveis, entre a foto dos três homens, com diferenças mínimas entre os cortes de cabelo e barba. 

      -Gêmeos?- chutei.

    Sem resposta, ela olhava fixamente para os papéis à nossa frente como se estivesse vendo algo que não estava ali. 

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