21- Megan

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  Em todos os anos em que estive com Agatha nunca tinha visto ela se abrir assim mais que duas vezes. Quando acontecia sempre dava o meu melhor pra fazê-la desabafar ao máximo, só que dessa vez falhei. Não era minha intenção interromper a conversa para investigar e me segurei ao máximo para conter a epifania. 

   Falhei miseravelmente em esconder, mas não vou deixar essa conversa sobre a Liz morrer aqui desse modo. Agatha tem um talento para escapar de assuntos polêmicos, para seu azar não ia desistir tão fácil assim.

    Agora de frente para o quadro de evidências, que eu orgulhosamente montei, com um marcador na mão tentava organizar o turbilhão de pensamentos. 

      -Você falou sobre ligar os pontos, e se fizéssemos isso com os casos.

 A expressão de total confusão de Agatha foi tão fofa que quase me perdi. Joguei alguns papéis para o alto até a última peça do quebra-cabeça  se encaixar. Um mapa.

      -Olha só vem comigo tá- disse abrindo um mapa da cidade sobre o quadro- preciso que leia pra mim em ordem, do primeiro ao último, todos os ataques ocorridos. 

   Ainda parecendo confusa Agatha pegou a última lista feita pelo C.R.I.S, havíamos descoberto oito casos no total envolvendo o mesmo sujeito. Passei horas tentando achar qualquer migalha em comum entre os casos, o que não levou a nada. Mas e se eu literalmente ligasse os pontos das coordenadas no mapa. Uma jogada desesperada? Sem dúvidas, porém ainda sim uma jogada.

    Agatha foi citando cada um dos locais em ordem enquanto eu tentava fazer alguma ligação entre os pontos. Depois de muito quebrar a cabeça formei uma interrogação  em cima de uma letra V. Parecia tão familiar, só precisava lembrar onde tinha visto algo parecido antes. 

      -Agápi, isso te lembra algo?
      -Pra falar a verdade lembra um pouco o símbolo de energia. 

   Era isso, o ponto em comum entre todos os ataques era o elemento, energia, sempre em cada um deles. Agora o mapa provava a ligação entre os casos e também tornava possível prever o próximo ataque. 

      -Agatha, se você tivesse que completar esse símbolo, como faria?- questionei lhe passando o marcador.
      -Seguindo corretamente os processos, teria que ter um ponto aqui, talvez aqui e mais um aqui.

 Ela marcou mais pontos no mapa terminando de formar o símbolo. 

      -Se seguirmos a ordem o último ataque foi na ponta direita, logo o próximo deveria ser no meio, exatamente na fabri… escola? 

  Seguindo a cronologia o próximo local deveria ser a fábrica, porém pelo mapa caia na escola. E assim morre uma teoria. Mas ainda não fazia sentido, o símbolo era perfeito. 

  Quase como se lesse meus pensamentos Agatha se adiantou na frente do quadro encarando o ponto do meio. 

      -No símbolo original os pontos não se colidem exatamente no meio, mas ficam bem próximos a ponto de parecerem o mesmo.

    Passei o marcador a Agatha completamente intrigada. Esse caso não parava de se desdobrar e sentia que ainda não era o fim. Todos os meus instintos de investigadora borbulhavam só de olhar para aquele quadro de evidências, parecia que a cada nova descoberta mais dúvidas surgiam. 

  Me distraí e quando voltei a consciência Agatha tinha circulado uma parte do mapa e me encarava esperando por algo. 

      -Você não me ouviu né?
     -Foi mal aí Agápi- respondi redirecionando meu foco.
     -Eu estava dizendo que para o símbolo ser desenhado de forma correta precisamos de mais um ponto nesse raio aqui- disse apontando para a área circulada logo abaixo do ponto que simbolizava a escola atacada. 

  Sem cerimônia, abri o mapa digital em um dos computadores e comecei a aproximar a imagem até ver com clareza a área. Conjuntos residenciais, praças, parques, uma loja de roupas e um cemitério. Uma vizinhança comum, mas me parecia extremamente familiar então decidi usar o street view, não fiquei surpresa ao reconhecer aquele lugar. 

      -É o cemitério- disse ainda processando a informação- Aquele maldito cemitério.
       -Meg do que você tá falando? Você foi nesse lugar?
       -Não só foi como também estava lá na noite do ataque, aqueles merdinhas escaparam.

 O olhar confuso e raivoso de Agatha foi suficiente para me fazer entender que devia explicações, muitas explicações. 

      -Antes da invasão da Ordem e o sequestro eu tinha ido em uma missão nesse cemitério, corpos estavam saindo de suas covas e suspeitávamos do envolvimento de uma seita. Chegando lá fomos surpreendidos por uma horda de zumbis de sangue. Por pouco saímos vivos- Minha voz falhou com as lembranças da noite, ainda tinha a cicatriz da mordida de um deles. 

      -Todos escaparam sem deixar rastros, investiguei por quase um mês sem sucesso. Acho que podemos ligar os casos agora. 

  Me levantei movida pela adrenalina da nova descoberta e voltei para o quadro. Com o marcador em mãos marquei o ponto referente ao cemitério. Exatamente alinhado. Olhei para Agatha em busca de confirmação e ela apenas concordou com a cabeça. 

   Isso muda tudo.

Cada um desses ataques documentados nos últimos 5 anos eram apenas pequenas peças de um plano maior. Podia até ouvir a trilha sonora tocando ao fundo enquanto nos duas olhavamos incrédulas para o último ponto marcado no mapa. Meu cérebro estava a mil tentando revisar cada detalhe a procura de uma falha, mas não tinha nenhuma, tudo tinha se encaixado agora. Todas essas dúvidas no fundo eram apenas uma esperança de tudo ser tudo mentira porque a verdade significava enfrentar um inimigo bem mais forte e preparado que qualquer um que ja lidei antes. 

      -Falta uma parte do símbolo- Agatha disse derrepente- ainda tem mais dois riscos nas laterais.

Ela correu os dedos pelo mapa demonstrando onde esses riscos deveriam estar. Tinha uma memória vaga do símbolo em questão, mas sabia que estava certa.

      -O próximo risco indica o local do próximo ataque- disse a informação que me afligia. Eles estavam brincando conosco, tudo isso não passava de uma caça ao tesouro.
      -Rápido, qual seria o próximo passo pra desenhar o símbolo,Agatha?
      -O último ataque foi na fábrica abandonada, então agora a linha seguiria para o meio- Com o dedo ela traçou a rota parando exatamente no ponto da escola- Aqui. 

      -Tem certeza? Eles já atacaram aí antes e não seria meio…
      -No símbolo original tem que se passar exatamente pelo mesmo ponto nessa parte, se ele tem sido tão preciso não acho que ignoraria isso- Agatha interrompeu.

   Então era isso. Havíamos chegado a uma solução que, por mais terrível que pudesse ser, nada se contradizia nem deixava pontas soltas. Era tudo milimetricamente perfeito e calculado, passou despercebido por todos durante anos. Porque então tinha sido descoberto por duas agentes inexperientes tão fácil? 

  Essa era minha única dúvida, talvez seja só minha mente pregando peças e tentando desvalorizar nossa conquista, mas ainda sim nada eliminava o fato de que tinha sido estranhamente fácil. Era quase como se eles quisessem isso. 

      -Precisamos falar com o Veríssimo, agora- falei- se dermos sorte ainda teremos tempo para impedir o próximo ataque. 

  Acho que deveria estar visível o quão nervosa estava até que Agatha segurou a minha mão, que tremia incontrolavelmente. 

      -Já temos provas o suficiente acho que se… como a gente vai levar isso- Apontei para todos os papéis espalhados e quadros montados por toda a sala. 
      -É mais fácil trazer ele aqui.

 Não esperei por uma ordem e já sai correndo em direção a sala de Veríssimo.

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