Lágrimas

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Dexter
Meu pai estava morto.
Entrei na sala do hospital e seu corpo encontrava-se sob panos brancos.
Tinha uma marca profunda no pescoço devido ao enforcamento.
Eu só pensava no porque de tudo aquilo.
- Senhor Dexter, esses são os pertences do seu pai. Sinto muito. - O policial entrega-me um pequeno embrulho e sai da sala.
Sentei-me na cadeira ao lado do corpo e pus o pacote no colo.
Um par de tênis sem cadarços, dois uniformes, uma ponta de lápis e um bloquinho de papel. Senti uma folha dobrada entre as roupas, uma carta.
Comecei a ler.
"Se você está lendo essa carta é sinal que bati as botas. Desculpe o palavriar, mas não pude me conter. Quero pedir desculpas a você, Dexter. Jamais deveria ter me metido no seu relacionamento com Lara, 19anos atrás, muito menos ter lhe dado um tiro. Me culpei todos os dias por você ter ficado tetraplégico e nunca mais consegui dormir tranquilo depois disso. Eu não planejei " comprar" Helena. Me comovi com sua mãe que arrastava-se triste pela casa sem você. Eles me disseram que a bebê era órfã e que o dinheiro cobriria as despesas com a viagem dela. Não pensei duas vezes. Helena me ensinou a amar novamente. Me perdoe por não ser um pai presente, filho, mas não duvide do amor que tenho por você.
Desculpe-me também por não aguentar mais um dia naquela cela suja e por dar fim a minha vida, mas eu sei do sofrimento de quem mais amo e não suportei ve-los chorar por mim. Cuide de sua mãe, sua filha e sua esposa. Perdoem-me por todo mal que causei. Adeus, papai. "
Ah, pai. Porque? Deixei as lágrimas caírem, dobrei a carta e a guardei no bolso. Levantei-me e acariciei o rosto frio do meu pai.
Eu daria um jeito de te tirar de lá e você teria um bom comportamento para sair em menor tempo. Pai, me perdoe por ser tão rude.
Enquanto encaminhava-me a saída, mil lembranças vinham a tona. Meu pai me ensinando a andar de bicicleta, a dirigir. E eu agora sem ele. Mesmo depois do tiro, mesmo tendo ficado preso numa cama, tetraplégico, mesmo ele tendo me separado da minha namorada de forma dramática, mesmo ele tendo pago um sequestro. Ele criou a minha filha quando nós não pudemos. Meu pai não sabia que a bebê seria a minha filha e a criou como se fosse dele.
Minha mãe concordou em vender as empresas que tinhamos em Miami e voltarmos a morar no Rio de Janeiro, já que mais nada nos prendia lá.
Cremamos o corpo de meu pai e as cinzas foram jogadas no morro mais alto da praia onde meus pais se conheceram.
Descanse em paz, velho.

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