Capítulo 20

1.5K 56 7
                                    

O fim de semana passa e na segunda-feira pegamos um avião até Guipúzcoa. A atitude de Kemelly em relação a mim não mudou quase nada. Está mais distante e agressiva, mas com Gustavo ela não é assim. Fico irritada com o esforço que ela faz para que ele não preste atenção em mim. Mas o tiro sai pela culatra o tempo todo. Gustavo, em suas funções de chefe, me solicita continuamente, e isso tira Kemelly do sério. As reuniões se sucedem e, após Guipúzcoa, vamos às Astúrias.
Durante o dia, Gustavo e eu trabalhamos lado a lado como chefe e secretária, e à noite brincamos e curtimos um ao outro. Sua luxúria parece algo inato, e cada vez que estamos juntos ele me enlouquece com a forma como me faz fantasiar e com seu jeito de me tocar e de me possuir. Adora olhar para mim enquanto me masturbo com o vibrador que ele me deu de presente — capricho que eu lhe concedo com muito prazer. O prazer que me faz sentir é tanto que sinto vontade de ir de novo a uma casa de swing e experimentar o mesmo da outra vez. Quando confesso isso, Gustavo cai na gargalhada e, ao me penetrar, imagina que outro homem está me possuindo enquanto ele observa. Essa fantasia me deixa louca.
Na quarta-feira, quando chegamos a Orense, vamos direto para uma reunião. No caminho, Gustavo fala por telefone com uma tal de Letícia e se mostra irritado. O dia passa e ele termina se estressando pela falta de profissionalismo do chefe da sucursal. Não preparou nada do que era necessário, e Gustavo reage muito mal. Tento interferir para apaziguar os ânimos, mas Gustavo, meu chefe, acaba me repreendendo e me mandando calar a boca. Na viagem de volta, o humor de Gustavo está péssimo. Kemelly olha para mim com ar de superioridade e eu tenho vontade de matá-la. Quando chegamos ao hotel, Gustavo pede a Kemelly que desça do carro e nos deixe um minuto a sós. Ela obedece e, assim que fecha a porta, gu olha para mim com uma expressão que me magoa.
— Que esta tenha sido a última vez que você fala numa reunião sem que eu peça.
Entendo sua irritação. Ele está certo e, embora sua bronca tenha me magoado, quero pedir desculpas, mas ele me interrompe:
— No fim das contas a Kemelly pode ter razão. Tua presença não é necessária.
Me dá muita raiva ouvir Gustavo mencionando essa mulher e saber que ela fala de mim.
— Não estou nem aí para o que essa idiota diz sobre mim.
— Mas talvez eu, sim, esteja aí — replica.
Passa a mão na cabeça e nos olhos. Sua cara não está nada boa. O telefone dele toca. Gustavo  olha para o aparelho e interrompe a chamada. E, numa tentativa de amenizar o mal-estar entre nós, murmuro:
— Você está com uma cara péssima. Está com dor de cabeça?
Sem responder, me lança seu olhar impiedoso.
— Boa noite, Ana. Até amanhã.
Olho para ele, surpresa. Está me expulsando?
Com a dignidade que me resta, abro a porta do carro e saio. Kemelly espera a poucos metros e prefiro não olhar para ela quando passo a seu lado, senão vou acabar partindo para cima dessa mulher. Vou direto para o quarto.
Na manhã seguinte, quinta-feira, quando o despertador toca às 7h20, eu solto um palavrão. Quero dormir mais. Em meio a grunhidos, me levanto e ando até o chuveiro. Preciso da água fria no meu corpo para me acordar. Debaixo d’água, me lembro de que já é quinta-feira e isso me deixa alegre. Em breve Gustavo e eu teremos o fim de semana inteiro para ficarmos juntos. Ótimo!Quando volto para o quarto, enrolada numa toalha felpuda de cor creme que tem um cheiro maravilhoso, dou uma olhada na mesinha de cabeceira.
— Ah, vibradorzinho! Adorei nossa noite ontem.
Solto umas risadas.
Em cima de lenços de papel está o vibrador em formato de batom que usei ontem à noite para relaxar. Pego o presentinho de Gustavo. Suspiro enquanto me lembro da explosão de prazer que senti ao brincar com ele. Bem-humorada desde cedo, pego o vibrador e volto ao banheiro. Passo uma água nele e o coloco na bolsa. Agora já não esqueço mais. Eu e o vibradorzinho, juntos até a morte. Abro a mala e pego uma calcinha. Enquanto a coloco, lembro que tenho que pedir a Gustavo que me devolva a que ele roubou de mim, ou então vai ficar faltando calcinha para os próximos dias.
Minha irritação desapareceu completamente. Tenho certeza de que a dele também e de que temos um dia maravilhoso pela frente. Dou uma olhada no armário e escolho um conjunto azul com saia e uma camisa aberta. Hoje quero estar sexy para que Gustavo sinta vontade de voltar logo ao hotel.
Às oito, alguém toca a campainha do meu quarto e, segundos depois, uma camareira muito gentil deixa um lindo carrinho com o café da manhã e em seguida vai embora. Quando levanto as tampas das travessas, pulo de felicidade ao ver a quantidade de bolinhos que tenho diante de mim. Pego uma cadeira e me sento. Bebo um pouco de suco de laranja. Hummmm, que delícia! Tomo um café com um minissanduíche. Depois como um pão doce e, quando estou quase atacando uma rosquinha, me controlo e consigo vencer a tentação.
Muita comida!
O celular apita. Recebi uma mensagem. Gustavo. “8h30 na recepção.”
Que direto!
Nem um simples “Bom dia, pequena”, “Ana” ou o que for. Mas, sem tempo a perder e ansiosa para vê-lo de novo, pego minha pasta. Enfio nela o notebook e os documentos de ontem. Hoje vamos a outra sucursal das Astúrias, e só espero que o dia transcorra melhor do que ontem.
Ao chegar à recepção, vejo Gustavo apoiado numa mesa. Está incrível com seu terno cinza-claro e sua camisa branca. Noto que seu lindo cabelo ainda está um pouco molhado do banho e estremeço. Teria adorado tomar banho com ele. Duas mulheres que passam a seu lado se viram e ficam olhando. Normal. É um homem muito atraente. Ao passarem a meu lado, observo suas caras e percebo que estão cochichando. Imagino sobre o que falam. Decidida, caminho em meus saltos altos na direção dele e passo a mão nas suas costas enquanto o observo lendo concentrado o jornal. Quando chego bem à sua frente, eu o cumprimento com voz melosa:
— Bom dia!
Gustavo não olha para mim.
— Bom dia, senhorita Castela.
Mas peraí... voltamos aos malditos sobrenomes?
Não esperava que ele me pegasse em seus braços e sorrisse para mim como se fosse meu namorado. Mas, por favor, um pouco mais de cordialidade após uma noite separados!
Sua indiferença me desconcerta.
Por que não olha para mim?
Mas, sem querer entrar no jogo de gato e rato, continuo a seu lado esperando que decida quando vamos sair. Dou uma olhada no relógio. Oito e meia. Olho para a entrada do hotel e vejo a limusine esperando. Por que continuamos parados aqui? Gustavo ignora minha presença e segue lendo o jornal com expresão tensa. Será que ainda está irritado? Tenho vontade de perguntar, mas não quero tomar a iniciativa. Não quero dar o primeiro passo. Não me mexo. Minha respiração mal se ouve. Tenho certeza de que está esperando algum movimento da minha parte para logo soltar suas palavras ácidas.
As pessoas, em sua maioria executivos como nós, passam ao nosso lado. São 8h35. Me espanta que ainda estejamos aqui, já que Gustavo é obcecado com horário. Já são 8h40. Continua muito calmo, sem se importar com o fato de eu estar parada a seu lado como uma idiota, quando ouço uns saltos acelerados. Kemelly, com um blazer e uma saia branca, se aproxima de nós.
Nem olha na minha cara. Só tem olhos para Gustavo, a quem se dirige em alemão:
— Desculpa a demora, Gustavo. Um probleminha com minha roupa.
Vejo que ele sorri.
Olha para ela, examinando-a de cima a baixo com seus olhos azuis.
— Não se preocupe, Kemelly. A demora valeu a pena. Dormiu bem?
Ela sorri.
— Sim — responde, sem se importar com minha presença. —Consegui dormir um pouco.
Disse “Consegui dormir um pouco”? Peraí, o que esses idiotas estão dando a entender? Ela sorri, toda boba após a farra da noite anterior, e toca na cintura dele. Essa intimidade me incomoda. Acho repugnante. E ao mesmo tempo seus sorrisos me revelam muitas coisas. Respiro com dificuldade ao me dar conta do que houve entre esses dois, e tenho vontade de gritar e espernear. De repente, Gustavo apoia a mão nas costas de Kemelly e, tocando rapidamente sua cintura, diz:
— Vamos, o motorista está esperando.
E, sem olhar para mim, começa a caminhar com essa mulher a seu lado e me ignora completamente.
Eu os observo petrificada.
Não sei o que fazer. Um ciúme incontrolável que até então eu não havia sentido se instala no meu estômago, e estou com vontade de pegar o lindo jarro de cima da mesa e quebrar na
cabeça dele.
Meu coração está a mil. Sua batida é tão forte que tenho a sensação de que a recepção inteira consegue ouvir. Aquilo me humilha, me aborrece, e ele continua impossível.
Idiota!
A frieza de Gustavo continua e eu não entendo por quê. Mas não. Não vou aceitar isso. Gustavo  não me conhece, e ninguém ousa me humilhar dessa forma.
Começo a caminhar atrás deles. Se esse babaca alemão acha que vou armar um barraco, ele acertou. Não vou deixar por menos! Quando chegamos à limusine, o motorista abre a porta. Kemelly entra, em seguida elementra e, na minha vez de entrar, Gustavo faz um gesto com a mão.
— Senhorita Castela, sente-se na cabine da frente com o motorista, por favor.
Putz! Que golpe desgraçado que ele me dá bem na frente de Kemelly. Mas, surpreendentemente, sorrio com frieza e digo:
— Como o senhor quiser, senhor Mioto.
Com minha máscara de indiferença, me sento ao lado do motorista. Que cara emburrada eu devo estar fazendo! Por alguns segundos eu os ouço falar e rir atrás de mim até que um ruído metálico soa em meus ouvidos. Com o canto do olho vejo um vidro opaco dividindo a parte de trás e a parte da frente do carro.
Estou furiosa. Irritada. Exasperada.
Não gosto desse joguinho e não entendo por que ele faz isso comigo. Instintivamente cravo as unhas nas palmas das mãos, até que o motorista me pergunta:
— Quer ouvir música, senhorita?
Faço que sim com a cabeça. Não consigo falar nada. Coloco meus óculos escuros e escondo meus olhos. De repente, começa a tocar a música de Dani Martín Mi lamento e eu sinto muita vontade de chorar.
Meus olhos estão ardendo e as lágrimas imploram para sair. Mas não. Não vou chorar.
Engulo as lágrimas e tento curtir a música e a viagem. Chego até a cantarolar. Durante os 45 minutos do trajeto, minha mente trabalha a toda velocidade. O que aqueles dois estão fazendo ali atrás? Por que Eric me pediu para sentar na frente? Por que continua chateado comigo? Quando o carro para, desço sem esperar que o motorista abra a porta para mim. Que ele faça isso aos dois lá de trás. Aos patrões. Assim que desço, sorrio ao ver Nilson Neto. É o secretário dessa sucursal e entre nós dois sempremrolou uma química. Mas uma química do bem. Decente. O motorista abre a porta, e Gustavo e Kemelly saem do carro. Nãomme viro para eles. Me limito a olhar para a frente com meus óculos escuros. Gustavo cumprimenta Neto, o chefe da sucursal, e o pessoal da diretoria. Apresenta todos eles a Kemelly e depois a mim. Com profissionalismo, aperto as mãos deles para depois acompanhá-los até uma sala. Mas agora, em vez de ir atrás de Gustavo e Kemelly, me demoro parampoder cumprimentar Nilson. Damos dois beijinhos e entramos na sala conversando. Antes de nos sentarmos, umas senhoras nos oferecem café. Aceito com prazer. Preciso de café. Tomo três. Conforme o tempo vai passando, a distância de Gustavo e a conversa com Nilson começam a me acalmar. Nesse momento, percebo que Gustavo se vira. É só um instante, mas sei que olhou para mim. Me procurou. Nilson e eu continuamos conversando e nós dois rimos, quando ele conta algumas coisas da filha dele. É um paizão e isso me comove. Dez minutos depois, todos nós passamos à sala de reuniões, nos acomodamos em nossos lugares e, como sempre, Gustavo senta à cabeceira da mesa. Kemelly fica à sua direita e eu tento me colocar num segundo plano. Não quero olhar para ele. Não sinto vontade.
— Senhorita Castela — ouço meu chefe me chamar.
Sem hesitar, me levanto e me aproximo dele com profissionalismo. Seu perfume invade minhas narinas e me desperta mil sensações, mil emoções. Mas consigo manter inabalada a expressão do meu rosto.
— Sente-se na outra ponta da mesa, por favor. De frente para mim.
Eu vou matá-lo... matá-lo e matá-lo.
Não quero olhar para ele, nem quero que olhe para mim. Mas, disposta a ser a secretária perfeita, pego meu notebook e me sento onde ele indica. Do outro lado da mesa, de frente para ele. A reunião começa e eu fico atenta a tudo que falam. Não olho para ele e acho que ele também não está me olhando. Estou com o notebook aberto diante de mim e temo receber alguma mensagem de Gustavo. Por sorte, não chega nenhuma. À uma da tarde, a reunião é interrompida. Hora do almoço. O chefe da sucursal reservou mesa num hotel próximo, e Nilson me convida para ir no carro dele. Aceito. Sem olhar para meu Iceman, que está ao lado de Kemelly, passo reto por ele, até que o ouço me chamar. Peço a Nilson que me dê um segundo e vou até meu chefe.
— Vai aonde, senhorita Castela?
Ao restaurante, senhor Mioto.
Gustavo olha para Nilson.
— Pode vir conosco na limusine.
Ótimo. Agora o desconfiado é ele.
Que se dane!
Kemelly nos olha. Não entende o que estamos dizendo. Falamos em espanhol, e imagino que isso a incomode.
— Obrigada, senhor Mioto, mas, se não se importa, irei com Nilson.
— Me importo — responde.
Não há ninguém ao nosso redor. Ninguém pode nos escutar.
— Pior para o senhor.
Dou as costas a ele e saio.
Dá-lhe, fúria espanhola!
Espanha 1 – Alemanha 0.
Sei que acabo de cometer a maior imprudência que uma secretária pode fazer. E ainda maior em se tratando de Gustavo. Mas eu precisava disso. Precisava fazê-lo se sentir como eu me sinto. MSem pensar nas consequências, entre elas a demissão certa, ando até Nilson e seguro seu braço com intimidade. Entramos em seu Opel Corsa e nos dirigimos ao restaurante,
enquanto começo a pensar no desemprego. Depois dessa, vou ser demitida com certeza. Quando chego ao estabelecimento, corro com Nilson para tomar várias Coca-Colas.
Ai, meu Deus! Como gosto de sentir suas borbulhas na minha boca...
Mas até as borbulhas se desfazem quando vejo entrar Gustavo, seguido de Kemelly e dos outros chefes. Olha na minha direção e posso perceber sua irritação. Os diretores entram no salão e rapidamente se acomodam em seus lugares. Gustavo faz menção de se sentar, mas logo se desculpa com seus colegas e me faz um sinal com a mão. Eu e Nilson o avistamos, e não posso me recusar a ir.
Dou mais um gole na minha Coca, que deixo no balcão e me aproximo de Gustavo.
— Diga-me, senhor Mioto. Em que posso ajudá-lo?
Gustavo abaixa a voz e, sem alterar a expressão de seu rosto, pergunta:
— O que você está fazendo, Ana?
Supresa por voltar a ser “Ana”, respondo:
— Tomando uma Coca. Zero, por sinal, que engorda menos. Minha resposta irreverente o desespera. Sei disso e gosto disso.
— Por que você está me irritando o tempo todo? — pergunta, me deixando desconcertada.
Que cinismo...!
— Eu?! — sussurro. — Mas que cara de...
Seu olhar é tenso. Duro e desafiador.
Suas pupilas se contraem e me dizem algo, mas hoje eu não quero entendê-las. Recuso-me.
— Vá para o salão — me diz, antes de se virar. — Vamos almoçar.
Quando eu e Nilson chegamos ao salão, nos sentamos na outra ponta da mesa. Meu celular toca: minha irmã! Decido ignorá-la outra vez, não estou a fim de escutar seus resmungos. Mais tarde ligo de volta. A comida está ótima e eu continuo de papo com meu amigo. De vez em quando, lanço olhares na direção do meu chefe e vejo que ele sorri para Kemelly. Minha desconfiança aumenta. Mas, quando seus olhos cruzam com os meus, me sinto arder. Meu corpo se incendeia. Seu olhar de Iceman consegue fazer com que todas as minhas terminações nervosas se agitem ao mesmo tempo e eu me queime inteira.
Às quatro e meia, voltamos à sede da empresa. Eu, claro, pego carona com Nilson. A reunião recomeça e só acaba às sete.
Estou exausta!

___________________________

Continua.....☆

Que reviravolta tivemos nesse capítulo em??

Peça-me o que quiser, miotela ✔️Onde histórias criam vida. Descubra agora