XXI

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Em uma típica manhã de fim de ano, nublada e fria, estaciono a teitei na frente da escola. Finalmente as férias já batem na porta.

Depois, só vai faltar um único e singelo ano para — graças a Deus — dar adeus ao ensino médio. O que não significa que não vou sentir falta do colegial. A insegurança do meu futuro com Michael me atormenta bastante quando penso na formatura. Para ser sincero, tenho medo dos caminhos diferentes que iremos seguir.

— Chegou cedo — Marty diz, carregando vários livros nas mãos.

— Se eu não chegar cedo, chego molhado. — Aponto para o céu encoberto.

— Preparado pras provas?

— Espero que sim. Eu saindo vivo delas, tá ótimo.

Destravo o bagageiro da moto, pego minha mochila e ando com Marty para dentro do Santa Inês. Certamente não estou com um pingo de paciência para encarar os estresses que as provas finais vão me dar.
Mas tenho que me esforçar, a menos que eu queria repetir de ano.

Passo pela cantina e paro para beber água.

— Olha quem tá ali de papinho com a Eloisa — Marty diz, me cutucando e rindo.

O reflexo do bebedouro me permite já saber quem é.

— Quem? — pergunto já sabendo a resposta. Engulo a água.

— Teu amor, o Michael.

Minha pele ferve de ciúmes. Mas antes de me virar e olhar tento controlar minhas emoções, pelo menos por fora.

— Meu amor é tua cara, Pablo.

Continuamos a andar pelo corredor. Michael me olha de canto enquanto conversa com Eloisa. Ele sabe que estou morrendo de ciúmes, por isso a olhadinha. Nós temos uma linguagem quase secreta pelo olhar, ele me entende pela troca de
olhares.

— Quero dormir — digo ao me sentar, colando o rosto na mesa. — Não quero estudar hoje.

— Para de preguiça. — Marty chuta minha cadeira.

— Eu tô tentando, mas o sono não deixa.

A professora Magali chega na sala antes do sinal tocar e fica calada, sentada e folheando um livro.

— Se a Magali te pagar dormindo na aula dela...

— Eu já tô bem, passou. — Levanto de pressa e arregalo os olhos. — Viu?

Marty dá uma risadinha e bate com o caderno na minha cabeça.

— Medo de ficar pendurado que nem ano passado na matéria dela? — Ele fala todo satírico.

— Claro, não preciso sofrer mais uma vez na mão dela.

Michael entra na sala cinco minutos antes do sinal tocar e se senta em uma mesa um pouco perto de mim que dá para ele me observar.

Ele sussurra algumas vezes o meu nome, mas finjo não ouvir. Então, Michael joga uma bolinha de papel amassado tentando chamar minha atenção, mas também não ligo.

— Will! — ele chama. — Willian!

— Acho que o Michael quer falar contigo. — Marty me cutuca com a ponta da caneta.

— Fala que eu morri.

— Ele disse que...

— Manda ele parar de graça, pô — Michael interrompe Marty. — Cutuca ele bem forte aí.

Marty vem com a caneta na minha direção.

— Se me triscar com essa caneta de novo... — ameaço.

— Então fala logo com esse menino chato.

Corpos em chamas: um clichê de romance adolescenteOnde histórias criam vida. Descubra agora