XXV

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Só um aviso: não fique no meio de um bando de crente quando estiver desviado. Em primeiro lugar, você vai ser o alvo da rodinha. Em segundo, vão questionar seus novos modos de se vestir e de se comportar. Com certeza você vai se estressar e ficar com vontade de mandar todos tomarem naquele lugar.

— Tá vendo aí, ele já tá na modinha de usar esses tipos de cordão — Camila comenta, pegando no meu colar de fio de algodão com um pingente da torre Eiffel.

— Né isso que tô vendo, todo mundano já — Alice diz com um tom de deboche.

— Qual o problema? — retruco, cruzando os braços e arqueando a sobrancelha.

É difícil lidar com certas brincadeiras das ovelhas venenosas da igreja. O tom delas é de zoação, mas você sabe que é exatamente o que elas pensam.

— Não tem problema nenhum — Camila começa. — Mas toma cuidado, viu? Tive uma revelação. Sonhei que eu tirava o
demônio do homossexualismo de ti. Você falava com uma voz toda feminina me afrontando.

Pelo amor de Deus, né? Uma revelação? Sofro bullying desde criança por estar na cara que sou gay, e ela vem me falar de revelação? Nunca ninguém precisou de iluminação divina para me chamar de viadinho.

— Nada a ver — digo timidamente, mas com muita raiva.

— Sangue de Cristo, quando é revelação mesmo tem que tomar cuidado — Alice comenta.

— Tem mesmo, ele já tá usando essas pulseiras. — Lívia segura meu pulso com pulseiras de silicone coloridas. — Eu vi
monte de gays usando elas.

Solto um suspiro e dou dois passos para trás revirando os olhos. Fico completamente desconfortável com tanto veneno gospel, começo a ficar vertiginoso.

— Ele já tá com raiva, olha a cara dele — Camila diz, dando uma risada.

Tento me conter o máximo que posso, mas é impossível com essas meninas.

— Vão se foder — digo, meu tom é incisivo.

— Willian? — Camila me olha, boquiaberta.

O sinal finalmente toca, e eu dou passos largos para sala sem esperar ninguém. Minha vontade é de esganar todas elas.

***

Saio da última aula do dia escutando música no meu fone de ouvido. Marty está do meu lado com uma expressão nada
feliz, quando olho para a quadra de esportes vejo o motivo: Pablo aos amassos com uma menina do primeiro ano. Esses varões da igreja estão cada vez piores. São os hormônios?

Estefany chega toda animada do nosso lado.

— Vocês já estão ansiosos para a formatura?

— Sinceramente? Nenhum pouco — digo. — Ainda tá um pouco longe, não acha?

— O ano passa rápido. A gente tem que começar a preparar nossa festa — ela comenta.

— Isso é verdade — Marty diz com uma cara melhor.

Realmente o tempo passa rápido. Parece que foi ontem que nós estávamos iniciando o primeiro ano, e agora, aqui estamos nós faltando menos de um ano para nos formar.

— No momento eu só tô preocupado com o trabalho de filosofia que vale ponto pra prova. Perdi o livro — comento.

— Se eu fosse você, dava um jeito de emprestar esse livro de alguém. — Estefany diz. — Esse trabalho vale quase a metade da prova.

Na frente da escola nos despedimos, e eu monto na teitei. Em seguida, Michael se materializa na frente da moto.

— Me dá uma carona aí, pô. — O sorriso aparece em seu rosto.

— Não sei... será? — brinco.

— Bora logo, deixa de graça. — Ele pega minha mochila e monta na teitei. — Ainda não esqueci que me deixou sozinho lá no meio da briga semana passada.

Olho para ele pelo retrovisor enquanto acelero e dou uma risadinha tampando a boca com a mão.

— Me conta, quem apanhou mais? Alguém mais viu?

Ele também ri antes de me responder.

— Acho que foi a Eloisa. Só quem viu foi o pessoal da coordenação que me ajudou a separar as duas.

Comemoro dando uns pulinhos em cima da moto.

— Você não gosta mesmo dela, né? — ele diz.

— E eu deveria? Ela é insuportável. Você gosta porque só pensa com a cabeça de baixo.

— E você tem ciúme que eu sei. — Ele ostenta um sorriso.

— Nenhum pouco — minto com uma risadinha.

O sorriso desaparece do rosto dele. Michael esfrega as mãos na calça jeans colocada.

Corpos em chamas: um clichê de romance adolescenteOnde histórias criam vida. Descubra agora