Capítulo 22

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Isaque

— Tem alguém nos esperando de novo? — Zara pergunta ao abrir a porta do apartamento e dar de cara comigo pela segunda vez em dois dias.

— Não, eu só queria perguntar uma coisa. Pensei em mandar uma mensagem, mas tenho a impressão de que você nem checa o seu celular.

— Impressão bem correta. Vejo o meu telefone com menos frequência do que eu deveria — ela murmura, coçando os olhos e boceja preguiçosamente. — Desculpa. Pode perguntar.

Quero beijar essa garota de novo, mesmo depois de tudo, mas eu não posso porque não sei se Zara gostaria quer que eu a beije. As chances de ela me dar um tapa dessa vez são muito maiores do que antes.

— Espera — Zara diz, me vendo abrir a boca para falar. — Essa vai ser a sua pergunta pessoal do dia?

— Não, é uma pergunta normal.

— O.k. então.

— Por um acaso essa faculdade tem duas bibliotecas gigantes. Acho que dá pra começarmos a procurar o tal do Salvador Santino.

Zara me observa em silêncio, ainda segurando a porta entreaberta.

— Não foi uma pergunta.

— Ficou nas entrelinhas.

— Tá bom. Você já parou pra pensar o que vamos fazer quando acharmos o nosso Salvador?

— Falar com ele.

— De verdade?

— Acho que sim. Ele deve saber qual é a história do penhasco ou pelo menos saber onde devemos procurar. Não tem outro jeito.

Zara inclina a cabeça e me avalia.

— Você quer mesmo isso, né? Saber do penhasco e tudo mais.

— Quero.

— Eu devo ser uma má influência pra você.

— Tenho quase certeza que é o contrário.

Ela ri para o chão. A risada dela é incrível.

— Acho que a gente poderia ir a outro lugar sem ser a biblioteca.

***

Andamos em silêncio até chegar ao diretório. Zara dá a volta no barracão, distraída consigo mesma e quase não reparando em mim. Atrás do prédio ela vai direto para o amontoado de caixas vazias que foram empilhadas de qualquer jeito na entrada do penhasco. Eu a ajudo tirar uma por uma até que o pedaço de madeira velha aparece, grudada com um único prego que a faz virar um tipo de porta giratória para o buraco grande o bastante para que eu passe com o corpo curvado. Zara quase não precisa se encolher para atravessá-lo.

Não tem pessoas conversando por todos os lados, sentadas sob as árvores ou nos engradados de cerveja vazios. Não tem barulho de cochichos ou risada. Nem o barulho do campus chega até o terreno do penhasco.

Depois de arrumar a porta improvisada eu paro e olho ao redor. Nem parece o mesmo lugar, apesar dos vestígios do que acontece nas sextas-feiras à noite. Bitucas de cigarro, latas de refrigerante e cerveja amassadas, papeis amassados e até resto de comida.

Em pé mais a frente, Zara tira uma sacola da mochila e se agacha para pegar uma garrafa de água vazia que estava no chão. Ela olha para o plástico com curiosidade antes de apertá-lo e jogá-lo na sacola.

Ela faz a mesma coisa com tudo o que encontra na grama.

Zara já está quase perto da pedra quando eu resolvo me movimentar. A alcanço com as mãos cheias de lixo que despejo na sacola. Provavelmente é a hora de alguém falar alguma coisa antes que comece a ficar constrangedor, mas o silêncio continua enquanto ela tira da bolsa uma toalha escura com algumas manchas de tinta. Observo como ela forra um pedaço de grama e depois tira alguns sacos da bolsa. Um deles tem o logo da loja de sonuts.

Brilho e EspumaOnde histórias criam vida. Descubra agora