Zahara
Antes de ir embora da minha casa e depois de uma turnê completa pelo jardim, Isaque me disse um "te vejo daqui dois dias" com um tom de quem não tinha dúvida nenhuma de que ele realmente me veria no campus quando nossa suspensão acabasse. Acenei que sim, porém ainda estava incerta sobre a ideia.
Eu estava confiante de que ficaria em casa com Nailha para sempre, tendo que lidar com a minha mãe que com certeza aproveitaria a minha presença em casa para tentar me convencer a ir para os eventos da marca Calabazas para "me animar e não ficar trancada no quarto com Van Gogh". Mas aqui estou eu, parando o carro em frente ao meu prédio.
Subo as escadas até o meu andar e percebo que nenhum dos vizinhos que encontro pelo caminho liga muito para minha presença. Ninguém liga e isso não me importa. A verdade é que a falta de interesse das outras pessoas em mim até me conforta um pouco.
A única garota que me olha um pouco mais avidamente é uma que mora em um dos andares de cima. Nos esbarramos algumas vezes no elevador ou na escada, mas nada além disso. Nada que justificasse o olhar avaliador e denso que ela me dá quando passo por ela na escada.
Nunca falei com Raquel, mas imagino que a desconfiança que eu vejo nos seus olhos tenha a ver com Isaque. Em outro momento - um em que eu estivesse mais Zara e menos Zahara - eu falaria para ela que não tem motivo nenhum para ela me matar com os olhos. O que aconteceu entre Isaque e eu foi algo rápido e não se repetiria.
Jogo minha mochila em cima da cama e olho para o quarto. Os quadros que eu deixei ainda estão pendurados na parede e a tela meio-pintada ainda está no cavalete perto da porta do banheiro.
Arrumo minha paleta e cubro uma tela com papel pardo para que ela chegue à primeira aula intacta. Coloco de qualquer jeito as roupas amassadas no guarda-roupa e, pela primeira vez, no lugar de shorts e camiseta, escolho um vestido. Nada que Melissa aprovaria, pois não é uma criação de um dos estilistas da nossa empresa É só um vestido jeans que eu comprei em um brechó e que minha mãe com certeza colocaria fogo.
Troco a sapatilhas por um tênis e cubro os ombros com uma blusa fina. Pretendo tomar coragem antes de sair e enfrentar o mundo, mas ouço batidas na porta do quarto. Pelo visto o tal do mundo está com pressa de me ver o desbravando, pois Isaque está do lado de fora, sorrindo para mim.
— Oi — digo com a porta entreaberta.
— Vim checar se você veio mesmo.
— Eu não queria, mas Nailha me acordou dizendo que eu tinha que ir para escola resolver um mistério. Sua culpa.
Acordei com ela de uniforme, deitada na minha cama e me chacoalhando. Isaque conseguiu entrar na mente da minha irmãzinha e essa é a verdadeira razão da minha vinda.
— Sua irmã é muito esperta. Gostei dela.
— E ela gostou de você, como deve ter percebido.
Isaque sorri mais e eu olho para o corredor. Raquel não está, mas outras garotas que moram no andar passam e notam Isaque na frente do meu quarto. É mais difícil ignorar a minha presença com ele aqui. Isaque é bonito, com cabelos castanhos escuros levemente enrolados, e também é famoso no campus devido à natação.
— Você quer entrar?
— Não, nós temos que ir. — Ele tira o celular do bolso e checa as horas.
— Nós?
— Você e eu.
Não pergunto para onde, apenas deixo Isaque na porta, pego minhas coisas e saio do quarto.
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Brilho e Espuma
RomansaTudo na vida de Isaque parece ser normal. A faculdade, os amigos e até a sua obsessão pela natação são coisas com que ele está acostumado e consegue lidar. Mas ninguém é perfeito, todo mundo tem pelo menos uma partícula de loucura e talvez tenha sid...