Capítulo 16
Isaque
— O.k. Não foi tão bom quanto eu esperava, mas eu tenho esperança de que vocês vão melhorar na próxima vez — Ramon diz depois de apitar, sinalizando que o treino de nado costas de Samuel e Murilo havia acabado.
Não consigo bloquear a minha expressão satisfeita ao olhar o relógio preso sobre nossas cabeças e ver que Samuel terminou atrás de Murilo com quase sete milésimos de segundos de diferença. Na natação competitiva isso é uma eternidade.
— Tira o sorrisinho do rosto Isaque porque até onde eu sei você ainda está atrás de mim nessa categoria.
Samuel pega uma toalha do banco e seca o rosto. Pode ser coincidência, mas ele tem o rosto e o porte exatamente iguais aos de todos os valentões retratados em filmes e livros por aí. Ele é grande e a pele clara do rosto parece sempre estar vermelha como se ele vivesse com dor ou com raiva de alguma coisa. Se eu fosse ele teria raiva de mim mesmo por ser tão imbecil.
— E você atrás de mim em todas as outras — respondo com tranquilidade. Ramon está ocupado demais com a prancheta dele e não nota a nossa pequena troca de farpas então eu continuo: — Agora você espera aqui e assiste pra ver se aprende como se faz.
Vejo Joaquim balançar os ombros, rindo, e se levantar muito cheio de si. Hugo está em silêncio. Ele odeia brigas. É calmo demais para sequer pensar em discutir com alguém, a não ser que essa pessoa seja Joaquim.
Samuel não se incomoda com o meu comentário, apenas solta uma risada sarcástica. Nos primeiros dias de treino da equipe no primeiro semestre na faculdade eu não fui com a cara dele. Samuel está no time há mais tempo, coisa que ele não para de repetir sempre que pode. Mesmo nos dias mais quentes que esse país pode oferecer, Samuel desfila por aí com o seu moletom da atlética, lembrando a todos que ele faz parte do time de natação, e se gabando para garotas achando que um pedaço de roupa as levaria à loucura. Apesar de notar tudo isso logo no início, eu achei que a minha implicância com ele fosse exagerada e gratuita. Na segunda semana eu descobri que não, ele era idiota mesmo.
Hugo me puxa em direção à piscina, sem me dar chance nem de raciocinar e pensar em algo a mais para falar. Joaquim nos segue e logo já estamos fazendo o que Ramon queria: nadando.
Fico agitado e acabo descontando na água, o que é bom. Minhas braçadas ficam mais largas e rápidas a ponto de os músculos dos meus braços começarem a queimar em poucos minutos. Mas, apesar de ser o primeiro colocado entre os três que estão na água naquele momento, não sou rápido o suficiente e continuo sem chegar nem perto do tempo de Samuel. Odeio nado costas.
Acabo ficando irritado e o resto do treino vira uma tragédia. Ramon nos faz passar por todas as modalidades e eu não atinjo o meu melhor em nenhuma, mas pelo menos não sou tão ruim nos outros estilos quanto Samuel que decide tirar o dia para me infernizar. Ele ainda não deve ter superado a pequena cena que Zara o fez passar. Até fiquei um pouco melhor com o meu próprio fora depois de vê-lo com a camisa encharcada no meio da festa sábado.
A sensação conhecida de dormência está em todos os músculos do meu corpo ao sair da água. Não reclamo porque gosto de senti-la, significa que eu fiz o máximo que eu pude dentro das circunstâncias.
Ramon dá um sermão de dez minutos sobre comprometimento e coisas do tipo, ignorando a exaustão estampada em nossos rostos. Estou pronto para voltar ao chuveiro assim que ele para de falar e nos deixa no vestiário, mas Samuel aparece na minha frente de novo.
Acho que eu nunca detestei alguém tanto assim, mesmo que ele não tenha feito nada diretamente para mim além de encher a minha paciência com essas provocações dignas de jardim de infância. Minha aversão a Samuel é mais uma questão de decência.
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Brilho e Espuma
Storie d'amoreTudo na vida de Isaque parece ser normal. A faculdade, os amigos e até a sua obsessão pela natação são coisas com que ele está acostumado e consegue lidar. Mas ninguém é perfeito, todo mundo tem pelo menos uma partícula de loucura e talvez tenha sid...