Brilho e Espuma

Capítulo 25

Isaque

Há alguma coisa de errado entre Hugo e Joaquim. Ser irônicos entre si é uma coisa normal para eles, mas as alfinetadas e o revirar de olhos estavam passando dos limites nos últimos dias. Sem contar aas vezes que eu cheguei no meio de uma óbvia discussão e os dois se calaram ao perceber minha presença. Até cheguei a me perguntar se o motivo da briga seria eu e o meu visível afastamento, mas não, isso não faz sentido nenhum. É algo entre eles.

Não sou um amigo tão ruim quanto pareço. Perguntei o que estava acontecendo para os dois juntos e depois separadamente, mas tudo o que eu recebi foi uma lição de moral por estar dando muito mais atenção à uma garota do que para eles ou qualquer outra coisa. Não me defendi porque é verdade.

Antes o meu maior problema era arranjar um jeito de Zara me deixar quebrar esse muro de concentro que ela colocou entre mim e ela. Agora, para piorar tudo, meus dois melhores amigos estão sem se falar direito e o meu pai me ligou de novo, me lembrando que nada nunca está tão ruim que não possa piorar.

A conversa foi a mesma de sempre. Começou com um "tudo bem, filho?" e terminou com um discurso sobre como eu preciso começar a tratá-lo como pai e não como um desconhecido. No final da ligação ele disse que me amava. Joguei o telefone em cima da cama do Lucas com tanta força que ele pulou e voou para o banheiro. Só o tirei de lá quando fui tomar banho quatro horas depois.

Segundo Dante, Nicolas está bem, está ótimo. Muito bem aconchegado na barriga de Florine, esperando a hora de sair e ter a maior decepção da vida quando ele descobrir que o mundo é podre. Essa última parte fui eu quem disse no telefone para Dante que respondeu que eu deveria recebê-lo para que meu irmão soubesse que o mundo também pode ser bonito. Blá blá blá.

Outro dia eu fiz a conta e vi que quando Nicolas tiver 18 anos eu vou ter 37. Trinta e sete anos. Eu já vou ter vivido um terço da minha vida com base na estimativa para uma pessoa do sexo masculino que mora no Espírito Santo e não pratica nenhuma atividade de risco. Eu vou estar quase chegando nos 40 e Nicolas vai estar fumando o primeiro cigarro dele.i um pela milésima vez se eles estavam brigados já que Hugo chegou à sala de estudos do prédio de Direito, olhou para mesa em que Joaquim e eu estávamos, e foi sentar em uma do outro lado da sala.

— Hum. — Olho para o rosto de Joaquim. Seus olhos azuis esbugalhados estão maiores do que nunca. — O que ele fez de tão ruim pra você dizer isso?

Joaquim fecha o caderno de anotações – que não tem anotação nenhuma – com um baque.

— Não é possível que você não esteja percebendo.

Instantaneamente minha mão vai pra o meu rosto e eu mesmo me afago, me dando forças para aguentar o discurso de "você só pensa nessa garota" que eu acho que vou receber agora pela milionésima vez, e que eu sei que mereço.

— Percebendo o que Joaquim?

Ele nega com a cabeça e seu cabelo claro vai para todos os lados.

— Que droga, Isaque! Eu não posso te falar.

— Por que não?

Os lábios de Joaquim tremem. Eu nunca o vi tão nervoso. Talvez tenha visto, mas só agora estou reparando bem em como ele fica nervoso quando está nervoso. Paradoxal.

— Porque eu não tenho certeza ainda — ele murmura e coça o queixo onde alguns pelos castanhos estão nascendo. Vamos nos barbear e depilar de novo só quando a próxima etapa do campeonato chegar. — É ridículo.

Joaquim está transtornado. Fica passando as páginas do seu caderno em branco como se tivesse mesmo algo neles. A outra mão aperta o lápis com uma força descomunal. Olho para Hugo que ainda está no canto oposto da sala de estudo. Aqui o silêncio deveria ser tão denso quanto na biblioteca, mas ninguém cala a boca e o barulho de conversa não deixa ninguém estudar de verdade. Joaquim começa a bater na mesa a borracha presa no fim do lápis. Sei que ele está olhando para Hugo também.