Capítulo 1

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O chacoalhar da carruagem lhe causou um embrulho no estômago. Não, não o chacoalhar da carruagem. Se fosse honesta consigo mesma, admitiria que aquele aperto bem no meio de seu abdômen nada tinha a ver com o movimento do veículo, e sim com o nervosismo pelo que estava prestes a acontecer.

Ela puxou a cortina de veludo com um único dedo, permitindo apenas uma espiada rápida e limitada para o lado de fora. Carruagens de aluguel quebradas e de tinta descascada, passavam correndo pela pista lateral. Nas calçadas, casais de braços dados andavam tranquilamente, enquanto mulheres e homens sozinhos passavam correndo por eles, com muita pressa para chegar em qualquer que fosse seus destinos.

Mais adiante, roupas e acessórios da última moda pintavam as vitrines das lojas, chamando a atenção de jovens que andavam em grupo, apontando para vestidos e casacos enfeitados com miçangas e fios metalizados. Na calçada, uma jovem de vestido simples competia pela atenção dos passantes, oferecendo flores em troca de algumas moedas de bronze.

Embora passassem pela avenida principal, e a rua estivesse cheia com pessoas indo para casa no final da tarde, ninguém parecia notar a carruagem discreta, sem qualquer brasão ou cores de uma das casas tradicionais da capital.

Uma ninguém, Hermione pensou voltando a fechar a cortina. Ali, não era diferente da pequena cidade, no interior da Inglaterra. Apesar de tudo o que sua família, sua magia, havia conquistado nos últimos anos, ela era uma completa anônima, sem valor algum.

Sua família...

Ela só esperava que os pais ficassem bem com sua partida. Os deuses sabiam que ela sentiria saudade todos os dias, mas sua partida era importante, mais do que isso... necessária.

Pensar na família fez com que o desconforto no estômago se intensificasse. A queimação característica, já tão conhecida, surgiu, discreta, porém Hermione sabia que mais tarde ficaria insuportável.

Não podia deixar isso acontecer, ela pensou se ajeitando no banco da carruagem, apoiando a cabeça no encosto. O cabelo encaracolado, já bagunçado por causa da longa viagem, ficou preso entre seu corpo e o estofado. Apenas um cacho, escapando pela lateral de seu rosto, sobre seu ombro, corria livre até a altura da cintura.

Ela soltou um longo suspiro. Uma mão enluvada correu até o bolso do manto de viagem azul marinho e tirou o envelope que havia mudado tudo, tantas semanas antes. A letra da mulher que viria a ser sua mestra era elegante e refinada. Embora o papel caro e imaculadamente branco não tivesse uma única linha, as palavras eram alinhadas como se a mulher tivesse medido e calculado exatamente a distância entre as letras, que se sobrepunham umas sobre as outras, interligando-se pelos arcos e curvas de sua caligrafia.

Um convite, um pedido e um endereço. Eram as únicas coisas que continham naquela última carta enviada. Depois daquilo, Hermione levou apenas uma noite não dormida para tomar sua decisão, comunicar os pais pela manhã e vagar pelas ruas empoeiradas de sua cidade natal, em busca dos itens que precisaria em sua aventura.

Hermione não fazia a menor ideia de como Minerva McGonagall havia ouvido falar dela, ou como havia conseguido seu endereço, mas imaginou que ser a curandeira particular da família real deveria dar a mulher algumas vantagens.

Apenas saber que a renomada curandeira estava ciente de sua existência já era uma grande honra, Hermione pensou. Que ela dissesse que acompanhava o trabalho da menina e a chamasse para passar algum tempo com ela na capital, servindo como sua discípula, era ainda mais inacreditável. Hermione não era tola. Ela sabia o tamanho da oportunidade que estava bem aos seus pés. Um verdadeiro sonho que parecia ter caído dos céus bem seu colo.

Domínio e AscensãoOnde histórias criam vida. Descubra agora