Jeff
Era engraçado ver como André não conseguia tirar os olhos da Larah; não conseguia fechar a boca, também não conseguia tomar o café que esfriava na caneca entre seus dedos. Larah estava sentada em cima da mesa e batia uma colher no tampo de modo intermitente, causando um ruído ensurdecedor num local tão remoto e silencioso como aquela casa.
Doralice nos observava da porta dos fundos enquanto queimava um cigarro. Ela era esperta como uma raposa e já devia ter sacado que havia algo entre mim e o André. Algo inacabado, inominável, incompreendido. Da cena toda, meu olhar se dividia entre minha criança e ele, e confesso que por um ínfimo instante, me deixei levar pela fantasia de que não havia um oceano de diferenças entre nós, e um mundo cão do lado de fora pronto a nos devorar.
– Dé...! – Larah se virou para o André e ofereceu a colher a ele, que a pegou, embasbacado por ela ter tentado falar seu nome.
– Talvez ela tenha memória fotográfica também – brinquei.
Ele não disse nada, mas vi seu pomo de adão subir e descer quando engoliu em seco. O momento foi quebrado pelo som da porta da cozinha batendo com o vento. Doralice já tinha entrado e lavava as mãos na pia da cozinha.
– O que há entre vocês dois? – Ela perguntou, na lata.
Olhei para ela e encarei seus olhos astutos. Não havia como mentir para minha mãe, ao menos eu nunca consegui.
– Quando eu descobrir, te conto – foi minha resposta. O que estava implícito ela rapidamente absorveu, e isso foi notório quando suas sobrancelhas arquejaram. Ela até podia ser semianalfabeta, nem por isso deixava de ser inteligente.
– Devo te agradecer? – Ela olhava para André agora; ele relutou em tirar os olhos da Larah, que no momento brincava com seus enormes dedos espalmados no tampo da mesa.
– O quê? – Perguntou, abstraído.
– Devo te agradecer por Jeff estar vivo?
– Ah... Certamente que sim. Muito, aliás.
Ele estava certo.
– Ele é um grande imbecil! – Ela ralhou.
– Isso também está certo – ele respondeu.
– Ei, eu ainda estou aqui! – Protestei.
Nesse momento, Larah choramingou. Já passava da meia-noite; ela devia estar com sono, apesar de elétrica. Me levantei e a peguei no colo. Rapidamente ela deitou a cabecinha no meu ombro. Não a levei imediatamente para o quarto, me contentei em ficar ali, me movendo na troca de pés enquanto ela se aconchegava em meu peito.
– Você não devia estar pegando peso – André advertiu, se referindo aos meus pontos externos e internos.
Meu olhar foi suficiente para inibir qualquer tentativa de aproximação. A sensação de tê-la nos meus braços, depois de tanto tempo, valeria minhas tripas no chão da cozinha.
Não demorou muito, ela acabou dormindo no meu colo. Meu ombro queimava, minhas costas e meu corte também, mas jamais iria assumir. Caminhei com ela para o quarto e quando voltei, notei como estava exausto. Parecia que qualquer esforço me esgotava, e o tempo todo eu me lembrava da sensação de uma dose em minhas entranhas.
Pensar em beber me deixava triste, mesmo porque todo o meu corpo sentia os efeitos residuais de uma vida leviana mergulhada no álcool. Ainda assim, o desejo persistia, mesmo que eu tenha prometido a mim mesmo ao menos tentar.
André me encarava, ainda sentado na mesa com o café já frio à sua frente. Doralice deu uma última olhada nele e se recolheu para o quarto sem ao menos se despedir (típico dela).
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Improvável (Romance Gay)
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