Capítulo 41

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Jeff

Tinha sido uma semana difícil. Além das minhas mazelas habituais, o fato de estar de volta ao barracão, com minha filha para cuidar e isolado do centro da ação, deixou-me num nível de ansiedade sem precedentes. Eu precisava confiar no André, e confiança era algo inédito para mim.

Entre tentar manter distância do álcool, adaptar-me às novas exigências da Larinha e lidar com minhas questões emocionais, os dias se arrastaram como se fossem semanas. Quando André apareceu em minha porta no início da noite, confesso que fiquei sem reação, e meu silêncio e atordoamento se estenderam pelas horas seguintes, durante o trajeto em que André repassou todo o seu plano mirabolante para encerrar, ainda que em parte, a questão do sequestro e da guarda da minha filha.

Mais uma vez, tive que deixar Larinha aos cuidados da minha mãe por mais alguns dias até que pudesse resolver as pendências relacionadas ao meu dilema. Era mais seguro; não havia garantia de que o plano daria certo, e mesmo decidindo voltar à cidade, comprometi-me a me manter isolado e longe das vistas. Eu poderia ter ficado escondido até que tudo se resolvesse, mas eu não aguentava mais...

Eu não aguentava mais de saudades do André.

Fizemos a viagem de volta, e durante aquele tempo apenas ele falou. Mesmo preocupado, parecia otimista, mas eu ainda estava no ranço das minhas angústias, medos e incertezas. Eu pensava muito em tudo o que havia acontecido desde que ele me resgatara naquele beco, e me perguntava se tudo não passava de uma confusão sentimental causada por algum distúrbio como TEPT. Isso explicaria essa mudança de chave que colocava em xeque tudo o que eu pensava acerca de mim mesmo, da minha sexualidade e das minhas preferências.

Enfim, eu estava confuso e me preocupava com o André, pois durante todo o tempo em que convivemos, eu nunca estive bem. Não queria usá-lo, magoá-lo ou compeli-lo a começar algo que estaria fadado ao fracasso. André nem sabia como eu era antes de tudo dar errado comigo. Na verdade, nem mesmo eu me lembrava.

Apenas quando coloquei o pé em seu apartamento e senti o aroma do lugar, algo reacendeu dentro de mim. Senti-me nostálgico e inquieto ao mesmo tempo. Ouvi o clique da porta se fechando e cerrei os olhos, absorvendo a atmosfera ao redor.

— Senti falta daqui... — murmurei, quase que para mim mesmo.

— Senti falta de você... — André murmurou, logo atrás de mim.

Percebi o ar quente dos seus lábios chegando à minha nuca e meus pelos se eriçaram. De repente, dei-me conta de onde estava e com quem estava. Era como se uma bolha se rompesse e me tirasse da letargia. Girei o corpo, olhei diretamente para ele e o encarei por um bom tempo. Ele sustentou meu olhar e não tomou nenhuma iniciativa para se aproximar mais.

Realmente, desde que ele foi me buscar na casa do interior, ele não me tocou uma única vez. Não fez nenhuma insinuação, não demonstrou nenhuma emoção direta a não ser a leve empolgação pelo suposto sucesso do seu plano tão bem arquitetado. Agora, depois de tudo meio que esclarecido, só havia nós dois, sem os segredos entranhados, sem a debilitação do meu corpo e sem o medo pungente.

Eu não sabia onde colocar as mãos. Nem o que dizer. Eu só sentia meu coração acelerado e minha pele aquecida e trêmula. Ele abriu os lábios e demorou um segundo para falar, como se tivesse trocado de frase no meio do caminho.

— Quer comer alguma coisa?

Sua pergunta me surpreendeu, embora fosse esperada. André era sempre tão atencioso, presente e heroico. "Às vezes a vida lhe dá presentes... ", lembrei-me de suas palavras, e capturado por seu olhar, embalado pelo ar que escapava de seus lábios e com cada nervo do meu corpo implorando por alívio, as dúvidas foram se desprendendo gradualmente, liberando espaço para essas outras sensações. Permiti-me mergulhar no breu de seus olhos e antecipei o calor de seu toque. Meu corpo o exigia e era puxado, e nesse instante, deixei de questionar as razões pelas quais nos atraíamos.

Improvável (Romance Gay)Onde histórias criam vida. Descubra agora