Eu cheguei da minha voltinha matinal. Andar de bicicleta era um dos momentos em que eu me esquecia de todas as coisas que me atormentavam.
Umas vezes eu saía com a bicicleta de montanha e outras com a de estrada. Hoje fui dar a volta à região saloia. Malveira, Mafra, Torres Vedras, Ericeira e por aí.
Almocei e depois peguei no carro para ir tomar um café à baía de Cascais. O dia estava bonito e convidava a uma esplanada de praia.
Entrei na estrada Sintra/Cascais e pouco tempo depois avisto a placa Cabo da Roca, Lagoa Azul.
Imediatamente a imagem de Rita apareceu na minha frente e lembrei-me da nossa conversa.
Era domingo à tarde. Talvez tivesse sorte delas estarem a fazer pic-nic. Virei à direita e entrei na estrada da serra.
Estacionei e fiz o resto do percurso a pé até à lagoa. Olhei em redor e não vi ninguém, mas ali não era o local mais indicado para estender uma toalha de pic-nic.
Subi um pouco mais e numa zona mais desprovida de arbustos, um local limpo, várias famílias conviviam.Já estava com vontade de regressar quando ouço ao longe um "Tio Rodolffo ".
Olhei para onde vinha o grito e vejo-a vir a correr na minha direcção. Segurei-a no colo e já a mãe vinha aflita atrás dela.
Fui até ela com a Rita pendurada no meu pescoço e a cara dela não era de satisfeita.
- Rita! Não voltes a fugir de mim assim.
- Desculpa mãe, mas eu vi o tio e ele já ia embora.
- Desculpe. Não queria causar esta situação. Estava de passagem e lembrei-me que a Rita disse-me que vinham sempre aqui.
- Só fiquei assustada quando ela correu.
- Tio, vem para ao pé de nós.
- Não quero atrapalhar o vosso descanso.
- Não atrapalha. Se não vier vou ter que aguentar esta pestinha a semana inteira.
- Tio, a mãe não quer que eu vá andar no Ciclone.
- Não foi isso que eu disse, Rita!
- Porque é que não quer?
- Não quero é incomodar. Se eu deixar ela torna-se abusada e quer ir sempre. Eu levo-a várias vezes ao hipódromo.
- Mas eu gosto do Ciclone.
- Está a ver? Só o viu uma vez. Os outros cavalos ela não se apegou assim.
- Mas podem ir sempre que quiserem. A quinta não fica tão longe daqui.
- Eu conheço a quinta. Só de passagem, nunca lá entrei.
- Está a ver? Agora pode entrar e ver e a Rita anda no Ciclone.
- Talvez um dia.
- Dizes sempre talvez um dia e depois nunca vais.
- Ritinha, não sejas ingrata. A mãe está sempre a fazer-te a vontade. Agora mesmo estou aqui para te fazer a vontade. Por mim estava em casa a descansar.
- A Rita diz que gosta de bicicleta.
- Sim. Pratico cicloturismo amador, mas só sábado quando não tenho trabalho e domingo de manhã.
- Eu também. Como nunca nos encontrámos?
- Não aconteceu.
- Eu muitas vezes venho para a serra. A estrada tem muito trânsito.
- Na serra eu tenho medo de cair e ninguém me ajudar, mas uma vez ou outra também venho.
- Vamos combinar uma volta por aí os dois ou tem algum grupo?
- Não. Geralmente ando sózinha.
- Desculpe, ainda nem perguntei o seu nome.
- Juliette. O seu sei que é Rodolffo. A Rita não cansa de falar em si.
- Espero que bem.
- É Tio Rodolffo e Ciclone o dia inteiro.
Rita estava na beira da lagoa a atirar pão aos patos.
- Cuidado, Rita! Não te aproximes muito.
A tarde estava tão agradável. Corria uma brisa que tornava o ar menos quente. As copas dos pinheiros protegiam-nos do sol e o silêncio era quebrado pelo barulho das várias crianças ao redor.
Eu conversava com Juliette que não tirava os olhos da filha e dei-me conta de que há muito tempo não tinha uma tarde tão agradável.
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Depois da tormenta
Fiksi Penggemar...onde houver escuridão, que se faça luz, onde houver ódio, que renasça o amor...