Entro na adega, ainda tremendo, sinto o coração prestes a escapar pela boca. O amargor da bile sobe pela garganta, amargando minhas papilas gustativas, provocando-me uma careta involuntária. Não deveria sentir isso; nem sequer deveria ter partido, deixando Benjamin aos lobos. Ao lobo. Contudo, a vergonha foi mais forte.
Não dele, mas de mim mesma. Surpreendida, o olhar de meu pai me desarmou. Nunca me vira assim, como se eu trocasse uma vida por prazer.
— Não se julgue, filha.
Minha mãe toca meu ombro, e eu recuo, quase derrubando uma garrafa de tinto seco envelhecido, um dos nossos vinhos mais valiosos, a safra mais valiosa.
— Quase me matou de susto, mãe. — Levo a mão ao peito, soltando um suspiro aliviado. — Meu Deus.
— Você não me deixou escolha, querida. — Ela afasta uma mecha do meu cabelo. — Pensei que estivesse no fundo do poço, não apenas por Edgar. Sabia que esse casamento — ela faz aspas com os dedos — não duraria. Refiro-me ao ocorrido na empresa. Estou a par de tudo.
Suas palavras me surpreendem; jamais imaginei que ela soubesse algo sobre meu casamento. Afinal, sempre mantive tudo em segredo, nunca compartilhando com colegas ou com ela, mantendo-me sempre discreta.
— Como a senhora sabia que meu casamento não duraria? — indago, movida pela curiosidade.
— Ele nunca te olhou com amor ou dedicação.
— E como a senhora sabe quando um homem ama uma mulher, mamãe? — questiono, com um leve tom sarcástico.
— Desde o dia em que seu pai me viu, ele me olhou com dedicação, depois com amor. E eu não aceitaria menos que isso de homem algum. — Ela pisca e sorri ao perceber minha expressão contrariada. — Sei o que pensa sobre seu pai; ele pode ser um tanto difícil na maior parte do tempo, e nisso concordamos. Eu já cogitei arrancar suas bolas várias vezes. Inclusive hoje. Mas eu o amo, e eu sei que ele me ama. Assim como ama você.
Minha mãe volta-se para as escadas com uma elegância que sempre me causou inveja. Sua postura impecável, a forma como cada passo parece coreografado... ela sempre foi objeto da minha admiração. Afinal, ela é a única pessoa no mundo que consegue fazer meu pai hesitar.
— Venha, querida — diz ela, com um sorriso que promete confidências compartilhadas sob a luz suave de um candelabro. — Este vinho merece ser apreciado em taças à altura de sua qualidade.
Mas antes de acompanha-la até a sala, subo para o meu quarto. Sob a água morna do chuveiro, os eventos do dia se acalmam. Ponho meu vestido bege de alças finas que flui suavemente ao redor do meu corpo. Prendo o cabelo em um coque alto, sentindo a pele ainda quente dos raios do sol que se pôs.
Pensar no ardor em minha pele me faz voltar a algumas horas atrás, quando Bejamim me possuiu incontrolável e sedento, encostada naquela pedra. Lembrar dele me causa um arrepio na espinha, a sensação de dormência retorna. Meu Benjamim. Totalmente errado, mas ainda sim meu. Me recrimino por pensar nele dessa maneira, mas sinto meu estômago afundar ao imaginar o contrário. Pensar na minha partida da ilha, ou até mesmo na dele, me causa as piores sensações.
Papai está sentado em meu sofá branco, uma taça de vinho na mão e o charuto na outra. Ele ouve música de olhos fechados, talvez esteja mais calmo. Ou talvez esteja fingindo. Ele é muito bom nisso.
Mamãe se aproxima de mim silenciosamente, me entregando uma taça de vinho.
— Decidiu juntar-se a nós? — indaga papai, sem abrir os olhos.
— Esse hábito ainda vai mata o senhor — respondo, referindo-me ao charuto.
Dou um gole na bebida que desce ardendo pela minha garganta. Papai abre os olhos e lança-me um olhar enviesado.
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Lover Beach - Um Verão de Amor
Lãng mạnDas Autoras de "Não Se Afaste de Mim"... Lídia é uma empresária destemida, que deixou para trás um casamento falido, e uma família conturbada. E nessa nova fase, tudo o que deseja é se redescobrir e dar a volta por cima. É quando decide retornar à s...