Capitulo 4

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Ana estava lidando com muita pressão. Seu filho de dezesseis anos era incapaz de fazer uma mala sozinho, então além de sua mala, a de seu marido e a de Rosa, havia mais outra mala para cuidar em cima da hora. Seu marido continuava lhe apressando e Rosa entrara em um acesso de raiva após Alexandre lhe dar o celular para assistir desenhos e Ana o tirar pq não queria dar tela para a filha a essa hora da manhã. Ela esperneava e se contorcia no cadeirão, então Ana finalmente surtou com Alexandre:

— Você vai acalmar essa menina agora, eu não mandei você dar esse celular— gritou Ana já não se importando em parecer descontrolada. Se Alexandre podia ser sem noção, ela podia ser descontrolada— Vai logo, eu tô mandando!!!

    Alexandre tirou Rosa do cadeirão e a pegou no colo, temendo o olhar furioso de Ana. Ele sabia que havia mexido em um vespeiro que não conseguiria conter, então se limitou a tentar acalmar Rosa em silêncio. Quanto mais tentava, mais Rosa se irritava, então Alexandre decidiu distraí-la no quintal antes que Ana voltasse a gritar.

E não eram só os filhos e o marido de Ana que a estavam aborrecendo. No dia anterior, Alexandre lhe dissera que os pais dele se convidaram para irem para a casa de Ceuci dias antes do combinado.

O combinado era que eles chegassem uns dias antes do aniversário de quinze anos de Clarissa, porque até lá, Ana convenceria a filha a fazer uma festa de debutante e eles compareceriam a festa. Mas Alexandre lhe disse antes deles irem dormir que sua mãe ligou,e no meio da conversa simplesmente disse que ela e o pai iriam chegar em Ceuci no domingo.

  Isso enfureceu Ana. Não que odiasse os sogros, mas com toda certeza ela odiava o caos generalizado que os dois traziam consigo sempre que podiam.

  Sandra e Luciano Pace, jamais poderiam escutar alguém dizer isso, mas eram pessoas tão parecidas que chegava a ser chocante. Na teoria isso seria uma boa coisa, mas na prática era terrível. Tanto Sandra quanto Luciano, eram geniosos, provocativos e espaçosos.

  Os dois viviam em pé de guerra, desde quando conhecera os pais de Alexandre, Ana jamais vira uma interação dos dois que não contivesse uma alfinetada, um tom irônico ou uma cara feia. Ela já estava conformada que teria que conviver com os dois por alguns dias no fim da viagem e torcer para que um milagre acontecesse e eles não tornassem toda a situação sobre si como sempre faziam.

   Conviver com os dois por dois meses já era demais. Mas também não era como se Ana tivesse o direito de reclamar sobre isso, porque sua mãe e sua avó já estavam em Ceuci desde quinta-feira, antes mesmo dela e sua família chegarem.

  A mãe de Ana, Elsa, se mudara para casa de sua avó Olímpia que foi diagnosticada com leucemia para cuidar dela há cerca de um ano atrás. Há alguns meses, o médico de Olímpia disse que ela não estava respondendo ao tratamento de quimioterapia, e que o melhor a se fazer era desistir de um tratamento invasivo e agressivo para uma senhora da idade de Olímpia e deixa-la passar seus últimos meses em paz.

   No momento em que Alexandre deu a notícia, Ana achou que não tinha o direito de reclamar pois Elsa também não era nenhum anjo de pessoa, então engoliu sua raiva e frustração. Mas Ana nunca foi boa em enterrar suas emoções.

  Enquanto arrumava as malas de Miguel e aguentava as reclamações de Alexandre e de Rosa, percebeu que as duas situações não eram equiparáveis. A mulher que havia ajudado sua mãe a criá-la estava com os dias contados, era natural que cedessem tempo e atenção para ela.

   Ana começou a chorar. A ficha estava caindo.

  Ana se sentou à mesa soluçando para esperar Clarissa trazer as cuecas de Miguel e assim finalizar a mala. Não queria parecer mesquinha, mas apesar de Elsa conseguir ser bem desagradável quando queria, ela não era um furacão raivoso como os pais de Alexandre, não era preciso media-lá para que ela não estragasse o dia de todos.

  Ana havia oferecido a casa em Ceuci para Olímpia ter paz, e agora, se Ana quisesse que sua avó a tivesse teria que passar o dia pajeando dois idosos encrenqueiros para que os dois não se matassem.

   Da cozinha, dava-se para enxergar a sala pois a casa era em conceito aberto, e Ana percebeu que Clarissa levantava-se do sofá e vinha em sua direção. Ela enxugou as lágrimas e sorriu para a filha, que entregou uma sacola de supermercado. Ela olhou o conteúdo e respondeu para Clarissa:

   —Mentira que seu irmão colocou as cuecas aqui, ele é um desleixado mesmo.

   Ana começou a gritar por Miguel para cobrar uma explicação e fazê-lo dobrar as cuecas e colocá-las organizadas em uma bolsinha quando Clarissa lhe disse:

   —Ele não vai escutar, ele tá tomando banho.

   — É sério isso? Eu pedi pra ele tomar esse banho há três horas atrás— disse Ana frustrada— Ninguém me escuta nessa casa?

   Clarissa se levantou e abraçou a mãe por trás. Ana não pôde evitar sentir um certo carinho pela filha. Ela era a única que não estava lhe dando trabalho.

   Ainda.

   —Mãe eu tava conversando com a Nina, e ela me disse que o pai dela quer conversar com você e o papai.

  — O que esse homem quer agora?— perguntou Ana se soltando do abraço da filha.

   Clarissa deu de ombros como se não soubesse e se sentou novamente. Ela sabia que se dissesse o assunto da conversa, sua mãe e seu pai entrariam na defensiva e de nada adiantaria Laerte conversar com os dois.

   — A Nina me ligou agora e disse que ela e o pai estariam aqui em alguns minutos para conversar com você e o papai. Ela não me disse pra quê.

   Ana viu que Clarissa conversava com alguém pelo celular, mas ela e Alexandre estavam ocupados demais tentando não estressar um ao outro para escutarem a conversa.

   Enfim desistiu de pedir para Miguel que arrumasse direito suas cuecas. Ela colocou de qualquer jeito a sacola na mala e a fechou. Já não estava mais com paciência para arrumar uma mala que já deveria estar pronta há tempos com capricho. Ela ajeitou sua pulseira de sete nós e respondeu para a filha:

   —Tudo bem, vou avisar seu pai. Ele pediu algumas coisas na padaria para nós comermos no caminho, vou servi-las para Nina e o pai dela.

   — Obrigada mãe— disse Clarissa beijando a bochecha de Ana.

   Poucos minutos depois, Alexandre entrou na cozinha com Rosa dormindo em seu colo. Ana sabia que aquela birra de Rosa não era só raiva por terem lhe tomado o celular e que provavelmente ela estava com sono, mas estava nervosa demais para facilitar as coisas para o marido.

   — Adivinha — disse Ana aborrecida para Alexandre assim que ele se sentou à mesa com Rosa— o pai da Nina quer conversar com a gente agora.

   — O que você fez? — disse Alexandre para Clarissa, ele imaginou que o pai de Nina viria reclamar de alguma coisa.

   — Eu não fiz nada. Sei tanto quanto vocês.

   — Tá — disse Alexandre ainda desconfiado de que Nina e Clarissa haviam aprontado — Eu pedi bastante comida, vai dar para todos comerem, mas vou pedir mais de outro lugar pra a gente comer no carro. Agora ajuda eu e a mamãe organizar essa cozinha pra receber sua amiguinha.

   Clarissa achava estranho quando seu pai falava com ela como se ela fosse um bebê, mas nesse momento ela até deixaria ele a ninar como ele ninou Rosa se ele a deixasse ir para Aspen com Nina.

O Verão dos PaceOnde histórias criam vida. Descubra agora