Trinta e sete

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Quando a fumaça começou a se intensificar e o alarme de incêndio tocou, Dulce Maria teve noção do quão sério as coisas estavam do outro lado da porta.

Os laboratórios eram grandes, havia uma porta pesada e janelas pequenas. Era difícil ouvir o barulho do lado de fora e quase ninguém percebeu a movimentação até a fumaça entrar na sala.

O professor sinalizou para que todos saíssem o mais rápido, mas eles estavam no subsolo e a única saída era depois de subirem dois lances de escadas.

Todos saíram correndo e assustados, buscando chegar logo a saída. Assim que saíram da sala a fumaça estava por toda a parte, e imediatamente todos a volta começaram a tossir.

Havia muita coisa inflamável ali e produtos que poderiam causar reações químicas e até intoxicar ao ser inalado.

Christian segurou o braço de Dulce e os dois foram juntos a caminho das escadas, mesmo sem quase enxergar nada. Quando chegaram no segundo lance, havia fumaça demais e houve tumulto para identificar a saída.

Não dava para ver nada, e o que sempre foi claro na cabeça deles, de repente ficou embaralhado. Havia muita gritaria, pedidos de socorros, e barulho de coisas caindo.

Parecia um cenário de guerra, e Dulce estava ali no meio totalmente perdida.

- Para onde vamos? - Perguntou a Christian.

- Eu não sei, acho que é por ali, mas não tenho certeza de que lado da escada viemos. Temos que sair daqui, Dul! - A voz dele estava desesperada, seus olhos arregalados.

Os dois estavam com muito medo. Dulce o puxou pela mão decidindo o caminho, atravessavam a fumaça tossindo e com os olhos lacrimejando.

Depois de correrem mais um pouco se deram conta que ali era o lado oposto da saída. Uma angústia invadiu o peito de Dulce, e se eles morressem ali?

Ela tinha tantos planos, tantos sonhos e agora poderia estar cara a cara com a morte. Isso a deixou tonta, ela não queria morrer. Não sem antes terminar a faculdade, se declarar para o seu amor, passar um último momento com os amigos, ver a sua mãe, jantar com o seu pai e sua madrasta.

A tosse aumentou e Christian precisou segurar ela, para que continuassem buscando uma saída.

- Eu to com medo! - Disse ela com lágrimas nos olhos.

- Nós vamos sair daqui Dulce, vamos sair o mais rápido.

Os dois corriam perdidos, junto de várias outras pessoas. Era difícil enxergar com a fumaça, mas alguém gritava que os bombeiros estavam ali.

Dulce decidiu confiar, eles iriam sair daquele prédio logo logo. Ela só precisava manter a calma.

- Já sei! - Gritou Christian puxando Dulce. - No final do corredor tem uma janela enorme e se a gente pular?

- Aqui é alto Chris, será que conseguimos?

- A gente precisa dar um jeito de sair de perto dessa fumaça Dulce!

Os dois voltaram a correr em direção ao final do corredor, a fumaça parecia entrar pelo nariz e ir cortando pela garganta. A boca estava seca e a crise de tosse era mais forte, mas a adrenalina não os deixava parar.

O corredor nunca pareceu tão cumprido. Os passos pareciam cada vez mais curtos, e a distância cada vez maior. Christian segurava forte a mão de Dulce, e a quase a puxava pelo braço.

Finalmente chegaram em frente as janelas de vidro, mas estavam fechadas. Os dois tentaram abrir, mas não conseguiram. Nunca tinham reparado se elas ficavam abertas ou fechadas.

- Não quer abrir, e agora?

- Vamos quebrar! - Gritou Christian. - Socorro!!!!!

O desesperado estava tomando conta dos dois e os pensamentos já não eram mais tão claros. Dulce começou a bater no vidro em desespero, enquanto Christian tentava o quebrar com a força do corpo.

- Precisa ter alguma coisa aqui perto para poder quebrar!

- Alguém precisa ver a gente aqui, Chris! Socorrooo!!!!

Continuou tentando abrir a janela e gritar apesar da voz parecer cada vez mais fraca. Christian pegava impulso e se jogava sobre a janela, mas nem sinal de um trincadinho.

Os dois estava presos em meio a fumaça e uma janela emperrada. Dulce não queria, mas ela só pensava na morte. O que a mataria, a fumaça que inalava ou o fogo que se aproximava?

Ela não queria esse fim, não queria ir embora agora. Não queria perder Christian. Um dia que parecia tão comum se tornou algo completamente diferente e assustador.

- Que merda! - Christian gritava frustrado se jogando mais uma vez sobre a janela. - Socorroo, pelo amor de Deus!!!!

- Você acha que vamos morrer?

- Se você não continuar gritando por socorro, eu acho que sim.

Os dois continuaram batendo forte no vidro e gritando desesperadamente. As lágrimas rolavam dos olhos de Dulce, e ela rezava para sair dali.

Os gritos iam aumentando e diminuindo de intensidade, em meio a tosse, olhos molhados e coração agitado, os dois torciam para conseguirem sair dali.

Ninguém parecia os ouvir gritando dali. Eles não sabia de onde vinha a direção do fogo, onde estavam os bombeiros, por onde as pessoas estavam sendo socorridas.

Dulce olhou para trás, não dava para enxergar nada além de uma fumaça branca e densa. Não ouvia mais som nenhum, e pensar que só restavam os dois ali a deixava ainda mais nervosa.

Voltou a bater na janela, já sem esperança sua voz não saia mais, mas Christian continuava gritando com toda a sua força.

De repente se ouviu um barulho de pedra na janela, os dois se olharam perdidos. Como havia um desnível grande já que estavam no primeiro andar, precisavam se abaixar e olhar melhor, mas cheio de esperança.

- É o...

- Christopher! - Christian conseguiu gritar. - Christopher!!!

O garoto estava lá em baixo usando seu jaleco e fazendo sinais com as mãos e falando coisas que Dulce não conseguia entender.

Mas ele estava ali, é claro que ele ia estar ali. Ela podia ter esperança, o amor de sua vida veio lhe resgatar.

- Vou tirar vocês dai! Fiquem calmos! - Ouviu ele gritar.

Dulce e Christian sentaram no chão e se permitiram tossir e relaxar os ombros, ele iriam sair dali.

O Plano ImperfeitoOnde histórias criam vida. Descubra agora