UM POUCO DE FÉ

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Valentina não poderia estar mais ansiosa. Eram 8:40 a.m. Cerca de cinquenta caminhoneiros estavam sentados no salão de festas da igreja que gentilmente lhes fora cedido pela reverenda amiga de Antje.

O salão contava com um telão através do qual caminhoneiros em trânsito participariam em videoconferência. A um canto, em uma enorme mesa, um desjejum farto fora servido.

Antje e dois homens estavam sentados a uma mesa, no pequeno palco à frente do salão. Aquelas pessoas, em sua grande maioria homens, respeitavam-na. Os dois caminhoneiros sentados ao seu lado também gozavam de boa reputação e consideração entre seus iguais. Um era mais velho que Antje e já não dirigia mais, passara a profissão para os três filhos, e o outro, pouco mais velho que Valentina, era um líder nato.

Há mais de meia hora debatia-se o mesmo assunto.

William Walton, em uma das fileiras do meio do auditório, estava em pé, conforme a regra que havia sido previamente estabelecida, quem quisesse falar, deveria levantar a mão e, ao ser autorizado, deveria levantar-se e expor sua ideia, em seu próprio lugar.

— O problema não é criar uma cooperativa, o problema é que isso inclui burocracia, o que significa tempo. E tempo é algo que muitos de nós não temos mais. Se formos criar uma cooperativa a médio prazo, teremos que pensar também em um recurso que nos seja útil imediatamente.

— Não importa o que digam, eu já falei, não vou entrar em uma cooperativa, eu não desejo ser associado a ninguém! — Mark era um homem das antigas, com mais de sessenta anos, um tipo bruto e rabugento, mas honesto e confiável até o último fio de seus últimos e persistentes cabelos.

— Você não pode esperar sua vez de falar? — Willian Walton perguntou-lhe indignado. — Aliás, a sua outra vez de falar, você já falou quase dez minutos, todos aqui já sabem da sua posição em relação a cooperativas e dos seus problemas para conseguir boas cargas e das suas contas que não se pagam sozinhas, e dos seus problemas familiares...

— Ouça, rapaz, você me respeite porque eu tenho idade para ser seu pai!

— Eu não lhe estou faltando com o respeito, Mark, estou apenas pedindo que você respeite a ordem da fala e não atropele os outros.

Antje pediu que ambos se acalmassem e que Mark esperasse sua vez, devolvendo a palavra a Willian, cuja posição em relação àquele assunto era semelhante à opinião de Valentina, que uma cooperativa os tornaria fortes, sem perda de sua individualidade.

O debate prolongou-se ainda por mais algum tempo.

— O que eu penso é que talvez o que o Cão Grande nos propõe não seja tão absurdo assim — dizia um homem no telão.

Ele foi vaiado, houve algum tumulto, algumas pessoas chegaram a se levantar e fazer gestos de repúdio. Novamente, Antje levantou-se e pediu silêncio, dizendo que todos tinham direito a expor sua opinião.

A discussão seguiu com poucas pessoas defendendo a ideia de ceder às propostas da Hound Co. e muitas contra.

Por último, Antje e o homem mais velho da mesa falaram, em defesa da união dos caminhoneiros. O homem mais novo explicou detalhadamente a criação e o funcionamento de uma cooperativa.

Antje pediu que Valentina subisse ao palco e tomasse a palavra. O relógio marcava 10:38 a.m. Ela se levantou com o peso de uma enorme carga nos ombros. Todos os seus nervos pareciam ter vida independente do seu organismo, como se pudessem romper sua pele e sair do corpo, o coração batia descompassadamente, afirmando uma vontade própria de migrar pela boca para um lugar muito longe do seu peito, as mãos tremiam. Ela tinha uma escolha a fazer, precisava decidir se acataria as chantagens do seu inimigo, traindo seus pares para salvar a própria pele, ou se atenderia ao pedido do seu coração.

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