27.

410 27 5
                                    

olho para ele, que está a olhar para mim. com a mão na mudança e outra no volante.
eu quebro a troca de olhares e ligo o bluetooth do carro dele. conectei ao meu telemóvel a música do leo2745, pela qual estou obcecada. remorsos é um sentimento. antónio faz uma cara feia, quando meto o cinto e aumento a música.

a nossa sintonia nunca foi coerente. uma alma perdida, um homem carente. - canto enquanto ele conduz ainda com a cara feia.
ignoro e continuei a cantar.
á procura de carinho onde ele não existe, sabes que estás perdido. quando procuras algo que tu nunca viste, notas logo, não faz sentido.
os astros se cruzaram uma vez na vida. e quando se descruzam vêm a recaída. - canto eu.

que deprimente, margarida. - ele diz a aumentar o som. eu arqueei as sobrancelhas.

sinto que tenho mais coisas para te dizer, mas onde é que tu andas? - antónio canta. eu sorri. afinal também a conheçe.
preciso de olhar pa cima, mas não conseguir encontrar as alavancas. perdido no meio deste mundo, subo muralhas cobertas de espinhos,
focado em vingar nesta vida depois de ter passado por uns vacilos,
sei que contigo um tempo passei. - antónio aponta para mim, para continuar a cantar.

e nesse tempo um tanto eu errei. - canto eu a sorrir.

a nossa história eu nunca mudei
a tua ferida juro que eu curei. - canta ele a sorrir enquanto conduz.

esse teu ser juro que eu amei
sempre fui eu que te procurei
escrevo cartas enquanto imagino tudo. - digo a mexer o corpo lentamente ao tom da música.

agora diz me a verdade tu não me amavas, escondias o tal anel e apagavas chamadas, amigos falsos por trás só a darem facadas
e tu na minha frente a fingir que alertavas. - antónio canta. eu ainda me estou a rir, do facto de ele ter dito que a música era deprimente, mas ele sabia mais a letra que eu.

nunca me disseste nada, mal sabes a sensação de fazer tudo e não conseguir alcançar o chão. - canto eu.

a felicidade nunca envolve um só coração, o objetivo é superar a dor com quem te dá a mão. - antónio está a estacionar.

com quem te dá a mão, mas tu te foste, me abandonaste, alguém te deu a mão, alguém te deu a mão ,e tu te foste, aqui não ficaste, alguém te deu a mão, se há solução, não sei se ainda existe, ou eu procuro em vão, continuo á procura na cidade
vivendo entre a loucura e a sanidade. - a música acaba e antónio desliga o rádio. eu suspirei.

dizeste que achavas esta música deprimente. mas cantaste-a. - digo eu de boca aberta.

continua a ser deprimente. queres entrar no colombo de mãos dadas? - dou-lhe um pequeno empurrão quando insulta a minha música. e fico chocada com a sua pergunta.

não te percebo. não me levas a jantar, porque tens medo, das notícias. e agora, pedes-me para entrar contigo num centro comercial, ao lado do estádio da luz, onde provavelmente vamos parar de 5 segundos em 5 segundos, para tirarem fotos contigo. e vão perguntar coisas estranhas. vais conseguir lidar com isso, antónio? - digo eu. ele continua a olhar para mim.

queres entrar no colombo. de mãos dadas? - ele pergunta novamente. eu suspirei. olhando para a frente. volto a olhar para ele.

tu queres? - pergunto eu. ele sorri. eu sorri de volta. ele fecha a porta do seu lado, dá a volta ao carro e abre a minha porta. e entrelaça as nossas mãos, quando acaba de fechar a porta do carro. sorri discretamente para ele. tivemos um total de 10 minutos de paz. antónio não me larga a mão, enquanto tira fotos com algumas fãs. não tira fotos com todas, porque têm mais que fazer.

sem fôlego - antónio silva.Onde histórias criam vida. Descubra agora