17 | uma simples plebeia

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— SUA RIDÍCULA! — BÁRBARA guinchou insultos na direção de Marcela, agitando as mãos como se fosse ela a receber o banho de café quente.

Marcela arregalou os olhos, se sentindo confusa. Não entendia o motivo de estar sendo xingada de maneira tão vil, sendo que era sua camiseta e seu caderno que estavam encharcados de café quente.

Bárbara Brito devia ter notado sua hesitação, pois acrescentou:

— Você arruinou os meus sapatos! — E continuou reclamando enquanto Marcela desceu os olhos para seus pés, calçados por tênis Adidas muito brancos.

No pé esquerdo, havia uma pequena marca escura.

Era menor do que um grão de café, mas estava lá.

— M-me desculpe — ela gaguejou, sem saber o que dizer. Se fosse com ela, a garota não veria problema. Certamente não sentiria a necessidade de fazer um escândalo nos corredores, para a escola inteira ouvir.

Bárbara a fuzilava com o olhar de tal maneira, que o impulso de Marcela era o de se jogar aos seus pés e começar a esfregar a mancha em seu sapato com uma flanela.

— Desculpas não vão resolver o problema, querida — a voz de Sofie soou, fria e cruel, enquanto a garota se intrometia. Ainda que tivesse chamado Marcela de "querida", a palavra soava como um insulto. — Teremos que dar um jeito nisso, não é mesmo? Ou você espera que a Bárbara termine o dia escolar com essa mancha horrível em seu tênis?

— Eu posso limpar — Marcela ofereceu, mesmo depois de se convencer que tinha mais orgulho do que isso. — Você vai para a aula, e eu vou até o banheiro. Em cinco minutos eu consigo tirar a mancha — garantiu. Já tinha feito isso dezenas de vezes em roupas, e o tênis nem era de tecido. Só os cadarços. Seria moleza.

— E ela vai ficar descalça na aula enquanto você faz isso? — Sofie continuou.

— Acho que não. — Bárbara falou, de braços cruzados e com o olhar fixo no rosto de Marcela. A ideia de que aquela garota poderia ser Theo a desarmou por completo, e ela tornou a gaguejar.

— N-não se se entendi.

— Seus sapatos. Dê eles a Bárbara.

Os tênis de Marcela eram velhos, mas estavam limpos. Ela se certificava de que seus poucos pertences de segunda mão, ao menos, estariam em boas condições de uso.

Bárbara soltou uma gargalhada atroz.

— Não vão me servir — e desceu os olhos para os tênis de Marcela. — Os pés dessa garota são enormes.

— É o suficiente para ela resolver o problema que criou.

Marcela sentia seu rosto queimando de vergonha enquanto risadas estridentes ecoavam pelo corredor. Aparentemente, o comentário espirituoso de Bárbara tinha quebrado a tensão, e feito com que as pessoas se sentissem autorizadas a rir de sua cara.

Pensou em todas as vezes que testemunhou aquele tipo de maus tratos acontecendo com outros alunos do colégio, em como tinha medo de se tornar alvo da panelinha cruel de populares. Era pior do que ela tinha imaginado. Pior do que qualquer um de seus pesadelos mais terríveis.

As gêmeas se entreolharam nervosamente quando Marcela arriscou um olhar para as duas. Chegou a ser engraçado o modo como Antônia e Alice simultaneamente encararam o teto do corredor.

Marcela não era ingênua a ponto de esperar que as duas a defendessem, mas, ainda assim doía. As três moravam na mesma casa. Marcela preparava suas refeições diariamente. De vez em quando, elas a pediam para fazer cachos em seus cabelos – o que não estava em sua lista de obrigações, a madrasta deixava claro, mas ela fazia mesmo assim. Teve uma vez que as três assistiram a um filme juntas, na sala de televisão.

Cinderela às avessasOnde histórias criam vida. Descubra agora