18 | o quarto no sótão

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— SÓ UM MOMENTO! — Marcela gritou ao ouvir a campainha, embora levasse constantes broncas de Andrea para não berrar para a porta. Mas a madrasta não estava em casa, e aquela reação automática passaria sem punições, na mesma forma que suas lágrimas passariam despercebidas.

Ela tinha se comprometido a chorar o suficiente para que seus dutos lacrimais secassem quando chegasse a hora de ter que lidar com Andrea. A garota supunha que mais alguns minutos de autocomiseração seriam o bastante.

As gêmeas, por sua vez, não tinham aparecido em casa na parte da tarde. Marcela suspeitava fortemente que as duas não queriam ter de encará-la. Melhor assim. Ela também não estava empolgada para ter que lidar com aquelas duas após o silêncio ensurdecedor das irmonstras perante o que a amiga delas havia feito.

Marcela desceu as escadas dois degraus por vez. Não costumavam receber visitas, mas poderia ser alguma entrega. Rodou a maçaneta e deu um pequeno pulo no próprio eixo com o susto ao identificar quem estava nos degraus de frente ao corredor de entrada.

Jonas?

— Marcela.

O garoto a saudou com um meneio de cabeça bem arcaico. Ela imaginou que, se estivesse vestindo um chapéu, Jonas o tiraria para cumprimentá-la como os homens faziam nas novelas de época.

— O que você está fazendo aqui? — Disparou ela, acometida por uma sensação de vergonha que não lhe cabia. Marcela não tinha motivo para sentir as bochechas esquentando ao se deparar com Jonas Levi, afinal, foram as amigas dele quem a tinham humilhado publicamente. Ele é quem devia se constranger com a própria cara de pau, não ela.

E se Jonas estivesse ali para entregar convites de aniversário para Antônia e Alice depois de tudo que tinha acontecido mais cedo, Marcela se trancaria em seu quarto e passaria trinta minutos consecutivos gritando no travesseiro. Não sem antes botá-lo para correr.

Jonas a olhava como se a resposta para aquela pergunta fosse óbvia. A garota se sentia muito consciente a respeito do avental imundo agarrado à sua cintura, e o lenço azul amarrado em sua cabeça. Só faltou a vassoura na mão, pensou.

Era desconcertante estar tão desarrumada na presença de Jonas Levi, de todas as pessoas. O garoto só podia ser descrito como sofisticado.

— Não vai me convidar para entrar? — Jonas murmurou.

— Você é um vampiro?

Jonas soltou uma pequena risadinha com a piada, mas seu sorriso era fraco. Não chegava aos olhos. Marcela interpretou sua expressão como desconfortável demais para aceitar anedotas.

Ele não demorou a ficar sério novamente, percorrendo com os olhos o espaço sobre seu ombro, inspecionando a casa. Certamente para verificar se Marcela estava sozinha. Por quê?

— Entre — ela concedeu, afastando-se da porta para abrir espaço. Ele, por sua vez, caminhou a passos lentos e cuidadosos pelo soalho, seu olhar se perdendo na sala de estar que Marcela havia acabado de limpar e polir. Irritada com todo aquele mistério, ela decidiu ir direto ao ponto. — Se você está aqui para se desculpar pelo-

— Não estou aqui para isso.

— Ah.

Marcela quase deu um tapa na própria testa. Era óbvio que ele não estava ali para se desculpar. Ele não tinha feito nada de errado além de se associar a pessoas horríveis. Sequer tinha rido dela, ao contrário da maioria dos alunos que testemunharam a cena.

Ela soltou uma respiração pesada.

— Como você descobriu onde eu moro? — Inquiriu, se desarmando um pouco.

Cinderela às avessasOnde histórias criam vida. Descubra agora