20 | o convite

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MARCELA ESTAVA NA biblioteca do colégio devolvendo alguns livros que tinha retirado para estudar para as provas da semana, quando um sorrateiro Jonas Levi se esgueirou por trás dela em uma das incontáveis fileiras de livros.

Apesar de sua aparição súbita, a garota não se assustou.

— Conseguiu o que eu te pedi? — Jonas questionou, sem se preocupar em manter um tom de voz aceitável para uma biblioteca. Marcela o repreendeu com um olhar, e ele ementou, sussurrando: — Desculpe.

— Uma lista das informações que tenho sobre Theo — a garota murmurou enquanto arrancava com cuidado uma das páginas de seu caderno. — Aqui está — e estendeu ao alcance de Jonas, que tomou a lista em mãos e passou a examiná-la, inclinando-se para repousar causalmente em uma das estantes. — Eu também coloquei ao lado os dias específicos em que recebi as informações, caso seja importante. Vocês dois poderiam estar no mesmo lugar ao mesmo tempo, mesmo que seja um dos amigos da sua irmã.

— Garota esperta. — Ele elogiou, sem tirar os olhos do papel.

— Obrigada. — Marcela disse, no automático, abaixando o queixo para que ele não notasse o rubor que estava se revelando nas maçãs de seu rosto.

— Pai exigente — Jonas leu o primeiro item da lista em voz alta. — Acho que isso se aplica a todos nós.

— Menos às gêmeas, que são órfãs de pai — ela o corrigiu. Ela deixou de acrescentar o "como eu" que lhe veio à mente. Jonas ergueu uma sobrancelha – talvez desconfortável pelo complemento óbvio daquela frase, ainda que os dois nunca tivessem conversado sobre isso.

— E Lua, é claro, porque o pai dela é deveras leniente — ele desviou educadamente, mas não olhou Marcela nos olhos.

Ela engoliu em seco, reprimindo qualquer demonstração de que estava aborrecida.

— Lembre-se que isso pode ser uma mentira.

— Não acho que seja. Não vejo sentido em colocar tanto empenho em um relacionamento virtual se você não puder falar sobre as coisas que realmente te preocupam. Estabelecer uma conexão verdadeira.

Jonas limpou a garganta antes de prosseguir.

— Como Theo descobriu quem você é? — Ele apontou para o item "descobriu minha identidade esse ano" na lista.

— Ele reconheceu o nome do nosso professor de história em uma das nossas conversas, e nós tínhamos algumas conversas sobre os deveres de história dele. Uma vez, eu repeti uma piada feita em sala de aula nas nossas conversas. Depois, mencionei as gêmeas. Ele as seguiu até a minha casa, e me encontrou.

— Isso não nos ajuda muito — Jonas avaliou, pensativo. — José Carlos deve ter uns vinte anos de carreira no colégio, e ele sempre faz as mesmas piadas. Só podemos ter certeza de que ele estuda na nossa escola.

— Se não estuda, pelo menos já estudou — ela acrescentou. — Sua irmã pode ter amigos que já se formaram.

— Giorgia estaria no último ano se não tivesse optado por se formar antecipadamente — o garoto pensa consigo mesmo. — E Antônia e Alice somente ingressaram no colégio no primeiro ano do ensino médio. Ou seja, podemos excluir todos os que se formaram há mais de dois anos. O pessoal mais velho não costuma se misturar conosco.

Ele puxou a cópia da lista de convidados em que tinham trabalhado antes, e riscou mais alguns nomes.

Marcela não disse nada. Ver a maestria com que Jonas estava conduzindo aquela pequena averiguação a deixava meio intimidada. Era um garoto inteligente, isso ela já sabia. Corriam boatos na escola de que ele tinha as melhores notas do grupinho. Além disso, na sessão de estudos que os dois tiveram quando foram tomar café juntos, Jonas e ela tiveram uma acalorada discussão sobre a natureza da felicidade segundo Aristóteles – o tema da prova que teriam naquela semana.

Cinderela às avessasOnde histórias criam vida. Descubra agora