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Ashtray

Acordei com o sol invadindo o quarto, irritante. O dia mal começou e já sei que vai ser daqueles. A Lindsay me mandou mensagem cedo perguntando se eu queria fazer algo. Como se eu tivesse escolha. Ela vai me arrastar pra algum canto de qualquer jeito.

Coloco o celular de lado e fico pensando: por que eu sempre me rendo? Ela tem esse poder de me fazer sair da minha zona, mesmo quando eu tento ficar no meu canto. Mas também... quem disse que eu reclamo? Tá, reclamo sim, mas só pra disfarçar.

Quando saio do quarto, Fezco já tá jogado no sofá, como se o mundo lá fora não existisse. Olho pra ele, ele me olha de volta e só balança a cabeça, como se dissesse "você tá ferrado". Eu sei disso.

— Vai sair com a Lindsay de novo, né? — ele pergunta, já sabendo a resposta.

— Ela não me deixa em paz, mano — resmungo, meio que de propósito. Mas, internamente, eu gosto. Ela é a única pessoa que consegue arrancar um riso de mim, mesmo quando eu não tô afim.

Mando uma mensagem pra ela dizendo que tô indo. Nem cinco segundos e o celular vibra de volta. "Ótimo! Te espero na esquina." Tá, beleza, ela sempre quer ser pontual.

Assim que chego na esquina, ela já tá lá. Vestida de um jeito que eu tenho que disfarçar o olhar pra não ficar na cara. Ela sabe que eu reparo. Faz de propósito, claro.

— Tá atrasado, menino rebelde — ela diz, com aquele sorriso que sabe que me derruba.

— Você que chegou cedo demais. Relaxa aí — respondo, meio seco, mas ela ignora.

O plano do dia? Nada planejado, claro. A gente só vai andar pela cidade, talvez encontrar algum canto pra comer, mas com a Lindsay nunca é simples. Eu pago, ela reclama, e no final, tudo se resolve com uma provocação ou outra. Hoje, eu queria ver onde isso vai dar.

A gente começa a andar pelas ruas. A conversa, como sempre, começa leve, mas eu sei que logo vai descambar pra algo completamente errado. Ela me conhece demais pra deixar tudo normal por muito tempo.

— E aí, já pensou em largar essa vida de bandido pra virar modelo? — ela provoca, rindo enquanto olha pra mim de canto de olho.

Reviro os olhos, mas solto um riso involuntário. É sempre assim, ela tenta me zoar pra ver até onde eu aguento.

— Modelo? Tá maluca? Deixa de ser besta, princesa — eu digo, e vejo ela levantar a sobrancelha.

— Olha só, me chamando de princesa agora? Vai querer o quê depois? Um passeio de mãos dadas? — ela continua.

— Para de falar merda — respondo, mas é impossível segurar o sorriso. Ela sabe que eu tô zoando, mas também sabe que não é só zoação. E ela aproveita isso, claro.

A gente para numa lanchonete qualquer. Ela se joga numa cadeira e eu faço o mesmo. Eu já sei como vai ser: ela vai insistir em dividir a conta, eu vou recusar e, no final, eu pago tudo. Clássico.

— Cê vai pagar a minha parte de novo? — ela pergunta, me olhando daquele jeito.

— Não vou deixar você pagar nada, Lindsay. Já falei. Não começa — respondo, firme. Ela me conhece, sabe que eu não volto atrás.

— Tá, tá bom, cara durão. Mas um dia eu vou te fazer aceitar — ela diz, como sempre.

Depois que a comida chega, a gente começa a falar de qualquer coisa. Desde o último filme que ela viu até as fofocas da rua. Mas aí, claro, o papo toma aquele rumo estranho que só a gente consegue.

— Você já pensou que a gente podia roubar um banco? — ela solta, do nada, com a cara mais séria do mundo.

Eu olho pra ela, confuso, e depois solto um riso.

— Roubar um banco? Tá de brincadeira, né?

— Ué, com essa cara de bandido que você tem, a gente até conseguiria — ela responde, piscando pra mim.

— Só se você for o cérebro da operação. Eu só fico na porta fingindo que sou segurança — provoco de volta, e ela ri alto.

Eu adoro esse tipo de conversa. É sem sentido, mas faz a gente esquecer da vida por uns momentos. Enquanto ela fala, eu só fico observando. Tem algo na forma como ela fala que me prende. E isso me irrita. Eu odeio ficar tão preso a alguém, mas com ela é diferente.

Pagamos a conta, e como sempre, sou eu que resolvo tudo. Ela tenta, claro, mas no fim, aceita que eu pague.

— Um dia você vai me deixar pagar — ela resmunga de novo.

— No dia que eu virar modelo — retruco, e ela ri.

Saímos da lanchonete e começamos a andar de novo. Eu olho pra ela de canto, tentando entender o que tanto me puxa pra perto. Sei que sou ignorante, revoltado com o mundo, mas com a Lindsay... é diferente. Ela me faz sentir que, de algum jeito, tudo faz sentido. Mesmo que seja com essas conversas idiotas e provocações sem fim.

— Tá pensando em quê? — ela pergunta, me pegando desprevenido.

— Em nada — respondo rápido, mas ela não compra.

— Sei. Vai ver tava pensando em como você me ama em segredo — ela brinca, cutucando meu braço.

Eu reviro os olhos de novo.

— Só na sua cabeça, princesa — digo, com a voz seca, mas internamente... ela sabe.

A gente continua andando, falando besteira, rindo de coisas erradas e planejando futuros crimes que nunca vão acontecer. E no final, eu percebo: é nisso que eu me prendo. Nessas conversas que não fazem sentido, nessas provocações que escondem algo mais. No fundo, eu sei que, com ela, meu mundo é menos confuso. Mais leve, de algum jeito.

E ela sabe disso. Claro que sabe.

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Eu preciso fazer o primeiro beijo deles! São muito fofos!

Estão gostando?

Beijão 💋

Meu refúgio improvável- AshtrayOnde histórias criam vida. Descubra agora