Capítulo 20

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Yuji

Por muitas vezes que visitei a casa de Kugisaki, jamais imaginei encontrá-la numa situação tão incomum como essa. Não sei se é porque muitas coisas mudaram de lugar de repente, ou se é pelo fato de que a própria Kugisaki me parece uma pessoa totalmente diferente agora.

Do nada, o brilho apagou-se de seu rosto e sua personalidade esfriou, restando à minha frente uma mulher que não serve chá em copos fofos, não conversa com empolgação e não demonstra sinais de que vai fazer algo diferente além de suspirar em tristeza.

Assim como sua casa, Kugisaki essa noite esta noite me parece... vazia.

— Está fazendo uma faxina? — pergunto, vendo a grande sacola de lixo no canto do quarto, cheio das xícaras cor-de-rosa que ela mais amava até resquícios do que parecia embalagens de maquiagem nova.

— Digamos que sim. Estou me desfazendo do meu passado — Ela responde com a voz levemente cansada, olhando para a mesa entre nós, onde está uma caixa aberta cheia de pertences antigos.

— E isso é bom?

— Não sei.

Um silêncio tortuoso preenche o quartinho, adicionando mais amargura em meu coração.

Fecho os dedos em punhos por baixo da mesa. Essa é a pessoa que Megumi usou para me trair? Não parecia. A propósito, se ela o amasse exatamente como disse na sessão de fotos, ou naquele beco em Kabukicho, por qual motivo ela estaria assim, tão deprimida? Meu namorado está caidinho por ela, eles transaram, e ela reage desse jeito? Será que minha presença é tão forte assim para que tema esboçar alguma reação? Não faço ideia.

Ainda que eu tenha dificuldade em ler o clima em certas situações, sei o que essa significa com todas as palavras. Eu estou intimidando a Kugisaki, e da pior forma que deveria, pois tudo que enxergo em seus olhos é arrependimento e, sobretudo, culpa.

— Kugisaki, quero que saiba que não vim atrás de briga nem discussão. Eu apenas quero conversar com você — Eu explico com cautela antes de criar qualquer mal-entendido, esperando enxergar um brilho em seus olhos, mas nada vejo.

Um sorriso irônico cruza seus doces lábios.

— Não veio, é? Há... Deveria.

— Kugisaki, por favor...

— Por que não me dá um tapa e vai embora? Ou melhor, quebra o que quiser aqui, eu não vou te denunciar. Assim ficamos quites.

Fico surpreso com seu tom irônico com palavras tão cruéis.

— Como assim? Do que você está falando, Kugisaki?

— Eu destruí seu relacionamento, porra! É mais do que justo que você destrua algo que eu goste também — diz ela, empurrando a caixa amarela com girassóis pintados em minha direção. — Por que não destrói isso pra mim? Eu ficaria grata. É bem melhor do que ir pro lixo.

Abaixo o olhar para a caixa, reconhecendo alguns itens ali, como a pelúcia que eu dei a ela na primeira vez que fomos ao shopping juntos, envolta do laço laranja que caiu de seu cabelo no dia em que me confundiu com um stalker, quando tentei devolvê-lo. Noto também um potinho de vidro com alguns botões do que parece ser de uniforme escolar e uma carta bem preservada, endereçada a ela por Megumi.

São presentes. Concluo ao analisar tudo. Ela quer que eu me desfaça de presentes antigos, que cuidou todo esse tempo.

Afasto a caixa, balançando a cabeça.

— Não. Sinto muito. Não posso fazer isso.

— Por que você é tão gentil, hein?! — Ela brada com irritação, batendo o punho na mesa. — Por que só não explode comigo como da última vez?! Vai lá, me bate, me xinga, faz alguma coisa!! Por favor... só faz... só faz alguma coisa.

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