Divinópolis, 2013
Meu coração sempre soube que a felicidade não é algo para se gabar. Não é que eu nunca tenha sido feliz, ou que seja supersticioso, mas existe um ditado antigo que diz: "quando estamos muito felizes, o destino encontra uma maneira de estragar tudo". Você acredita nessa teoria?
Minha experiência com Alice, infelizmente, valida aquele velho ditado. Amo-a mais do que um pássaro ama sua flor. E sobre as flores, sempre me incomodou a brevidade de suas vidas. Não é injusto? Uma flor, com sua beleza sem preço, que torna o mundo um lugar mais belo e suportável, desaparece tão rapidamente, como se sua falta não fosse partir o coração de alguém.
Considero uma crueldade divina, no mais alto grau imaginável. Não, não estou falando literalmente de flores. Estou antecipando meu ressentimento, Alice, poderia chamar de "uma metáfora poética e melancólica", mas não sou tão eloquente, então tudo o que posso expressar é que é injusto, cruel e profano.
Desde o instante em que a vi, trajando aquela jardineira amarela e camiseta branca de gola alta, com a franja longa emoldurando cílios extensos, aqueles olhos brilhantes e sorriso celestial, soube que nos casaríamos e teríamos uma filha maravilhosa juntos.
Está bem, eu confesso, eu não sabia nada disso, mas ainda assim não hesitei em escolhê-la como minha esposa. Só não imaginava que ela fosse uma flor tão rara, cujas pétalas sangrariam até o último sopro de sua alma.
Aqui estamos, há meses nesta tranquila cidade de Divinópolis, o jardim escolhido por minha Alice para seu descanso, para retornar ao pó. Como ela consegue dizer isso sorrindo, é algo que nunca entenderei. Talvez seja essa a razão pela qual esta cidade evoca em mim sentimentos tão contraditórios: uma mistura de amor e ódio, um emaranhado de gratidão e dor profunda.
"Amor, você já está de pé tão cedo? Por favor, volte para a cama. Eu vou levar Elisa na escolinha e já volto."
"Estou bem, amor, não se preocupe. Só vou escrever um pouco no escritório e depois volto para a cama, prometo."
"Vamos, papai, está na hora," diz Elisa, abraçando as pernas da mãe, que retribui com um beijo carinhoso no topo de sua cabeça.
Estes diálogos curtos e íntimos, que giram como um disco riscado, repetindo-se sem cessar, fazem minha cabeça parecer que vai explodir a qualquer instante. Às vezes, penso que vou enlouquecer de tanta falta que sinto, e o mais angustiante é que Alice continua aqui. No entanto, temos enfrentado uma longa, triste e inevitável despedida. Deus, por quê?
***
Mais tarde naquela noite, Lucas estava inquieto e não conseguia dormir. Uma angústia avassaladora pesava em seu peito, ameaçando sobrecarregar sua mente. Observar sua amada dormindo abraçada a Elisa já não trazia calor ao seu coração, mas sim dor. Vestido em seu pijama, ele entrou no carro e dirigiu sem rumo pela cidade. Era a primeira vez que sentia rancor da lua; naquela madrugada, ela brilhava plena e radiante, em contraste com sua vida, que parecia desvanecer. Ele duvidava que voltaria a se sentir completo e satisfeito novamente.
Lucas se deixou guiar, sem se ater ao destino, apenas buscando um respiro. No carro, Zé Ramalho entoava suavemente "Quanto tempo leva para saber, que sinônimo de amar é sofrer. Num aroma de amores pode haver espinhos...", foi quando ele a notou.
Absorto, quase estacionou o carro sem querer, ao observá-la afastar uma mecha de cabelo colada em seu rosto. Não foi desejo o que sentiu, mas sim curiosidade; a mulher parecia um enigma, parada sozinha diante da porta de uma casa antiga, em uma rua deserta, com apenas uma mala a seu lado, absorta em seus pensamentos, como se estivesse protegida de tudo ao seu redor, inatingível.
Ele ansiou por conhecê-la, mesmo sabendo que não teria a ousadia necessária. E com essa certeza, retornou para casa.

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O Poder da Noite
Romance"Quando as luzes da cidade se apagam, acendem as estrelas dentro de mim" O Poder da Noite, é uma estória de laços fortes de amor e amizade, narrativas de noites longas de insônia, reflexões e superação. Diane Fiore é uma dessas pessoas cuja vida se...